domingo, 7 de outubro de 2018

Vexame projetado marca fim de etapa para o PSDB, Igor Gielow, FSP

Fracasso de Alckmin e provável segundo turno entre Bolsonaro e Haddad desafiam novos líderes

Igor Gielow
SÃO PAULO
Com a suavização da onda que se avolumava em favor de Jair Bolsonaro (PSL), um selvagem e polarizado segundo turno contra Fernando Haddad (PT) se desenha como a realidade para as próximas três semanas. É a hora de os derrotados se olharem no espelho.
 
Alckmin e Marina, fora do páreo segundo o Datafolha, no debate da Globo
Alckmin e Marina, fora do páreo segundo o Datafolha, no debate da Globo - Ricardo Moraes - 4.out.2018/Reuters
A política brasileira recomenda cautela com obituários de figuras públicas ou agremiações. Numa era mais distante, era Paulo Maluf ressurgindo de tempos em tempos, neste 2018 é o próprio PT.
Isso dito, o desmoronamento do PSDB nesta eleição é um fato maiúsculo —o encolhimento de Marina Silva como terceira via é notável, mas ela é uma nota de rodapé se comparada com o partido de Geraldo Alckmin na história do país.
O tucanato como o conhecíamos acaba com o fracasso retumbante à vista do ex-governador paulista nesta disputa pelo Planalto. Ele sempre foi um produto de difícil vendagem na feira livre desta eleição. A sucessão de erros que cometeu, contudo, ajudou a selar o vexame.
Escolhas políticas erradas, tentativa de comunicar-se com um centro que na realidade inexistia, demora e teimosia na definição de cursos. Claro, se um meteoro cair e um milagre tucano ocorrer neste domingo, tudo isso será lido com sinal trocado. Não é o que diz a realidade.
Alckmin já foi dado como morto após perder duas eleições seguidas em 2006 e 2008, só para ressurgir triunfante em 2010. Pode se reinventar, mas o cenário agora é bastante diverso.
No berço tucano, São Paulo, a velha guarda ruma ao ostracismo. A nova, encarnada pelo filho pródigo João Doria, já flerta abertamente com a nova ordem de Bolsonaro, em busca de carona no grande apoio que o deputado tem no conservador eleitorado paulista. A questão que fica é se ele conseguirá vencer a disputa do segundo turno, bem mais complexa do que prevista inicialmente.
Se sim, as batatas caberão a Doria. Desprezado pela antiga "intelligentsia" (sic) do partido, que também tachava Alckmin de provinciano, o empresário terá na mão um estado com saúde financeira boa para os padrões nacionais. Se não repetir o equívoco que protagonizou à frente da prefeitura da capital, é presidenciável no momento em que entrar no Palácio dos Bandeirantes.
Se perder, vai para casa e os escombros do PSDB cairão provavelmente nas mãos de Antonio Anastasia, muito bem colocado para tornar-se governador de Minas, o estado que resume o Brasil. O ponto aqui é mais de esperar uma conversão do cordato e comedido mineiro em líder político, o que nunca foi sua inclinação —paradoxalmente, uma virtude.
Outro nome a prestar atenção é o do jovem Bruno Covas, prefeito que herdou a cadeira de Doria em São Paulo e que tem todas as condições de ganhar musculatura política para voos mais altos.  
Com o extermínio político por motivos de rolos judiciais de outras lideranças regionais, é esse o cenário residual do partido que comandou um processo modernizante do Brasil e o presidiu por oito anos.
Se Bolsonaro acabar eleito presidente, as dificuldades se multiplicarão, já que haverá uma dispersão tucana entre apoiadores e opositores do disruptivo deputado. O PSDB deve eleger uma das maiores bancadas da Câmara, talvez 50 congressistas, mas é previsível a divisão entre as hostes nesta hipótese.
A união partidária é mais simples se Haddad for o eleito. O antipetismo abraçado com força por Doria e outros mostrou-se uma cola política bastante eficaz neste pleito. Continuará tendo serventia enquanto o partido reformula sua estratégia para tentar retomar o espaço que lhe foi roubado por Bolsonaro na esteira da queda em desgraça de Aécio Neves.
O problema maior, que dependerá de quem serão os atores a juntar os cacos do tucanato, é saber qual será a frequência do debate público quando a fumaça da batalha se dissipar.

