quinta-feira, 28 de março de 2013

Drible no passado - Audálio Dantas



É de se questionar se um ex-colaborador da ditadura deveria representar o Brasil na Copa do Mundo

Muitas imprecisões já rondaram o caso Vladimir Herzog, morto no DOI- Codi no dia 25 de outubro de 1975. Suicídio? Não. Descuido dos militares, que ultrapassaram os limites da tortura? Ou assassinato deliberado, simplesmente para demonstrar poder? Fica a dúvida até hoje. Fato é que, nessa trama urdida pela ultradireita do II Exército, muitos atores desempenharam importante papel, como Sérgio Fleury, Harry Shibata, Ednardo D'Ávila Mello, Fausto Rocha e Cláudio Marques, nomes conhecidos da história. Mas, no desenrolar dessa trama, outros desempenharam papel coadjuvante. Entre eles, José Maria Marin.

O nome voltou à tona a partir de um texto do repórter britânico Andrew Jennings (http://migre.me/dud4t). Também esquentou o caldo a campanha de Ivo Herzog contra a presença de Marin na presidência da CBF(http://migre.me/dud6w). Mas, à época deputado estadual pela Arena, Marin pode ser considerado um serviçal menor nessa história. No paralelo corria uma caçada aos jornalistas, acusados de promover uma infiltração comunista na imprensa paulista - e muitos discursos feitos por políticos na Assembleia pretendiam oferecer acusações e pretextos para justificar as prisões desses jornalistas. Capitaneados por D'Ávila Mello, os militares estavam à caça desde julho de 1975. Em setembro, já diretor de jornalismo da TV Cultura, Vlado estava no alvo: era acusado de liderar a dominação comunista na emissora.

Quinze dias antes da prisão de Vlado, o deputado Wadih Helu tomou a palavra para criticar a TV Cultura, que, dizia ele, estaria dominada por subversivos. Viria depois a intervenção de José Maria Marin, endossando tais críticas num aparte. Na carona de Helu, Marin fez uma figuração a serviço dos militares. Um papel menor, insisto. Mas que, àquele momento, contribuiu com essa trama. Quem resgatou essa questão foi Juca Kfouri nos últimos tempos, ao compartilhar trechos das intervenções de Marin publicados no Diário Oficial (http://migre.me/dudzy).

Atores maiores foram Cláudio Marques e principalmente Fausto Rocha - os jornalistas"democráticos" -, que acusavam e entregavam outros jornalistas. Numa solenidade da Escola Superior de Guerra, no Palácio dos Bandeirantes, Fausto Rocha fez um discurso inflamadíssimo contra a profissão de repórter, dizendo que as redações estavam dominadas por comunistas. À época eu presidia o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo. Em nota, criticamos esse discurso de Rocha - afinal, era uma acusação perigosa e, na minha opinião, não inocente. Assim se iniciou o papel do sindicato. Tínhamos um movimento de fortalecimento do sindicato nas redações, com um projeto político: a resistência à ditadura. Aí inventaram que pretendíamos tomar de assalto a imprensa brasileira e, de repente, disseram que estávamos armando um complô! Certo que havia muito delírio naquelas circunstâncias - mas, muitas vezes, um delírio "deliberado".

Fui convocado pelo comandante do II Exército para discutir essa nota. No fim da conversa, disse-me o general D"Ávila Mello: "Vocês cometeram uma grande injustiça. Esse rapaz (Fausto Rocha) tem razão. Os comunistas estão infiltrados nas redações". Saí de lá espantado com essa declaração. Depois disso explodiu essa campanha contra jornalistas, que teria estopim em outubro: 11 jornalistas foram sequestrados; Vlado, o 12°. Antes dele, 21 foram mortos (ou até hoje são considerados desaparecidos políticos) desde 1964. Outubro mostrou que as acusações semeadas em julho estavam se concretizando.

Três dias antes da morte de Vlado, acontecia uma conferência da Sociedade Interamericana de Imprensa, presidida por Julio de Mesquita Neto. Num momento de ousadia, pedi a palavra. Era uma quarta-feira. Pedi a palavra e disse os nomes dos jornalistas presos, pensando que isso evidentemente se destacaria, pois estaria denunciando prisões ilegais diante de jornalistas de vários países das Américas. Isso irritou os militares que, num primeiro momento, recuaram. E, erradamente, pensei que eles continuariam a recuar cada vez mais. Mas não.

