Nunca veremos um filme como "Casa de Dinamite" sobre o desastre do aquecimento global. Eis o impasse no fulcro da COP30 e de todas as 29 reuniões de cúpula sobre o clima que precederam a rave em Belém, desde a Rio92.
A cinematografia de Kathryn Bigelow resulta eletrizante porque lida bem com dois atributos da ameaça nuclear opostos aos da crise climática: uma vez acionado o mecanismo do holocausto atômico, restam minutos para reagir; e, no caso de bombas detonarem, morrerão de imediato milhões de pessoas.
A diretora e o roteirista Noah Oppenheim esticaram os 20 minutos de prazo até a hecatombe em Chicago narrando a história em tempo quase real de três pontos de vista complementares, de modo a preencher 1h52min de projeção. Mas tiveram o cuidado de não confortar o espectador com uma explosão final de resignação.
Há convergências, decerto, entre as emergências nuclear e a climática quando deflagradas. Nos dois casos, morrem milhões. Qualquer reação está fadada à impotência, no primeiro por falta de tempo, no segundo por excesso dele.
Duas décadas atrás, o filme "O Dia Depois de Amanhã" tentou imprimir alguma urgência pública ao drama arrastado do aquecimento global acelerando consequências extremas. Ao custo de enorme inverossimilhança, comprimiu em minutos um paradoxal (mas não impossível) retorno da glaciação na América do Norte, que em realidade demoraria décadas ou séculos.
A licença cinematográfica, no caso, distancia-se da minúcia bem pesquisada de "Casa de Dinamite" ao reproduzir situações postas em marcha na Casa Branca, no centro de comando StratCom em Nebraska e na base de mísseis Fort Greely, no Alasca. Mesmo se fosse para tratar da reação de governantes ao clima, haveria que narrar décadas de inação em dezenas de capitais, tiro no pé de qualquer roteiro.
Além do mais, o aquecimento global é um desastre moroso, como uma pandemia de propagação lenta. Não como o coronavírus da Covid, mais como o HIV da Aids.
Suponha que a extração de petróleo ressuscite das profundezas um retrovírus que infecta de início só operários de poços e plataformas marítimas. A partícula viral neste delírio de ficção científica consegue instalar-se nas células do hospedeiro, inclusive as reprodutivas (com alguma licença genômica), e assim se transmite a seus descendentes.
Assim como ocorreu com a Aids, as mortes tardam a acontecer, e a identificação do patógeno também demora. Não para executivos das petroleiras, que logo descobrem o agente e a transmissão entre gerações, porém sem tornar pública a informação.
Quando pesquisadores chegam à mesma conclusão, lobistas das empresas passam a lançar dúvidas sobre seus achados. O contágio é restrito. Os vírus podem ter outra origem, como o desmatamento. Uma vacina poderá combatê-los. Remédios inovadores reduzirão a mortalidade.
Ocorrem mais mortes por armas de fogo. Melhor investir em bloqueio da transmissão vertical. A economia não sobrevive sem petróleo. Precisamos extrair combustíveis fósseis da Margem Equatorial para obter recursos de combate à pandemia.
Já vimos esse filme dezenas de vezes. A COP30 é só mais uma sessão desse purgante que nos deixamos enfiar goela abaixo. Mas nunca é tarde para se levantar e deixar a sala escura.

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