Mais forte, mais fraco, FSP

Apesar de ter se fortalecido como instituição, Congresso nunca enfrentou tanto descrédito da população

Plenário da Câmara vazio em Brasília (DF) - Pedro Ladeira/Folhapress
O Congresso Nacional, que ora se renova, terá também renovada a oportunidade para desfazer o paradoxo de ter-se tornado mais forte institucionalmente enquanto seus integrantes ficavam mais fracos e desgastados individualmente.
Todos os mandatos dos 513 deputados federais, além dos de 54 dos 81 senadores, estão em disputa neste domingo (7). Os vencedores do pleito serão os herdeiros de uma organização que nunca foi tão poderosa desde que a Constituição de 1988 a concebeu.
Ao longo dessas três décadas o superprotagonismo inicial da Presidência da República foi mitigado pelo incremento dos papéis do Supremo Tribunal Federal, de um lado, e do Congresso, do outro.
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A latitude do presidente para editar medidas provisórias, atos que têm efeito imediato de lei até que os congressistas resolvam sobre eles, foi restringida. A saliência do Planalto na confecção e na execução do Orçamento, outra desmesura do presidencialismo brasileiro, também foi reduzida.
Deputados e senadores cujo mandato está prestes a expirar conduziram o segundo impeachment de um presidente num lapso de 24 anos. Deliberaram sobre as primeiras denúncias criminais já feitas contra o chefe do Executivo na vigência desta Carta.
Partilharam o governo de fato, numa espécie de semipresidencialismo que, o tempo dirá, talvez não tenha sido apenas resposta efêmera a uma grave crise política.
Por outro lado, nunca o descrédito dos legisladores federais descambou tanto. A corrupção revelada era tamanha que a feitura das leis tornou-se um mercado persa de negociatas. Está preso o político que, da presidência da Câmara, liderou o impeachment.
A hiperfragmentação partidária agravou os problemas. A desconexão entre representantes ensimesmados e representados aturdidos chegou ao paroxismo.
Felizmente há remédios a tratar a doença. A Lava Jato elevou o preço da delinquência no Congresso. Começa a valer em 2019 a cláusula de barreira, que estimulará o sumiço, por falta de respaldo eleitoral, de microlegendas irrelevantes.
No trilho de reconectar eleitores e candidatos, surgiram iniciativas para promover a entrada de pessoas com perfis revigorados no Congresso. Outras, como o Match Eleitoral desta Folha, usam a tecnologia para aproximar cidadãos a postulantes assemelhados em valores e aspirações programáticas.
Tudo contribui, espera-se, para que os congressistas que tomarão posse em janeiro estejam à altura da instituição em que servirão.

A democracia merece respeito. Opinião FSP

Apesar da radicalização da disputa política, a confiança dos brasileiros na democracia nunca foi tão grande

TRE prepara urnas eletrônicas das Eleições 2018 em Brasília - Mateus Bonomi/AGIF
Os brasileiros irão às urnas neste domingo (7) confiantes na democracia que construíram nas três décadas que se seguiram ao ocaso da ditadura militar. Segundo o Datafolha, 69% acham que essa é a melhor forma de governar o país.
A população nunca expressou tanto apreço pelas regras do jogo democrático como agora. Em 1989, quando o Brasil votou para presidente pela primeira vez após o fim do regime autoritário, somente 43% dos eleitores pensavam assim.
Apesar da tensão com o acirramento da disputa política nos últimos dias, o país parece convicto de que realizará sua oitava eleição presidencial seguida em ambiente de plena normalidade democrática.
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Estão inscritos 147 milhões de eleitores, o dobro do que havia quando a democracia foi restaurada. Eles são mais instruídos e experientes —portanto, mais capacitados para fazer boas escolhas.
Quem vence governa, quem perde vai para a oposição e tenta de novo depois. Mecanismos de contenção dos abusos de poder funcionam com vigor e independência. 
Dois presidentes escolhidos pelo voto popular nesse período foram afastados do cargo antes de concluir seus mandatos, mas nos dois casos a medida drástica foi tomada sem virada de mesa, de acordo com o rito fixado pela Constituição e sob vigilância do Judiciário. 
A competição política é intensa em todo o país, com milhares de candidatos em busca de votos, patrocinados por dezenas de partidos. A imprensa é livre e submete o processo a escrutínio constante.
O líder da corrida presidencial, Jair Bolsonaro (PSL), foi esfaqueado por um opositor quando atravessava a multidão em Juiz de Fora, mas o ato hediondo felizmente não causou mais violência. Investigações indicaram uma ação isolada, e não houve revide.
O capitão reformado lançou suspeitas sobre a segurança do sistema eletrônico de votação, mas suas declarações inconsequentes não produziram efeitos até agora —e foram rebatidas de pronto pelas autoridades encarregadas de zelar pela lisura do processo eleitoral.
As pesquisas mais recentes apontam como cenário mais provável para a disputa presidencial a realização de um segundo turno com os dois mais votados neste domingo.
Uma nova rodada será oportunidade valiosa para que Bolsonaro e o petista Fernando Haddad, apontado pelos institutos de pesquisas como seu adversário mais provável, confrontem programas e se exponham a exame mais rigoroso.
Será também o momento de cobrar dos finalistas comprometimento convincente com o arranjo institucional que sustenta a democracia brasileira, o que exigirá o respeito aos resultados do pleito e o compromisso do vencedor de que agirá para pacificar o país, e não para aprofundar suas divisões.