sábado, 20 de abril de 2019

Você está sendo filmado, FSP

É boa a decisão da Polícia Militar paulista de pôr câmeras em uniformes?

A PM paulista vai equipar os uniformes de seus agentes com uma câmera, que registrará suas ações. Isso é bom?
Pessoalmente, sou um entusiasta do monitoramento, mas admito que as coisas não são tão simples. O que de melhor já li sobre câmeras está num divertido ensaio do filósofo Emrys Westacott publicado em 2010 em “Philosophy Now”. Para Westacott, os aparelhinhos de vigilância são em princípio perfeitos. Se Deus os tivesse instalado no Paraíso, Eva não teria comido do fruto proibido e não teria havido pecado original. Querem mais do que isso?
As câmeras são eficientes porque elas fazem com que ações morais (não atirar em transeuntes, por exemplo) coincidam com o interesse individual (não ser apanhado infringindo a lei). Essa concordância não só tende a reduzir o número de violações morais como também pode ajudar as pessoas a se habituarem a fazer as coisas certas. Câmeras, assim, são úteis do ponto de vista das éticas consequencialistas e das éticas da virtude.
Cabe aos chatos dos kantianos objetar. Para eles, se eu respeito a lei por medo de ser punido, não estou fazendo a coisa certa pelo motivo certo, o que equivale a dizer que não estou agindo livre e moralmente. As câmeras, ao estimular muito fortemente as pessoas a fazerem a coisa certa, até reduziriam o espaço para seu crescimento moral.
Assim abstratamente, é fácil descartar a objeção kantiana como academicismo. Mas há situações concretas nas quais nós não hesitamos em preferir o arranjo kantiano. Você prefere trabalhar num empresa que monitore as atividades online de seus funcionários ou numa que confie no colaborador e lhe cobre só os resultados? Mesmo quem não pretende barbarizar no computador da firma pode legitimamente escolher a estrutura mais libertária.
No caso da polícia, porém, continuo fã das câmeras. É mais comum encontrar policiais hobbesianos que kantianos.
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

Suor e transigências, FSP

Governo queima a largada e cederá na Previdência já na CCJ

A marcha em curso pela desidratação da reforma da Previdência tem pego o Palácio do Planalto de calças curtas dada a prematuridade da discussão de pontos sensíveis.
A inépcia política do bolsonarismo fez a proposta queimar cartuchos antecipadamente, e o que seria o degrau menos custoso na aprovação —a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)— passou a exigir dos negociadores governistas muito mais suor e transigências que o usual.
A PEC encaminhada por Jair Bolsonaro ao Congresso completa exatos dois meses nesta data (20) e não cumpriu sequer sua primeira etapa. Para que avance, o fisiológico centrão exige cinco alterações. Uma delas é excluir as mudanças na concessão do abono salarial. A medida gera economia de R$ 150 bilhões em dez anos e sua eliminação equivale a garfar 15% do valor total da reforma.
Para tentar conter a investida antirreformista, o ministro Paulo Guedes (Economia) elevou a oferta a governadores e prefeitos, prometendo antecipar às administrações regionais até R$ 6 bilhões do arrecadado no megaleilão do pré-sal. Os recursos serão repassados antes mesmo do pregão —se a reforma for aprovada.
Em outra frente, Onyx Lorenzoni (Casa Civil) acena com cargos de relevância aos partidos que se aliarem ao Planalto. O esforço é válido, mas chega tarde, quando o Executivo já começa a entregar os anéis.
Guedes agora admite que a PEC contém jabutis e sinaliza recuo em pelo menos um: a revogação da aposentadoria compulsória aos 75 anos no funcionalismo —contrabando feito pelo núcleo político do PSL.
Na próxima semana, para a proposta passar na CCJ, mais recuos podem ser forçosos, retirando do texto o fim da multa do FGTS para aposentados e a desconstitucionalização de regras previdenciárias.
De forma precoce, até mesmo o regime de capitalização —um dos pilares da nova Previdência— esteve sob risco neste introito de tramitação. Aparentemente, o governo ganhou tempo. Esse e outros itens devem ficar para os capítulos seguintes.
Julianna Sofia
Jornalista, secretária de Redação da Sucursal de Brasília.