segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Assembleia apagada, Opinião FSP

Legislativos estaduais costumam se dedicar a temas de escassa relevância para o eleitorado

Urna eletrônica - Pedro Ladeira/Folhapress
Dentre as opções pelas quais os brasileiros terão que se decidir no pleito de 7 de outubro, as candidaturas para as Assembleias estaduais talvez sejam as que gozem de menor relevância aos olhos do eleitor. É difícil, de fato, perceber o real papel da atuação parlamentar na gestão das unidades federativas.
Essas Casas consomem recursos vultosos —cerca de R$ 11 bilhões no ano passado— e transmitem a impressão, em boa parte verdadeira, de que se dedicam a temas menores ou à homologação fisiológica de iniciativas do Executivo.
Trabalho realizado pelo pesquisador Leonardo Sales, da Universidade de Brasília, aponta que, do total de leis aprovadas pelas Assembleias estaduais, só 35% têm consequências para o cotidiano dos cidadãos, ao tratar de temas como tributos e atividades comerciais.
O restante do exercício legislativo se volta para a criação de datas comemorativas, mudança de nomes de logradouros e projetos para transformar organizações em entidades de utilidade pública , concedendo-lhes acesso a recursos e benefícios do erário.
Estudos acadêmicos acerca do funcionamento dos legislativos estaduais indicam que essas instâncias têm características que as diferem do Congresso Nacional.
A Constituição atribui prerrogativas próprias aos estados, e as leis locais tendem a reservar aos governadores papel preponderante nas decisões, chancelando o que Fernando Luiz Abrucio, da Fundação Getulio Vargas, classificou de “ultrapresidencialismo estadual”.
Nessa linha, o sistema político das unidades federativas seria caracterizado por uma espécie de hipertrofia do Executivo, a borrar a independência e as fronteiras dos Poderes, com sua forte influência sobre o Legislativo e o Judiciário.
Embora nem sempre a generalização desse perfil se sustente, não há dúvida de que em muitos casos as Assembleias se submetem com relativa facilidade aos desígnios dos governantes —em troca de indicações para a máquina pública e favorecimentos variados.
Não são raros, ademais, os casos em que esses órgãos abrigam quadrilhas envolvidas em atividades ilícitas para obter vantagens. Ainda que os escândalos envolvendo deputados da Alerj (a Assembleia do Rio) tenham se tornado conhecidos nacionalmente, exemplos de corrupção se multiplicam pelas unidades federativas.
Não há, certamente, solução mágica para o problema. Trata-se de um aspecto da equação maior que é o sistema político brasileiro, cujo aperfeiçoamento tem sido objeto de amplo e longo debate. O principal, agora, é que o eleitor se informe para votar de maneira criteriosa, contribuindo para evitar a reprodução de práticas condenáveis.

