A atual política econômica passou ao largo da questão do crescimento econômico para pôr o foco na questão fiscal com compromisso em atingir 1,2% do PIB no resultado primário (receitas menos despesas exclusive juros) neste ano e acima de 2% do PIB nos dois anos seguintes.
Este compromisso consta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015. Mas a LDO apresenta, também, outras variáveis macroeconômicas que são metas a serem atingidas pelo governo. Entre elas a relativa ao crescimento econômico cujas metas estabelecidas pela nova equipe econômica foram de crescimento de 0,8% neste ano, 2,0% em 2016 e 2,3% em 2017. Assim, nos primeiros três anos da nova política econômica o País teria um crescimento médio anual de 1,7%. É muito pouco se comparado a média para o mesmo período dos países emergentes (4%) e mundo (3%), e também, face ao histórico do País dos últimos 15 anos (2000 a 2014) que foi de 3,1%.
Para este ano, a previsão da LDO de 0,8% de crescimento parece otimista face às previsões de crescimento constante do Boletim Focus do mercado financeiro, que prevê retração de 0,5% e tendência a piorar mais.
Caso nada se faça, o cenário futuro é preocupante. Baixo crescimento é prenúncio de elevação do desemprego e consequente tensão social e política. Mas, o que pode ser feito para retomar o crescimento ocorrido no período 2004/2010 de 4,4% anual? Vejamos.
Barreiras - Ao invés de criar novos estímulos tributários como fez no passado o governo é melhor retirar as barreiras ao crescimento. São tantas e tão potentes que é difícil explicar porque o País já cresceu no passado. Refiro-me às barreiras ao consumo e ao investimento. Ei-las.
Barreiras ao consumo: a) taxas de juros do sistema financeiro; b) má distribuição de renda; c) regressividade tributária; d) alto custo de vida para atividades essenciais; e) baixo valor dos programas de renda.
Barreiras ao investimento: a) baixo crescimento; b) Selic elevada; c) taxas de juros para as empresas; d) alta carga tributária; e) câmbio apreciado; f) excesso burocrático; g) mudanças frequentes de regras e; h) falta de plano estratégico ao País.
Neste artigo vamos analisar e propor medidas para a retirada de barreiras ao consumo e no próximo pretendo tratar das barreiras ao investimento.
Taxa de juros ao consumo - Segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade (Anefac), essas taxas nos últimos quatro anos foram em média de 103% ao ano e atualmente estão em 108%, comparada com cerca de 10% na média dos países emergentes e 3% nos países desenvolvidos. Assim, quem compra no crediário paga mais do dobro (!) na aquisição de um bem. Esse é o maior freio ao crescimento.
Para reduzir essas taxas é necessário estimular a competição bancária. Para isso, torna-se necessário reduzir seus ganhos com operações de tesouraria (aplicações em títulos do governo) posicionando a Selic ao nível da inflação e reduzir e tabelar as tarifas bancárias. Ao restringir esses ganhos anormais, os bancos são obrigados a disputar o mercado de crédito com maior intensidade e, ampliando a competição, caem pela ação do mercado essas taxas de juros. É assim que funciona nas economias dinâmicas.
Má distribuição de renda - A massa de recursos que se dirige ao consumo depende da renda disponível das famílias. Essa renda quando concentrada em mãos de poucos freia o consumo.
Segundo o IBGE, em 1981 a metade da população mais pobre detinha 13,1% da renda e os 10% mais ricos detinham 53 vezes mais renda que os 10% mais pobres. Em 2002 a distribuição piorou um pouco: os indicadores foram respectivamente 13,0% e 60 vezes.
A partir de 2003 começou alguma melhora nessa distribuição e em 2013 esses indicadores passaram respectivamente a 16,4% e 43 vezes. É uma evolução modesta, mas se continuar progredindo, serão milhões de novos consumidores a participar do mercado.
Para mudar isso leva tempo e envolve melhorar a educação e ampliar programas de renda (ver adiante).
Regressividade tributária - O sistema tributário se caracteriza por priorizar a tributação sobre o consumo em contraposição à tributação sobre a renda e patrimônio. Cerca da metade da carga tributária é sobre o consumo, 10% sobre a renda e 3% sobre o patrimônio. Nessa carga sobre o consumo metade é devida ao imposto estadual ICMS, que tem alíquotas elevadas.
Qualquer tentativa de reduzir a regressividade tributária não passa no Congresso ou nas assembleias legislativas por contrariar interesses dos parlamentares. Na União é o caso da alíquota máxima de 27,5% sobre os rendimentos no imposto de renda, talvez a mais baixa do mundo, e a não regulamentação do Imposto sobre as Grandes Fortunas (IGF) previsto na Constituição. No caso dos Estados é a alíquota de 4% sobre a herança, a mais baixa do mundo. A remoção dessa barreira ao crescimento é talvez a mais difícil de ocorrer e pressupõe maior conscientização da sociedade dos males causados pela regressividade. Fato é que essa forte tributação sobre o consumo torna os preços mais caros em cerca de 40%.
Alto custo de vida para atividades essenciais - A maior parte da renda das pessoas é consumida em atividades essenciais como alimentação, transporte, saúde, educação e habitação e, quanto menor a renda, mais peso no orçamento doméstico tem essas atividades. Para cada uma delas existem políticas públicas conhecidas, mas insuficientemente aplicadas que poderiam reduzir os custos dessas atividades. Um exemplo é o abastecimento de gêneros alimentícios, onde as prefeituras podem aproximar o produtor no campo ao consumidor na cidade, o que traz maior ganho ao produtor e menor despesa ao comprador ao reduzir a intermediação onerosa da cadeia de atravessadores. Ao reduzir custos das atividades essenciais, o orçamento doméstico fica mais folgado para uso em consumo, lazer ou poupança. Há muito por fazer removendo parte dessa barreira.
Baixo valor dos programas de renda - A partir do governo Lula foram substancialmente ampliados os programas sociais. Apesar disso, o principal programa do governo, o Bolsa Família, custou no ano passado R$ 25 bilhões, que foi dez vezes menor do que as despesas com juros que atingiram R$ 251 bilhões. O valor transferido à base da pirâmide social volta praticamente todo para o consumo, ativando o comércio e a produção. Ao reduzir as despesas com juros abre-se espaço para aumentar programas de renda, sem afetar o equilíbrio fiscal.
Essas diversas barreiras que atravancam o crescimento podem ser assemelhadas a uma sala onde os móveis estão fora de lugar atrapalhando a circulação. Colocá-los no lugar além de melhorar a circulação cria ambiente agradável de convívio. A retirada das barreiras tem impacto não só no crescimento, mas no bem estar geral da população. E, além de tudo, o governo não precisa de novas leis para isso, podendo trabalhar sem depender de barganhas com o Congresso.
Caso não retire essas barreiras, nem o crescimento medíocre de 1,7% anual nos próximos três anos previstos na LDO irá ocorrer. Portanto, urge retirá-las.