terça-feira, 30 de janeiro de 2018

A palavra 'mal' foi abolida do nosso vocabulário covarde - JOÃO PEREIRA COUTINHO, FSP


FOLHA DE SP - 30/01

Ficar sem palavras é a pior coisa que pode acontecer a quem vive delas. Mas há sempre uma primeira vez.

Amigos sábios tinham feito um ultimato: ou eu assistia a "O Ato de Matar", o premiado documentário de Joshua Oppenheimer, ou eles cortavam relações comigo.

Cedi. Tinham razão. É talvez a mais radical e perturbadora experiência cinematográfica dos meus últimos longos anos.

Cenário: Indonésia, dias de hoje. Tema: as matanças organizadas por milícias pró-Suharto depois do golpe militar de 1965 para limpar o país de "comunistas" (um termo suficientemente vago que tanto se aplica a militantes marxistas como a imigrantes chineses).

Mas o melhor de tudo são os atores principais: nada menos que os próprios carrascos, hoje envelhecidos, e que partilham com Oppenheimer lembranças e técnicas com uma naturalidade que está para lá do bem e do mal. E, quando digo "atores", a palavra é exata: eles não apenas falam abertamente dos seus crimes como encenam os crimes para explicar melhor.

O caso de Anwar Congo merece destaque. No início do documentário, encontramos a lenda (tradução: mais de mil vítimas). E o que impressiona no velho Anwar é a sua alegria –não a alegria de viver, mas a alegria que sente na evocação da matança.

Eu sei, eu sei: a palavra "mal", hoje, foi abolida do nosso vocabulário covarde. O mal nasce da pobreza, da ignorância, da doença. Ou, melhor ainda, é um resquício lamentável de fantasias religiosas.

Para Anwar, o mal é uma afirmação da existência. Os detratores das milícias gostam de usar a palavra "gangsters". Mas Anwar gosta dessa palavra: "gangster", diz-nos ele com a sabedoria de um filólogo, significa "homem livre". E os "homens livres" criam as suas próprias leis.

Anwar é uma espécie de existencialista do açougue que aprendeu tudo com o cinema americano. A pose, os ternos, os gestos. E, claro, as técnicas.

Com ele visitamos o terraço de uma casa que servia de matadouro nos anos loucos de 1965 e 1966. Era uma terrível sujidade –o sangue, o cheiro. Quem aguentava aquilo?

Poucos. Ninguém. Os nazistas, que eram os nazistas, só optaram pelas câmeras de gás porque os fuzilamentos em massa andavam a perturbar a saúde psíquica dos soldados do Reich.

Então o nosso "gangster" começou a estrangular com arame, o método mais barato e eficaz. Ele próprio, com um amigo, mostra-nos como a coisa funcionava. É tão fácil como andar de bicicleta –e ele conta tudo como quem fala de uma bicicleta.

E a consciência? Haverá uma consciência que tudo vigia e condena?

Boa pergunta. Uma pergunta que os carrascos fazem uns aos outros. O nosso Anwar, apesar da alegria, confessa a um deles que ainda tem pesadelos. O outro desvaloriza: diz-lhe que é uma questão de nervos mas que um bom médico cura tudo.

Depois, em momento que parece ter sido escrito por Dostoiévski "lui même", ainda aconselha: o segredo de matar com a consciência tranquila é encontrar uma boa desculpa para o ato.

E para quem pensa que existem leis internacionais –ou, jocosamente, "direitos humanos"– que impedem esse ato, um dos carrascos decide filosofar: a Convenção de Genebra foi escrita por vencedores. Ali, na Indonésia, eles são os vencedores. O código que interessa é outro: a Convenção de Jacarta, digamos.

Era Adam Smith, na sua "Teoria dos Sentimentos Morais", quem dizia que só somos verdadeiramente humanos quando temos a capacidade de nos imaginarmos no lugar do outro.

"O Ato de Matar" apresenta-nos o resultado dessa "falha de imaginação": a transformação do ato de matar em simples rotina cotidiana. Como escovar os dentes, comer, fumar.

Terminei o documentário sem palavras. E depois, consultando as notícias do dia, lá encontrei as polêmicas do momento. Como, por exemplo, as acusações pungentes de que os filmes de James Bond são "sexistas" e merecem boicote.

Em condições normais, tanta estupidez teria o dom de me enervar. À luz do documentário, olho para elas com uma brandura paternal. As cabecinhas vazias do Ocidente que perdem tempo com essas coisas são, afinal, crianças brincando no jardim.

Reforma da Previdência faz disparar aposentadoria por tempo de contribuição, OESP



Em meio aos debates para fixação de uma idade mínima para se aposentar no País, número de pedidos de benefício por quem já cumpriu tempo mínimo de pagamentos ao INSS subiu 5,5%, enquanto os benefícios por idade cresceram 3,7%






Idiana Tomazelli, O Estado de S.Paulo
30 Janeiro 2018 | 05h00
BRASÍLIA - Em meio às discussões sobre a reforma da Previdência, disparou o número de pedidos de aposentadoria por tempo de contribuição. Esses pedidos cresceram 5,5% no ano passado, enquanto as aposentadorias por idade, que exigem no mínimo 65 anos para homens e 60 anos para mulheres, subiram 3,7%. Em 2014, o ritmo de crescimento das duas categorias era praticamente igual.