Inflação das tarifas tira renda dos consumidores, OESP

Márcia De Chiara , O Estado de S. Paulo
24 Setembro 2018 | 03h00
Apesar de a inflação nos últimos meses ter batido recordes de baixa a ponto de terminar agosto com resultado negativo de 0,09% – a menor taxa em 20 anos para o mês –, muitos brasileiros, especialmente os de menor renda, não têm sentido esse alívio no bolso. Além do desemprego continuar alto, o que reduz a renda, o elevado reajuste das tarifas ampliou os gastos das famílias com despesas obrigatórias, como energia elétrica, gasolina, gás, passagem de ônibus, entre outras. Com isso, uma parcela crescente do orçamento, que já passa de 25%, vem sendo comprometida com esses gastos, sobrando menos recursos para outras despesas.
Em 2018, pelo segundo ano seguido, os preços administrados, aqueles cujos reajustes são determinados pelo governo e independem da oferta e da demanda, estão subindo muito acima da inflação geral e também dos preços livres, não regulados. De janeiro a agosto, os administrados aumentaram 6,64%, mais que o dobro da inflação geral de 2,85%, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), e superaram o avanço dos preços livres (1,55%). No ano passado, os administrados tinham subido 5,08% entre janeiro e agosto e fecharam o ano em 8%. Economistas calculam que os preços administrados repetirão a alta de 8% neste ano. 
Diferenças entre a inflação das tarifas e dos preços livres também são gritantes no período mais longo de 12 meses até agosto. Dados do IPCA mostram que os administrados aumentaram 9,59%, enquanto a inflação geral subiu 4,19% e os preços livres avançaram 2,40%. Dos dez itens que mais contribuíram para o aumento da inflação nesse período entre os cerca 400 que compõem o IPCA, quatro são administrados: gasolina, energia, plano de saúde e gás de botijão. Essas quatro tarifas responderam por 50% da inflação geral do período. 
“Há dois mundos muito diferentes dentro da inflação”, afirma o economista da LCA Consultores, Fabio Romão. Ele se refere à diferença de cinco pontos porcentuais neste ano entre alta das tarifas e a inflação dos preços livres. As tarifas estão em alta porque são pressionadas pelo dólar e pela política de paridade da cotação internacional do petróleo adotada pela Petrobrás. Já a inflação dos preços livres está rebaixada pelo efeito da fraca atividade que não permite grandes reajustes.  
Bem-estar
 A inflação das tarifas provoca um grande estrago no orçamento das famílias porque diz respeito a preços de produtos e serviços – como energia elétrica, gasolina, gás – que são difíceis de serem substituídos ou cujo consumo não pode ser evitado. “O fato de as pressões de preços estarem concentradas em bens e serviços de difícil substituição ou postergação do consumo provoca uma redução da sensação de bem-estar das pessoas, a despeito de a inflação geral estar bem comportada e abaixo do centro da meta de 4,5%”, afirma o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, Fabio Bentes.
A disparada das tarifas impacta a todos, mas os efeitos são um pouco mais severos sobre as famílias de menor renda, que usam mais serviços básicos e não têm poupança para bancar eventuais aumentos de despesas. No mês passado, por exemplo, as famílias com renda mensal de até R$ 4,7 mil gastaram 2,17% com gás de botijão, 4,71% com a conta de energia e 5,16% com ônibus, aponta o INPC. Já para os mais ricos, que recebem até R$ 38,1 mil mensais, essas despesas pesaram 1,35%, 4,03% e 2,72%, respectivamente.

De tradição governista, Assembleia Legislativa rompe com gestão Márcio França, FSP

Governo do pessebista não tem maioria e enfrenta dificuldades para aprovar projetos

