Em vez de proteger, inquérito compromete a imagem do Supremo
João Domingos, O Estado de S.Paulo
20 de abril de 2019 | 05h00
O presidente do STF, Dias Toffoli, trabalhou por muitos anos na assessoria jurídica do PT. Quando Lula assumiu a Presidência da República, em 2003, Toffoli foi escolhido para comandar a subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, ministério então sob o comando de José Dirceu. Com o escândalo do mensalão, em 2005, Dirceu foi demitido, voltou à Câmara dos Deputados e teve o mandato cassado. Toffoli continuou em sua função. No segundo governo de Lula, foi chamado para ser o advogado-geral da União. Lá ficou até 2009. Com a morte do ministro Carlos Alberto Menezes Direito, do STF, Lula o nomeou para a Suprema Corte. Toffoli tinha 41 anos de idade. Havia muitos outros candidatos, com muito mais experiência. Toffoli venceu a disputa porque foi político o suficiente para convencer Lula a nomeá-lo.
Também ministro do STF, Alexandre de Moraes é um ano mais novo do que o presidente do STF. Ligado ao PSDB, foi secretário de Justiça do governador Geraldo Alckmin entre 2002 e 2005. Entre 2015 e 2016 foi secretário de Segurança Pública de mais um governo de Alckmin. Com o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, foi chamado por Michel Temer para assumir o Ministério da Justiça. Em março de 2017, Temer o nomeou para o lugar de Teori Zavascki, ministro do STF que morrera em um acidente aéreo. Havia muitos outros candidatos à vaga, muitos deles mais experientes do que o ministro da Justiça. Moraes venceu a disputa porque, como Toffoli, soube ser mais político do que os concorrentes.
Um e outro são ministros que, embora tenham se destacado por trabalhos na área jurídica, chegaram ao STF por intermédio da política, cada um pertencente a um dos partidos que, desde 1994, polarizaram as disputas pelo poder no País. A nomeação de Toffoli foi muito criticada pelos tucanos; a escolha de Moraes foi muito atacada pelos petistas, que criaram até o bordão de “golpistas” para Temer e seus auxiliares, um deles Alexandre de Moraes.
Ambos sabiam que seriam vigiados por todos os lados. Para quem concedem habeas corpus, se a decisão tem viés ideológico e partidário, se estão no STF a serviço de alguém ou de alguma coisa.
Em 2018, quando Toffoli concedeu de ofício habeas corpus a José Dirceu, até que o STJ julgasse recurso do ex-ministro contra a volta à prisão, agora não mais pelo mensalão, mas pelas apurações da Lava Jato, ele apanhou uma barbaridade nas redes sociais. Nem mesmo a decisão de que suspendeu a liminar do ministro Marco Aurélio Mello que livraria Lula da cadeia, e foi considerada uma intervenção na sentença de um colega, serviu para serenar as críticas.
Ao chegar à presidência do STF Toffoli prometeu que tentaria pacificar a Corte, trazendo-a para decisões mais técnicas, dando-lhe, de fato, a condição de poder moderador, uma decisão política sensata. Mas, aí, veio a ordem para que fosse instaurado inquérito para apurar ataques a ministros do STF e familiares. Uma aberração, disseram juristas, integrantes do Ministério Público, ex-ministros do STF e até ministros da Corte. Caberá ao STF acusar, processar e julgar, o que remeteria à Inquisição.
Em seguida, a decisão de Alexandre de Moraes de retirar do ar uma reportagem da revista Crusoé sobre uma investigação da Lava Jato segundo a qual o empresário Marcelo Odebrecht dissera que Toffoli era conhecido como “o amigo do amigo do meu pai”. A proibição atingiu também o site O Antagonista. A hipótese de censura foi levantada, o que seria inconstitucional.
Pressionado, Moraes revogou a proibição. Toffoli insiste em manter o inquérito. Moraes foi político. Toffoli está sendo corporativo. O que, em vez de proteger o STF, compromete a imagem da instituição.
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