Reforma da Previdência
Relator da reforma da Previdência, o deputado Arthur de Oliveira Maia já acenou com a possibilidade de novas flexibilizações Foto: Gilmar Felix/Agência Câmara - 14/2/2017
Para se aposentar por tempo de contribuição no Brasil não é necessário cumprir uma idade mínima, algo raro em todo o mundo. Acabar com esse tipo de aposentadoria é um dos pilares da reforma da Previdência que está em tramitação no Congresso, embora a votação esteja passando por sucessivos adiamentos.
Essa modalidade de benefício é considerada pelo governo um dos privilégios concedidos pelas regras atuais porque permite que pessoas mais novas e em geral com maiores salários solicitem a aposentadoria cedo e com valor médio de benefício mais elevado, onerando as contas previdenciárias, que tiveram o rombo recorde de R$ 268,8 bilhões no ano passado.
Quem se aposenta por tempo de contribuição (de 35 anos para homens e 30 para mulheres) tem, em média, 54,9 anos e recebe quase R$ 2 mil por mês. Já quem se aposenta por idade tem, na média, 60,9 anos e recebe R$ 950. Os dados da idade média são de 2016. Apesar de serem menos numerosos (6 milhões de pessoas), os aposentados por tempo de contribuição custam mais para a Previdência que os 10,5 milhões de aposentados por idade. Em dezembro, o primeiro grupo recebeu R$ 11,8 bilhões, enquanto o segundo custou R$ 9,95 bilhões.

A avaliação de especialistas é que o crescimento dos pedidos de aposentadoria por tempo de contribuição tem se dado porque, além da maior formalização do mercado de trabalho (um fator positivo, que eleva o número de pessoas que chegam aos 30 ou 35 anos de contribuição necessários), há o medo da aprovação da reforma, que eliminaria a possibilidade desse tipo de aposentadoria, e um avanço nos pedidos antes represados por conta do fator previdenciário – uma regra estabelecida no governo Fernando Henrique que punia com uma redução no benefício quem quisesse se aposentar muito cedo.
No fim de 2015, o Congresso aprovou uma regra de cálculo mais benéfica, que é conhecida como 85/95. Ela permite que os segurados obtenham o direito a receber 100% do salário como aposentadoria (respeitado o teto do INSS, de R$ 5.645,80) desde que o tempo de contribuição mais a idade some 85 anos (mulheres) e 95 anos (homens), e respeitado o tempo mínimo de contribuição de 35 anos para homens e 30 para mulheres.
“Sem dúvida é um alerta para as contas da Previdência e também sobre o 85/95. Se não aprovar a reforma, teríamos de no mínimo mudar a regra de cálculo do benefício por tempo de contribuição”, diz o ex-secretário de Políticas de Previdência Social, Leonardo Rolim, hoje consultor de Orçamento na Câmara dos Deputados.
O consultor do Senado Pedro Nery, especialista em Previdência, lembra que o 85/95 deixou a Previdência ainda mais desequilibrada. “O valor médio dos benefícios é maior e eles duram mais tempo, porque a idade mínima na concessão é menor e a sobrevida tende a ser maior”, observa. Pelos dados do IBGE, quem tem 54,9 anos tende a viver mais 26,2 anos. Já para quem tem 60,9 anos, a sobrevida média é de 21,5 anos.
Exceção. Um dos principais argumentos do governo em defesa da reforma da Previdência é que o Brasil ainda é um dos poucos países a manter a possibilidade de aposentadoria por tempo de contribuição. Mesmo onde ela é possível, os técnicos dizem que a exigência costuma ser maior, como de 40 anos de contribuição no Equador.
A aprovação da reforma da Previdência ainda enfrenta resistências no Congresso Nacional. Diante das dificuldades para convencer os parlamentares a apoiar a proposta, o relator, deputado Arthur Oliveira Maia (PPS-BA), acenou na semana passada com a possibilidade de novas flexibilizações no texto. Ele fez questão de ressaltar, porém, que não abre mão da fixação da idade mínima. “O que trouxer voto, e que não traga alterações nos pontos essenciais, fim dos privilégios e idade mínima, podemos sim absorver como mudanças”, disse.

Sai relatório da renovação da Malha Paulista, ANTT


18/12/2017 - ANTT
A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) liberou o relatório final da audiência pública 010/2016, que trata da renovação do contrato de concessão da Malha Paulista.
Foram recebidas 436 contribuições, sendo 31 aceitas e 88 parcialmente aceitas. As principais mudanças dizem respeito ao caderno de investimentos e ao tratamento a ser dado aos trechos inoperantes, com tráfego suspenso.
A ANTT revisará o Caderno de Engenharia e o Anexo 1 (Caderno de Obrigações), da minuta de Termo Aditivo, visando reavaliar o valor a ser considerado como investimento, na modelagem econômica., responde a agência no relatório final por ter sido questionada pelo fato da maior parte das obrigações de investimento serem de material rodante.
Em relação aos trechos inoperantes, a agência responde que mostra-se prudente aperfeiçoar os Estudos Técnicos relacionados aos ramais sem tráfego, visando verificar a possibilidade de recuperação dos trechos, com o objetivo de capacitá-los para a prestação do serviço de transporte ferroviário de cargas. No caso de inviabilidade técnica ou econômica para a exploração dos trechos, deverá ser demonstrada as razões, bem como ser realizado estudo específico, com a finalidade de se identificar o potencial do(s) respectivo(s) trecho(s), para destinação diversa do transporte ferroviário de carga, visando o interesse público.
A agência também aceitou destinar parte dos recursos obtidos com a concessão à preservação da memória e do material histórico das ferrovias.
Veja a íntegra do relatório final: