quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Antipetismo pendular, FSP

O antipetismo é um dos principais vetores a explicar a forte votação em Jair Bolsonaro (PSL). Essa é a parte da eleição fácil de entender. Afinal, é normal e esperado que o partido sob cuja administração ocorre uma megarrecessão enfrente a ira do eleitor. E o governo da petista Dilma Rousseff deu causa a uma crise que reduziu o PIB per capita em 9,1% entre 2014 e 2016.
O fato de a Operação Lava Jato ter revelado esquemas bilionários de corrupção em que o PT estava envolvido até a medula tampouco ajudou a sigla, embora houvesse várias outras legendas metidas nos mesmos e em outros casos.
A dupla adversidade custou ao partido os votos da classe média não originalmente petista que haviam sustentado suas vitórias de 2002, 2006 e 2010 (a de 2014 foi bem mais apertada). Ainda assim, o PT mostra uma notável resiliência. É o candidato da sigla, afinal, que disputará o segundo turno contra Bolsonaro. Grifes petistas como Dilma Rousseff, Eduardo Suplicy e Lindbergh Farias não conseguiram assento no Senado, mas o PT foi a legenda que fez a maior bancada federal, ainda que tenha encolhido em relação à legislatura anterior.
A anomalia deste pleito, parece-me, reside no fato de que não foi a centro-direita tradicional, isto é, o PSDB, que se beneficiou das estripulias do PT. Esse era o quadro até as eleições municipais de 2016, em que os tucanos em geral e Alckmin em particular se saíram muito bem. Mas, de lá para cá, uma série de erros do partido, em particular a forma como lidou com o governo Temer e o caso Aécio, fez com que uma massa nada desprezível de eleitores antipetistas trocasse o PSDB por Bolsonaro.
O movimento pendular entre esquerda e direita é parte, talvez a essência, do jogo democrático. O lamentável é que a onda direitista tenha encontrado representação numa candidatura extremista como a de Bolsonaro. O radicalismo é quase sempre um péssimo conselheiro.

segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Puxada por nanicos, renovação na Assembleia Legislativa de São Paulo chega a 55%, OESP

Fabio Leite , O Estado de S.Paulo
08 Outubro 2018 | 11h27
A Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) terá 52 novos deputados estaduais a partir da próxima legislatura. O resultado das eleições 2018 mostrou que mais da metade dos 94 parlamentares eleitos não tem mandato na Casa hoje, o que representa uma renovação de 55%.
Alesp
Com 94 deputados estaduais, a Assembleia Legislativa de São Paulo é a maior do País Foto: JOSÉ PATRÍCIO/ESTADÃO
Apenas 42 deputados conseguiram se reeleger, número bem inferior aos 62 políticos que mantiveram seus mandatos na eleição de 2014. Entre os principais nomes da política paulista que saíram derrotados nas urnas neste ano estão os tucanos Vaz de Lima, ex-presidente da Casa, e Celia Leão, o líder do PT, Beth Sahão, Aldo Demarchi (DEM), Davi Zaia (PPS) e João Caramez (PSB).
A maior renovação da Alesp nos últimos 24 anos foi puxada pelo desempenho de partidos nanicos, em especial o PSL do presidenciável Jair Bolsonaro, que elegeu 15 deputados estaduais - não tinha nenhum -, e terá a maior bancada do Legislativo paulista. 
O crescimento da sigla foi provocado, principalmente, pela votação expressiva da advogada Janaína Paschoal. Ícone do processo de impeachment da presidente cassada Dilma Rousseff  (PT), a jurista obteve mais de dois milhões de votos, a maior votação de um deputado estadual na história do País.
O Podemos e o Novo foram dois outros partidos que surpreenderam elegendo quatro deputados cada um. Na atual legislatura apenas o Podemos conta com uma única cadeira na Alesp. 
Dos partidos mais atingidos pela renovação está o PSDB, que viu sua bancada encolher dos atuais 19 parlamentares - havia eleito 22 em 2014 - para apenas 8 deputados. A expectativa dos tucanos, que comandam o Estado há 24 anos, era eleger mais do que 15.
Já o PT perderá quatro cadeiras, dos atuais 14 deputados para 10. Ainda assim continuará sendo a segundo maior bancada da Alesp, desta vez atrás do PSL de Bolsonaro e não do PSDB. O PSB, partido do atual governador, Márcio França, perdeu três vagas, de 11 para 8. Outra sigla que encolherá será o PV, que hoje tem 6 deputados e elegeu apenas 1.

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Como reinventar o Brasil , Murillo de Aragão, O Estado de S.Paulo


08 Outubro 2018 | 03h00

A agenda de reformas está posta desde 1994. Mas avança aos soluços e ao sabor das circunstâncias e da imensa dificuldade de obter consenso. A dificuldade de reformar o Brasil decorre do fato de haver duas frentes de interesses simultâneas que lutam entre si e contra a cidadania. 
Uma é a da defesa dos interesses das corporações e oligarquias, que não abrem mão de seus privilégios; é o Brasil da estabilidade trabalhista; é o Judiciário dos penduricalhos, dos incentivos e benefícios fiscais, entre muitos outros privilégios. A defesa de privilégios não tem cor ideológica e apenas uma vítima: a cidadania.
A outra frente é a tentativa de setores ditos progressistas consolidarem um regime conservador de esquerda no Brasil. Digo conservador por se ancorar em fórmulas há muito abandonadas no restante do mundo. Atuam para barrar as reformas, já que o fortalecimento das instituições e o seu melhor funcionamento são um empecilho à tomada do poder. Daí existir uma campanha quase que permanente de enfraquecimento dos Poderes e das instituições. Reformá-las é fortalecer um regime que deve ser derrubado.
A agenda, porém, está posta. A Previdência está quebrada e o sistema tributário, caótico. Como promover as reformas de que o País necessita? É preciso dizer que o Brasil é uma obra em construção que não está dando certo. Seu modelo de Estado, grande, intervencionista e estatizante, deixou de funcionar há tempos. E, ao invés de buscar a reinvenção, o Estado segue a cartilha dos puxadinhos, que resolvem temporariamente parte dos problemas e adiam o confronto final. 
Apenas as crises tendem a empurrar o Brasil para o enfrentamento da agenda de reformas. E se dependemos de crises para avançar, a que temos nos dias de hoje pode ser o vetor de grandes transformações.
Um Brasil quebrado pelo regime João Goulart resultou nas reformas da dupla Otávio de Bulhões e Roberto Campos. A inflação alta gerou o Plano Real, em 1994, que, por sua vez, levou às reformas constitucionais promovidas por Fernando Henrique Cardoso. A crise de 1998 flexibilizou o delírio cambial do Real I e produziu a Lei de Responsabilidade Fiscal. Em 2003 Lula se “reinventou” e foi prudente em manter os fundamentos do Plano Real, surfando no boom da credibilidade e das commodities e deflagrando um ciclo virtuoso. O ciclo de virtudes terminou na explosão fiscal de Dilma Rousseff, que mergulhou o País, melancolicamente, na pior recessão de sua História.
Em 2014 surgiu outro vetor de reinvenção do País: a Operação Lava Jato. Com repercussões políticas, econômicas e sociais, as investigações contra a corrupção no meio político, institucional e empresarial abalaram o capitalismo tupiniquim. Com isso se aprofundou a judicialização da política, mudaram-se regras eleitorais e partidárias, fortaleceram-se as práticas do compliance. Como efeito colateral, instalou-se um ativismo judiciário que nem sempre é legal e muitas vezes é perverso.
Mais uma vez, a reinvenção do Brasil decorreu de uma crise. Paralelamente aos efeitos da Lava Jato, a implosão política da gestão Dilma provocou outro surto de “reinvenção”, com a PEC do Teto dos Gastos, a reforma do ensino médio, as novas regras do pré-sal, a Lei da Terceirização, a reforma trabalhista e a Lei das Estatais, entre outras medidas. Empurrado pela crise fiscal, o governo de Michel Temer abandonou a fórmula “samba-canção” de fazer reformas e impôs uma espécie de reformismo de alto impacto, cujo mérito ainda será reconhecido.
Refletindo sobre nossos eventos históricos, comprovamos que as reformas no Brasil, além de só se concretizarem quando empurradas por crises, são dosadas pela resistência das corporações e dos interesses específicos. O modelo tem de correr o risco de entrar em default para ser reformado. Passado o calor da crise, o ímpeto decresce e a resistência antirreformista volta a predominar. Agora, por conta de nossas fragilidades estruturais, a agenda de reformas deve prosseguir em 2019. Os vetores da renovação estão postos na coleção de desafios que temos pela frente: políticos, econômicos e sociais. O novo presidente da República e o novo Congresso Nacional vão se deparar, fatalmente, com a necessidade de continuar o processo de reformas reiniciadas.
Em considerando que a reinvenção vai continuar, temos o desafio adicional de fazer boas reformas. E em tempo hábil. Mas como fazer? 
Sem a participação das lideranças verdadeiramente progressistas do País as reformas vão continuar sendo “puxadinhos”. É hora da participação efetiva, visando à construção de um sistema econômico que nunca existiu no País: livre de amarras burocráticas, com menos riscos jurídicos, com um sistema tributário justo e com distribuição de renda de forma consistente.
Não há outro caminho a não ser com a participação qualificada da sociedade civil, que deve pautar de forma assertiva o mundo político e o mundo jurídico. O debate eleitoral deixará de ser fator de adiamento das decisões e o novo governo, revigorado pela força das urnas, deverá retomar o debate inconcluído. Porém somente a participação vertical e continuada da sociedade servirá como vetor de inovação, reformismo e reinvenção. Não há outro caminho.
Após as eleições, creio eu, uma nova maioria deve ser formada a favor das reformas. Da mesma maneira que acreditei que a maioria emergiria das cinzas do governo Dilma e avançaria numa agenda relevante. Foi o que aconteceu. 
A qualidade do debate será ditada pela participação das forças verdadeiramente progressistas, que desejam um País voltado para o trabalho e a produção de riquezas.
ADVOGADO, MESTRE EM CIÊNCIA POLÍTICA E DOUTOR EM SOCIOLOGIA PELA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA (UNB), É PROFESSOR ADJUNTO DA UNIVERSIDADE COLUMBIA (NEW YORK)