Fui convocado outra vez, para justificar essas declarações ao Exército. Disseram-me que estava caminhando num processo de clara subversão e que poderia ser enquadrado no artigo 14 da Lei de Segurança Nacional. Pensei: a coisa ficou feia. Podia ser a minha vez. Ao mesmo tempo, tinha consciência de que, uma vez feita a denúncia, estaria relativamente protegido. A convocação era uma intimidação, uma afirmação da autoridade. "Os senhores do sindicato fiquem tranquilos", disse um general. Imagine se ficamos...

Nós, jornalistas, estávamos no meio de uma briga de cachorro grande. De um lado, os linha-dura. De outro, os militares que queriam garantir o retorno gradual à democracia - sempre faço essa ressalva. Uns pensavam que, se não afrouxassem as cordas um pouco, o regime poderia explodir. De fato, explodiu a partir do assassinato de Vlado. Pois foi o primeiro caso em que fizemos uma denúncia contundente contra uma morte nos porões, deflagrando um forte movimento de protesto. Ao lado de outros companheiros, eu tinha consciência de que estávamos entrando numa briga. E a censura certamente era nossa maior inimiga. Nisso, um fato importante foi a retirada da censura ao jornal O Estado de S. Paulo, em janeiro de 1975, o que contribuiu para que, no caso Vlado Herzog, publicássemos a notícia da morte. Também o culto ecumênico, noticiado com destaque principalmente pelo Jornal da Tarde, contribuiu para esse movimento - apesar da cidade sitiada para impedir a chegada à Catedral da Sé, 8 mil pessoas marcaram presença nesse dia, um marco na luta contra a ditadura, que já começaria a ruir.

Diante dessa trama maior, é natural questionar sobre José Maria Marin: como um homem (não só um deputado, mas vice-governador e depois governador) com esse passado pode ocupar um cargo dessa relevância no presente? Como um cara assim pode representar o Brasil, nesses tempos de Copa do Mundo? Na minha opinião, isso é simplesmente uma consequência da leniência do Brasil em relação aos que contribuíram (direta ou indiretamente, com maior ou menor papel) com a ditadura militar. Sei que, legalmente, o governo não pode interferir: Marin não pode ser demitido. No entanto, o governo poderia influir politicamente.

Além disso, sabemos que há muitas pessoas de passado importante na história de repressão que atualmente ocupam cargos na política nacional. A leniência persiste, mas a resistência precisa continuar. Estou trabalhando na Comissão da Verdade, Memória e Justiça dos Jornalistas Brasileiros, que contribuirá com a Comissão Nacional da Verdade. Minha questão principal é: no caso Herzog, como em muitos outros, não foram esclarecidas as circunstâncias dos assassinatos. Vemos agora que casos mentidos e desmentidos durante 30 e tantos anos, como o do deputado Rubens Paiva, precisam ser revelados. É a hora de esclarecer esses detalhes.

Depoimento a Juliana Sayuri

Lula pede atuação unificada da comunicação sindical para garantir autonomia perante a velha mídia



27/02/2013

Ex-presidente aponta necessidade de integrar veículos da classe trabalhadora

Escrito por: Luiz Carvalho


Da esquerda para a direita: Rosane Silva (secretária da Mulher Trabalhadora), Vagner, Lula, Gilberto Carvalho (ministro-chefe da secretaria Geral da Presidência da República), Carmen Foro (vice-presidente) e Rui Falcão na abertura do encontro da direção nacional
Da esquerda para a direita: Rosane Silva (secretária da Mulher Trabalhadora), Vagner, Lula, Gilberto Carvalho (ministro-chefe da secretaria Geral da Presidência da República), Carmen Foro (vice-presidente) e Rui Falcão na abertura do encontro da direção nacional
Com a presença de todos seus ex-presidentes, de prefeitos, ex-ministros e de Lula, a Central Única dos Trabalhadores deu início à comemoração dos 30 anos em reunião da direção nacional na manhã desta quarta-feira (27), em São Paulo

Um dos fundadores da maior entidade sindical da América Latina, Lula falou sobre o papel da CUT na redemocratização do Brasil, na ampliação de direitos e citou a importância de a comunicação atuar de maneira articulada para vencer o bloqueio da mídia conservadora.

