sábado, 20 de abril de 2019

Lideranças da esquerda apostam na Unidade Progressista, OESP


Grupo composto por ex-candidatos Haddad e Boulos e pelo governador Flávio Dino quer atrair Marina, Ciro e Requião

Ricardo Galhardo, O Estado de S.Paulo
20 de abril de 2019 | 05h00
Entre as várias iniciativas desenvolvidas nos últimos meses para reverter a fragmentação da oposição ao governo Jair Bolsonaro, a recém-criada Unidade Progressista tem chamado a atenção entre lideranças da centro-esquerda pelo perfil de seus integrantes e, principalmente, por não ter a participação formal de partidos políticos.
Fernando Haddad
O ex-prefeito Fernando Haddad Foto: Fernando Bizerra Jr./EFE
Composta pelos ex-candidatos à Presidência Fernando Haddad (PT) e Guilherme Boulos (PSOL); o governador do Maranhão, Flavio Dino (PCdoB), o ex-governador da Paraíba Ricardo Coutinho (PSB) e a vice de Boulos, Sonia Guajajara, a Unidade Progressista se reuniu uma vez e produziu dois artigos. A próxima reunião será em maio e a expectativa é atrair outras lideranças importantes como os também ex-presidenciáveis Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede) e o ex-senador Roberto Requião (MDB-PR).
Embora ainda esteja longe de ser relevante no cenário nacional, a Unidade Progressista é vista como uma opção de médio prazo aos desgastados partidos políticos de esquerda, principalmente por causa do perfil de seus criadores, quase todos relativamente jovens e com grande potencial de ampliar seu campo político. Boulos e Sonia Guajajara têm fortes vínculos com movimentos sociais de rua. Os nordestinos Dino e Coutinho representam experiências administrativas aprovadas pelas urnas e com abertura para o diálogo com o centro e a centro-direita.
Dino foi um dos artífices do apoio do PCdoB à eleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e participa de fóruns com governadores do Nordeste, Norte e Brasil Central. Haddad recebeu 47 milhões de votos em 2018, é próximo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e integra o maior partido de esquerda do País.
Outro sinal do potencial da Unidade Progressista é a onda de ciúmes velado gerada pela articulação. Lideranças do PTPSOLPCdoB e PDT ouvidas pelo Estado avaliam, em conversas privadas, que o objetivo final é a criação de uma frente eleitoral ou até de novo partido de centro-esquerda. Os integrantes do grupo negam.
“O que a gente quer é ter visibilidade pública de que existe um campo de forças a ser considerado”, disse Haddad. “Temos que trabalhar essa ideia de campo independentemente do desfecho. Temos que trabalhar o caminho”, completou o petista.
“Um dos objetivos é fazer um gesto simbólico a favor da unidade dos progressistas”, disse Boulos.
Dino avaliou que fatos recentes, como a eleição de Bolsonaro – e a desarticulação política do governo – e a queda de lideranças do PT abatidas pela Lava Jato deixam “um vazio enorme” no campo democrático que precisa ser ocupado. A ideia do maranhense é criar um grande campo político aberto ao debate de ideias com o centro e o empresariado, com perspectiva nacional desenvolvimentista, que promova uma repactuação institucional em defesa do estado democrático de direito. “A gente leva até 2022 para em 2022 decidir.”
Fragmentação. A Unidade Progressista é mais uma tentativa de reagrupar a esquerda depois da fragmentação ocorrida na eleição de 2018, quando Ciro se recusou a apoiar Haddad no segundo turno, aprofundada na eleição para a presidência da Câmara e com as distintas táticas de atuação contra Bolsonaro. “Tudo se insere no esforço para acabar com a divisão da oposição”, disse o presidente do PSOL, Juliano Medeiros.

O círculo dos ricos, Marcelo Ruben Paiva, OESP


Curso oferece treinamento para mulheres que desejam ser mais elegantes e ter uma vida de luxo

