domingo, 23 de setembro de 2018

É o legislativo, estúpido, FSP

É impossível escrever sobre as agendas dos candidatos a deputado e senador

Na eleição para presidente, somos apresentados a poucas opções de voto, e a agenda dos candidatos está o tempo todo na mídia. Muitas vezes, tomamos uma posição passiva de escolher o menos pior.
O voto legislativo, ao contrário, pede ação do eleitor. É preciso garimpar nomes, se mexer, tomar a iniciativa. Às vezes, frequentar reuniões, ouvir propostas e fazer campanha.
O Legislativo divide a culpa com o Executivo em todos os escândalos de corrupção recentes. Seja o mensalão, petrolão ou a compra de votos para a reeleição, os deputados e senadores impuseram sucessivas chantagens aos presidentes. Para obter maioria no Congresso e no Senado, é preciso pagar para alugar seu voto. Há raras exceções.
Pois é aí que a passividade do eleitor deve dar lugar à ação.
Ciro Gomes e Katia Abreu em charge de Ariel Severino publicada neste domingo (22), na Folha
Ciro Gomes e Katia Abreu em charge de Ariel Severino publicada neste domingo (22), na Folha - ariel severino
A cobertura da imprensa não dá conta de divulgar novos nomes para o Legislativo. Muitas vezes, as pautas priorizam o fato inusitado e projetam filhos de políticos presos ou nomes bizarros de candidatos. 
A exceção é a excelente ferramenta da Folha que ajuda a achar nomes de acordo com suas visões de mundo.
Os caciques dos partidos têm uma estrutura para se reeleger. É nosso dever deixar os dinossauros fora do Legislativo. E os filhos dos dinossauros também.
Mantenha seu alerta de corrupção e fisiologismo ligado para os candidatos do MDB, PP, PR e outros partidos que estão até o pescoço envolvidos com a Lava Jato. De acordo com sua ideologia, atente para partidos como o PV, PSOL ou o Partido Novo. Pense num jogo político em que partidos priorizem o debate de ideias e representem diferentes setores da sociedade.
Confira as opções do movimento Agora!. Frequente reuniões, busque a micropolítica nas redes sociais.
Convém atentar também para análises como a do cientista político Jairo Nicolau, no El País, que não recomenda o voto na legenda de um partido. Pela nova lei eleitoral, o candidato precisa ter 10% do coeficiente para se eleger.
E se você ficou comovido com a morte da Marielle Franco, procure suas sucessoras. Algumas assessoras diretas dela estão concorrendo no Rio de Janeiro.
renovação política democrática não acontece com salvadores da pátria na presidência. Não é um caminho mágico e rápido. Pelo contrário, precisa do nosso envolvimento diário. Mas ainda dá tempo de começar.
Renato Terra
Roteirista e autor de “Diário da Dilma”. Dirigiu o documentário “Uma Noite em 67”.

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Cármen Lúcia errou ao não pautar prisão em 2ª instância, diz Nelson Jobim, OESP

Lucas Rivas, especial para o Estado, O Estado de S.Paulo
21 Setembro 2018 | 18h50
PORTO ALEGRE - O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)Nelson Jobim, considerou equivocada nesta sexta-feira a condução da ministra Cármen Lúcia à frente da Suprema Corte no caso envolvendo a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ocorrida em abril. Segundo Jobim, a ministra, que deixou o cargo na semana passada, errou ao não ter pautado o julgamento sobre a prisão de condenados em 2ª instância.
“O erro de todo o problema que ocorreu em relação ao presidente Lula é que a presidente do Supremo não colocou em votação a matéria constitucional propriamente dita e resolveu votar, primeiro, o habeas corpus do presidente Lula. Assim, acabou o STF mantendo a situação anterior porque não estava se discutindo a matéria em tese”, declarou Jobim em entrevista à Rádio Guaíba, de Porto Alegre.
Nelson Jobim
Nelson Jobim, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e ex-ministro da Justiça Foto: Felipe Rau/Estadão
Em 2016, a Corte confirmou que a prisão após 2ª instância vale para todos os casos. Assim, prevalece entendimento de que Lula fique preso, em Curitiba, mesmo com alterações na composição da Corte, assim como a mudança de opinião dos magistrados.
Porém, Nelson Jobim considera que a posição pode ser revertida no STF. “Eu sempre fui favorável de que a presunção da inocência vale até o fim, ou seja, você não pode prender sem trânsito em julgado. Esta sempre foi a minha posição e pode, hoje, talvez ser majoritária no Supremo”, ressaltou.
O ex-ministro da Defesa e da Justiça também defendeu que o recém-empossado presidente do STF, Dias Toffoli, coloque a matéria em votação em um “momento razoável”, em concordância com os demais integrantes da Corte. “Eu creio que o ministro Toffoli tem absoluta noção da dimensão da presidência e vai colocar esta matéria em votação no momento em que ele encontrar razoável entendimento com os outros colegas”, frisou.
Procurado, o Supremo Tribunal Federal não se manifestou sobre a declaração de Jobim até a publicação deste texto.

MDB é partido de Congresso, diz Jobim

Sobre o cenário político, o ex-ministro do STF, que foi cotado pelo MDB para disputar a Presidência, avaliou os números de Henrique Meirelles (MDB) na pesquisa Datafolha, divulgada nessa quinta-feira. 
O emedebista conta com apenas 2% das intenções de voto. De acordo com Nelson Jobim, além de Meirelles não adotar um discurso radical em busca de votos, o partido nunca teve perfil para brigar pela Presidência. “O MDB tradicionalmente não é um partido de disputas majoritárias nacionais, é um partido de Congresso. É um partido que sempre assegurou maioria dentro do Congresso, para efeito de ser o órgão de entendimento com os presidentes que foram eleitos”, finalizou.

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OPINIÃO CARLOS FERNANDO DOS SANTOS LIMA O descaso como epitáfio,

Em uma época em que fatos históricos são negados e que se busca apenas a mentira efêmera das fake news, a tragédia do Museu Nacional, consumido pelas chamas até restarem somente paredes carbonizadas, serve de alerta a todos nós sobre o processo contínuo que enfrentamos de perda de nossa memória, do conhecimento de nossa realidade e do país que desejamos para o futuro.

Aquele palácio não era simplesmente um depósito de coisas antigas ou um museu de história natural. Ele também não era apenas paredes, como querem fazer crer nossos políticos quando repetem que a perda será reposta.

O Palácio da Quinta da Boa Vista, que quando criança visitei maravilhado, representava nossa história mais do que qualquer outro lugar, pois possuía um acervo nosso, com peças únicas e sobreviventes da fuga da corte imperial e das tormentas do oceano Atlântico.

A perda dessa memória é irrecuperável, dela restando apenas vestígios em fotos de arquivo. O que era um monumento de nossa história transformou-se em uma lápide cujo epitáfio é o nosso descaso.

Mas aquele palácio representava também as nossas contradições como país, das relações espúrias que desde cedo se formaram entre a esfera pública e a privada. O Palácio Imperial, originalmente a residência de um rico mercador de escravos, foi dado por este a dom João 6º para se tornar residência da família real.

Esse mercador de escravos, o português Elias Antônio Lopes, ao presentear o imperador que chegava ao Brasil fugido das tropas napoleônicas, angariou assim as simpatias do monarca e alcançou diversos benefícios na estrutura do governo que se instalava, inclusive o de arrecadar impostos. Ou seja, desde cedo em nossa história o interesse privado impôs-se ao interesse público pela confusão patrimonial e familiar entre aqueles que detêm poder.

E essa apropriação do interesse público pelo interesse privado é a raiz do processo de corrupção, inclusive de valores, que vivemos hoje. Ela explica não somente o descaso com nossa história, mas todo o processo demagógico de escolhas de políticas públicas, pelas quais os recursos públicos tirados de quem produz são direcionados para a preservação de castas políticas, seja pelo processo de corrupção pura e simples, seja pela consecução de políticas demagógicas de pão e circo.

Somente percebendo esse fenômeno é que podemos entender como em um país que nos últimos dez anos perdeu tesouros culturais e científicos em pelo menos oito incêndios (Teatro Cultura Artística, Instituto Butantan, Memorial da América Latina, Museu de Ciências Naturais da PUC/MG, Centro Cultural Liceu de Artes e Ofícios, Museu da Língua Portuguesa, Cinemateca Brasileira e Museu Nacional) tenha destinado, no mesmo período, bilhões para estádios de futebol e obras desnecessárias e inacabadas. 

Isso acontece porque nossa classe política prefere a carnavalização dos anúncios de obras espetaculosas, feitas sem projeto e com "contas de padeiro", que são usadas não só como material para demagogia eleitoral, mas principalmente como fonte de recursos ilícitos.

Para nossos governantes, mais vale uma obra desnecessária que saúde, saneamento, educação ou segurança. Demagogia e corrupção são irmãs siamesas que nascem desse matrimônio espúrio do patrimonialismo de nossa elite política e do alto custo de nossas campanhas eleitorais. Para combatê-las é preciso restaurar valores democráticos e republicanos, pois a demagogia e a corrupção não somente matam, mas queimam até o chão nossa memória e esperança.


Carlos Fernando dos Santos Lima
Procurador regional da República e ex-membro da força-tarefa da Operação Lava-Jato