“Não vivo reclamando do espaço que me dão, agora eu reclamo do que falta fazer para ter o espaço que quero, independente deles”, afirmou Lula, referindo-se aos veículos da velha mídia.

Segundo ele, o movimento sindical produz muito, mas de maneira desarticulada.

“Temos uma arma poderosa e totalmente desorganizada. Temos que mapear a quantidade de panfletos, jornais, revistas rádios e sites que já existem. Por que a gente não organiza o nosso espaço, porque não começa a organizar a nossa mídia, porque não tentamos organizar um pensamento mais coletivo, unitário? Temos condição de fazer isso e o movimento vai precisar. Não temos que pedir favor”, definiu.

Sem pedir licença

Lula lembrou que a criação da Central foi um ato de ousadia e desobediência e que o “radicalismo” não pode perder espaço.

“Quando a CUT foi fundada, diziam que era muito radical, mas era necessário ser radical para ser firmar. Porque as pessoas não convidavam a gente para a festa deles, precisávamos falar grosso para as pessoas deixarem subirmos um degrau. A CUT não pode perder radicalidade e isso não significa ser sempre do contra, mas, que no final do ano tenha cesta de acúmulo da classe trabalhadora. A “peãozada” espera de vocês, seja numa escola, num banco, numa repartição pública, que conquistem para eles o que precisam e o que querem, não apenas o discurso”, lembrou.

Maria Godói (secretária Geral Adjunta) e Sérgio Nobre (secretário Geral) durante a cerimônia de abertura da direção
Maria Godói (secretária Geral Adjunta) e Sérgio Nobre (secretário Geral) durante a cerimônia de abertura da direção
Para ele, é necessário imaginar um país sem a Central para ter a noção da sua importância.


“Não é pouca coisa num Brasil com tão pouco experiência democrática uma central completar 30 anos. Estamos vivendo o mais longo período democrático. Se pegarmos a constituinte, são 25 anos. Fomos construindo a CUT com gestos, atitudes e quase 100% das nossas ações contrariavam a legislação sindical vigente, quase uma cópia da Carta del Lavoro, de Mussolini.  Fomos fazendo as coisas sem pedir licença, arrancando pedacinho por pedacinho sem pedir licença. Inclusive aqueles que saíram da CUT por crítica teriam que avaliar se conseguiríamos o que conseguimos sem a CUT, não apenas a conquista material, um aumento de salário, horas a mais ou menos, mas o alto grau concentração política que a Central conseguiu imprimir à classe trabalhadora.”

Referindo-se ao presidente da Central, Vagner Freitas, Lula comentou que acredita num mandato exitoso por conta da disposição do governo em atender as tratativas dos trabalhadores e porque, acredita, a economia brasileira e a massa salarial vai continuar crescendo, “apesar dos que torcem para dar errado."

De olho no futuro, o ex-presidente afirmou que a entidade deve estar sempre preocupada em investir na inovação de pensamento, da pauta de reivindicação e, principalmente, não esquecer nunca de manter-se em seu lugar.  

“A direção nacional tem que viajar esse país, que é muito desigual, nós temos muitos “brasis”. Façam reuniões que tiverem que fazer, a luta interna que tiverem de fazer. Mas, que sempre ao final vá para a rua. O lugar da CUT é nas ruas.”

Comunicação é prioridade

Presidente nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), Rui Falcão, lembrou lutas históricas comandadas pela CUT: as greves gerais contra o arrocho salarial e planos econômicos, contra as políticas neoliberais e as privatizações de Collor e FHC – e pelo impechment do primeiro –, a defesa da reforma agrária por meio de mobilizações como o Grito da Terra, na década de 1990, e as marchas que resultaram na política de valorização permanente do salário mínimo, contribuindo para tirar milhões de brasileiros da pobreza.