Marcelo Rubens Paiva, O Estado de S. Paulo
20 de abril de 2019 | 02h00
Esqueça concorridos MBAs, doutorados exaustivos, debruçar-se sobre livros, varar madrugadas trabalhando ou estudando. Desconsidere a Primavera Feminista, equiparação salarial e direitos iguais aos gêneros. Você, mulher, quer subir na vida e valer um milhão de dólares? 
A Escola da Elite anuncia um caminho: um curso online de como se casar com um homem rico. E oferece o método Sete Passos Para a Alta Sociedade:
Passo 1. “Conheça a elite e entenda os nove atributos essenciais que você terá que desenvolver para se tornar mais bem-sucedida.” 
Passo 2. “Comporte-se como uma dama da alta sociedade: melhore sua linguagem corporal, técnicas de conversação, conduta, etiqueta e comportamento em geral.”
Passo 3. “Desenvolva uma imagem de sucesso. Aprenda a ter a aparência de uma mulher de alto valor. Vista-se com classe e promova a autotransformação. Você estará valendo um milhão de dólares.” 
Passo 4. “Aprenda a fazer conexões importantes com pessoas ricas e expandir sua rede de contatos. Domine a arte da ascensão social!”
Passo 5. “Conheça homens ricos e aprenda a sair com eles. Tudo que você precisa saber sobre encontros com caras da elite, incluindo coisas a fazer e não fazer!”
Passo 6. “Estratégias para iniciantes – onde morar? Como ter grana para tudo isso? Estratégias para quem tem orçamento limitado? Como começar do zero?”
Passo 7. “Estratégias intermediárias e avançadas – como fazer parte dos círculos sociais certos? Como ter uma boa ascensão? Como se comportar perto de homens ricos? Como fazer um homem rico patrocinar sua vida?”
Conhecer a elite? Dama? Valer R$ 3,9 milhões, um três quartos nos Jardins? Não é produto das Organizações Tabajara. A Escola da Elite é comandada por Anna Bey, 13 anos de “experiência com os ricos e viajando pelo mundo”, que bolou a plataforma educacional para mulheres que “buscam ser melhores e elevar seu nível social”.
“Descubra os segredos para se tornar uma mulher de classe! Este curso online está baseado em uma autoavaliação, oferecendo um programa de treinamento em vídeo para mulheres que desejam ser mais elegantes e ter uma vida de luxo. As alunas aprenderão estratégias de sucesso para entrar na alta sociedade, ter classe e estabelecer conexões que elevarão o nível de suas vidas ao topo”, introduz o site.
O curso promete ensinar como “ter uma vida cheia de extravagâncias e muito mais”. Primeiro paradoxo. Ela, Anna Bey, propaga um jeito de a mulher ficar rica como, casando-se? Não. Empreendendo. 
Segundo paradoxo. É preciso ter grana para fazer o curso de como ficar rica. O Plano 1 custa R$ 499. Imagino que o 2 e 3 sejam mais caros. Terceiro paradoxo. Mulheres não têm vida fácil fora muito menos dentro de um casamento. Quarto. Extravagância é sobreviver com pouca grana. Quinto. Marido rico não tem crises, depressões, angústias, tédio, solidão? Sexto. Rica porque se casou com um rico não sente culpa, não faz análise, não toma ansiolíticos, antidepressivos, não fica doente, não tem ciúmes, raiva. Sétimo. Ricos não têm estresse? 
Sugar, por vezes, alguém sem muito tem uma vida mais relax. E dinheiro não necessariamente traz... Você sabe.
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O mercado de luxo chegou aos shoppings, às escolas bilíngues com mensalidade em torno de R$ 10 mil e a aplicativos de paquera. The Inner Circle abriu filial no Brasil. É preciso ser aceito, depois de uma checagem via dados do usuário expostos no Face, LinkedIn e sabe-se lá onde mais. 
“Você não precisa deslizar o dedo incessantemente. Nossa comunidade tem um processo de inscrição para novos membros que combina uma comunidade diversificada, com solteiros inspirados e ambiciosos que estão na mesma página na vida. Criamos um ‘social dating’ em que valores compartilhados e interesses mútuos resultam em conexões autênticas”, anuncia.
Mesma página na vida? Transparência é página oculta em redes sociais: o público é a bolha de endinheirados acima dos 30 anos, que passam por uma triagem; não são aceitos de imediato, mas recebem a confirmação via e-mail, depois da inscrição. 
São selecionados apenas usuários de determinadas profissões, escolaridade, de “alto escalão e carreiras consolidadas”. Algoritmos e pessoas checam nível educacional dos interessados, local de trabalho e cargo na empresa. 
Fiz uma experiência para entender metafisicamente o usuário: quem são, o que querem, para aonde vão e por quê. Me apresentei como “jornalista” e... Até agora não fui aceito. Os algoritmos sabem da dureza de uma das profissões que mais sofrem concorrência das redes sociais. 
Pensei em alterar para “escritor”. O aplicativo iria rir de mim, uma vítima das grandes redes de livraria em recuperação judicial e do Estado atual, o antigo maior comprador, que agora tem aversão a livros. Já pensou “dramaturgo”? Vão responder que a Lei Rouanet já era, a “mamata’ acabou, e me mandar pra Cuba. “Roteirista”? Perguntariam: Ouviu falar do bloqueio do TCU?
A era dos aplicativos de paquera está apenas começando. Por enquanto, passam pela seleção de proximidade, preferência sexual e, agora, carteira de investimentos. Logo, logo, ficarão mais setorizados.
Cada time poderá ter sua social dating. Afinal, se você é vascaína, imagine a chateação de namorar um flamenguista... Poderoso Tindrão será a rede exclusiva para torcedores do Corinthians. O grande evento será no cruzeiro Navio do Corinthians, que existe desde o centenário em 2011.
A polarização política é um nicho a ser considerado. Aplicativos HappnMito, ForaPetista, Lula&AmorLivres, TerceriaViaParaOSexo, GostoDoQueOlavãoGosta têm tudo para dar certo. 
NaCamaComAOprimida será o aplicativo para os admiradores de Paulo Freire. NazismoÉDeEsquerda para os doidões. BoraPraCuba será o da ala da esquerda assumida. O match, digo “reunión’, se dará entre aqueles que acreditam que a Venezuela é uma experiência socialista, não uma ditadura.
Gosto musical também pode ser o filtro para o match perfeito. Afinal, roqueiro que é roqueiro não sairia jamais com um não roqueiro. Pode-se até ter seleção por gênero: PunkVive, ExperimentalExperimentaTudo, BritishPoposudo, GrungeQueGamo. Correndo para o Inpi para registrar tudo isso aí...

Um passo atrás, João Domingos, OESP


Em vez de proteger, inquérito compromete a imagem do Supremo

João Domingos, O Estado de S.Paulo
20 de abril de 2019 | 05h00
O presidente do STF, Dias Toffoli, trabalhou por muitos anos na assessoria jurídica do PT. Quando Lula assumiu a Presidência da República, em 2003, Toffoli foi escolhido para comandar a subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, ministério então sob o comando de José Dirceu. Com o escândalo do mensalão, em 2005, Dirceu foi demitido, voltou à Câmara dos Deputados e teve o mandato cassado. Toffoli continuou em sua função. No segundo governo de Lula, foi chamado para ser o advogado-geral da União. Lá ficou até 2009. Com a morte do ministro Carlos Alberto Menezes Direito, do STF, Lula o nomeou para a Suprema Corte. Toffoli tinha 41 anos de idade. Havia muitos outros candidatos, com muito mais experiência. Toffoli venceu a disputa porque foi político o suficiente para convencer Lula a nomeá-lo.
Também ministro do STF, Alexandre de Moraes é um ano mais novo do que o presidente do STF. Ligado ao PSDB, foi secretário de Justiça do governador Geraldo Alckmin entre 2002 e 2005. Entre 2015 e 2016 foi secretário de Segurança Pública de mais um governo de Alckmin. Com o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, foi chamado por Michel Temer para assumir o Ministério da Justiça. Em março de 2017, Temer o nomeou para o lugar de Teori Zavascki, ministro do STF que morrera em um acidente aéreo. Havia muitos outros candidatos à vaga, muitos deles mais experientes do que o ministro da Justiça. Moraes venceu a disputa porque, como Toffoli, soube ser mais político do que os concorrentes.
Um e outro são ministros que, embora tenham se destacado por trabalhos na área jurídica, chegaram ao STF por intermédio da política, cada um pertencente a um dos partidos que, desde 1994, polarizaram as disputas pelo poder no País. A nomeação de Toffoli foi muito criticada pelos tucanos; a escolha de Moraes foi muito atacada pelos petistas, que criaram até o bordão de “golpistas” para Temer e seus auxiliares, um deles Alexandre de Moraes.
Ambos sabiam que seriam vigiados por todos os lados. Para quem concedem habeas corpus, se a decisão tem viés ideológico e partidário, se estão no STF a serviço de alguém ou de alguma coisa.
Em 2018, quando Toffoli concedeu de ofício habeas corpus a José Dirceu, até que o STJ julgasse recurso do ex-ministro contra a volta à prisão, agora não mais pelo mensalão, mas pelas apurações da Lava Jato, ele apanhou uma barbaridade nas redes sociais. Nem mesmo a decisão de que suspendeu a liminar do ministro Marco Aurélio Mello que livraria Lula da cadeia, e foi considerada uma intervenção na sentença de um colega, serviu para serenar as críticas.
Ao chegar à presidência do STF Toffoli prometeu que tentaria pacificar a Corte, trazendo-a para decisões mais técnicas, dando-lhe, de fato, a condição de poder moderador, uma decisão política sensata. Mas, aí, veio a ordem para que fosse instaurado inquérito para apurar ataques a ministros do STF e familiares. Uma aberração, disseram juristas, integrantes do Ministério Público, ex-ministros do STF e até ministros da Corte. Caberá ao STF acusar, processar e julgar, o que remeteria à Inquisição.
Em seguida, a decisão de Alexandre de Moraes de retirar do ar uma reportagem da revista Crusoé sobre uma investigação da Lava Jato segundo a qual o empresário Marcelo Odebrecht dissera que Toffoli era conhecido como “o amigo do amigo do meu pai”. A proibição atingiu também o site O Antagonista. A hipótese de censura foi levantada, o que seria inconstitucional. 
Pressionado, Moraes revogou a proibição. Toffoli insiste em manter o inquérito. Moraes foi político. Toffoli está sendo corporativo. O que, em vez de proteger o STF, compromete a imagem da instituição.