    Gabriela Sá Pessoa
    SÃO PAULO
    Prestes a esgotar o prazo constitucional, em 30 de setembro, para receber a proposta de Orçamento do governo estadual, a Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) nem sequer aprovou a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), encaminhada por Márcio França (PSB) em abril.
    A situação é inédita, assim como a relação conflituosa dos deputados estaduais com o Palácio dos Bandeirantes.
    Pela primeira vez em um par de décadas, o governador de São Paulo não tem maioria na Assembleia e enfrenta forte resistência em projetos de sua autoria, incluindo os que são cruciais para o caixa, como um pedido de abertura de crédito para a Sabesp.
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    "A Assembleia está buscando de novo o seu protagonismo. Como não há composição, por causa das eleições, a discussão está muito maior em torno dos projetos. O governo não tem mais um número grande como tinha", afirma Edmir Chedid, nome mais forte do DEM.
    Prédio da Assembleia Legislativa de São Paulo
    Prédio da Assembleia Legislativa de São Paulo - Fabio Braga/Folhapress
    Até abril, quando o presidenciável Geraldo Alckmin (PSDB) renunciou e França assumiu, a base governista era coesa e imensa: cerca de 70 dos 94 parlamentares.
    Foi França tomar posse que o equilíbrio se rompeu. De um lado, ficaram 34 deputados de partidos coligados a João Doria (PSDB) —DEM, PP, PRB, PSD e PTC (sem bancada). 
    Do outro, o pessebista reúne 15 siglas e 33 deputados, a maioria de pouca expressão. No meio do caminho, há uma oposição de 19 parlamentares (PT, PC do B e PSOL) e bancadas neutras, como a do MDB.
    Apesar de numericamente significativo, a base de França não tem força o suficiente para se impor ante os adversários e encampar a briga com os tucanos, que comandam a Casa —notadamente, na figura do presidente Cauê Macris (PSDB), que controla a pauta.
    Na dinâmica da Alesp, um projeto só vai a plenário após tramitar pelas comissões e, enfim, ter o consentimento dos líderes das bancadas.
    O governo saiu derrotado em discussões como a da extinção da carteira previdenciária do Ipesp (Instituto de Pagamentos Especiais de São Paulo), que ainda não foi extinta e, assim, onerou advogados pensionistas com uma alíquota maior de contribuição.
    Além da LDO que ficou pelo caminho, parlamentares se engajaram em derrubar vetos do governador a projetos de lei que haviam sido barrados, em mais um sinal de beligerância com o Executivo.
    O PSDB também tenta aprovar uma CPI para desgastar França e, no início de setembro, Cássio Navarro (PSDB) pediu o indiciamento do governador ao Ministério Público no relatório final da comissão que investigou contratos com organizações sociais na área da saúde. O pedido, no fim, não foi adiante.
    Um dos projetos obstruídos pelo PSDB é o que prevê a extinção do Ipesp, encaminhado ainda por Alckmin, em março. 
    Além de desonerar os pensionistas, o fim da carteira previdenciária liberaria R$ 1 bilhão para a Fazenda estadual. O valor cobriria saques de contribuições de advogados que ainda não se aposentaram e pensões dos atuais 5.000 beneficiários. Os deputados tucanos, no entanto, pregam que esse bilhão seria usado eleitoralmente por França.
    Alckmin considera o projeto de extrema importância e chegou a telefonar para alguns nomes da bancada do PSDB, pedindo que abaixassem as armas. Não adiantou.
    "A relação não é boa e o governador Márcio França tem inabilidade para conduzir seus projetos. Até porque em muitos deles ele misturou com seus projetos eleitoreiros", afirmou o líder tucano na Assembleia, Marco Vinholi, na saída do debate entre os candidatos ao governo promovido por Folha, UOL e SBT, na quarta-feira (19). 
    Ele acompanhava a comitiva de João Doria (PSDB). Vinholi diz que são "eleitoireiros" a inclusão do alistamento civil, vitrine de França, na lei orçamentária e o projeto em que o pessebista quer indenizar com até cinco bilhetes o usuário de trens prejudicado por falhas no transporte. 
    Antevendo assumir o governo, França começou a costurar, em 2015, sua própria base que foi apelidada de "bloco" (ou "bloquinho", para os não integrantes). Eram 30 deputados, incluindo os de siglas que romperiam depois com o PSB, como PRB, PP e PSL.
    Aplicou ao estado uma tática que desenvolveu em Brasília, quando foi deputado federal: costurar alianças entre legendas nanicas que, unidas, ganham força no parlamento.
    João Doria (PSDB) também se movimentou com antecedência para ganhar terreno na Assembleia. No ano passado, quando ainda era prefeito da capital, começou a se aproximar dos deputados estaduais tucanos, convidando-os para jantares e reuniões.
    "A gente lamenta que o pessoal queira fazer da disputa eleitoral uma situação tão baixa assim, criando fatos onde não existem", afirma o líder do governo, Carlos Cezar (PSB).
    Márcio França, por sua vez, costuma dizer que é só a eleição passar para a Assembleia reatar com o governo estadual. A ver se as urnas provam sua teoria ou se os adversários Doria e Paulo Skaf (MDB), hoje à frente nas pesquisas, levarão a melhor.