Para Lula, CUT não pode perder a
Para Lula, CUT não pode perder a
O dirigente citou ainda as prioridades do partido para o próximo período, temas que também integram a agenda de lutas da CUT: a reforma política e a democratização da comunicação.


Haverá uma coleta de assinaturas para uma emenda popular legislativa a favor do financiamento público de campanha, das listas partidárias, para a ampliação do espaço da mulher na política e da participação do povo nos espaços de decisão do governo.

No caso da comunicação, Falcão lembrou que o PT integra a campanha encabeçada pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), do qual a CUT faz parte, que também luta por uma emenda popular legislativa pela democratização dos meios de comunicação, um dos eixos estratégicos do Congresso Nacional da Central (CONCUT), em 1991.

“Vamos percorrer o país com Lula e Dilma para debater com população o que significam as transformações e conquistas da última década.”

Defasagem de lideranças e institucionalização das conquistas

Para o presidente da CUT, Vagner Freitas, o momento é propício para que a classe trabalhadora amplie o espaço de atuação.

“O capitalismo não se mostra capaz de resolver os problemas da humanidade. A crise econômica demonstrou isso e as grandes lideranças do mundo estão perdidas, incapazes de apresentarem alternativa. Chegou o momento de ocuparmos espaço de protagonismo na conjuntura mundial. Temos condições de apresentar propostas e ideias muito mais efetivas”, acredita.

Freitas ressaltou também que a Central deve manter-se autônoma, mas, sem jamais deixar de assumir posições.

Meneguelli, Vicentinho, Kjeld, João Felício, Luiz Marinho e Artur (sentados) e Vagner Freitas (em pé): presidente e ex-presidentes reunidos
Meneguelli, Vicentinho, Kjeld, João Felício, Luiz Marinho e Artur (sentados) e Vagner Freitas (em pé): presidente e ex-presidentes reunidos
“A CUT é uma central independente, mas tem lado e é o do projeto que construiu um país com justiça social nos últimos 10 anos, tirando trabalhadores da miséria.”


Secretário-Geral, Sérgio Nobre, acrescentou que é preciso manter a relação com os partidos para que as conquistas sejam institucionalizadas.

“Precisamos transformar em lei aquilo que conquistamos”, disse.

Homenagens – O primeiro coordenador da Conclat, Avelino Ganzer, o primeiro secretário de Imprensa e Divulgação, Gilmar Carneiro, a primeira mulher a coordenar um CONCUT, Mônica Valente e a primeira mulher a ocupar uma secretária nacional, Rosiver Pavan, foram homenageados. Funcionário mais antigo da CUT, Gilmar Burgani também recebeu uma placa como agradecimento aos trabalhadores que ajudaram a construir a história da Central.

Por fim, todos os ex-presidentes – Jair Meneguelli, Vicentinho, Luiz Marinho, Kjeld Jakobsen, João Felício, Artur Henrique – e o atual, Vagner Freitas, também foram homenageados.

O próximo palco das comemorações é, como pregou Lula, as ruas, no dia 6 de março, em uma grande marcha por Brasília. 

 

'Argumento contra barragens é falho'


BRUNO DEIRO - O Estado de S.Paulo
Ministro de Minas e Energia no governo Fernando Henrique Cardoso, o engenheiro e economista Francisco Gomide apresentou um relatório à Agência Nacional de Águas (ANA) e ao Ministério do Meio Ambiente no qual alerta para um déficit de grandes reservatórios no País. Para ele, se for mantida a política de optar por usinas do tipo fio d'água - que opera sem reservatório-, problemas de abastecimento e falta de controle de cheias, entre outros, serão sentidos nas próximas décadas.
Como o sr. vê a política de evitar os grandes reservatórios?
Há uma campanha equivocada contra barragens e reservatórios feita por entidades que promovem a consciência ambiental, o que é muito positivo, mas que investe contra alguns alvos errados. O Brasil está abrindo mão de riquezas naturais importantes, na forma de seus recursos hídricos. A questão de dimensionamento do número de reservatórios é científica.
Mais reservatórios deixariam o País menos vulnerável?
Sim, este dimensionamento pode ser projetado com a segurança que você quiser. O problema é que se você constrói como no Brasil, com a tradição de usinas novas a fio d'água e com o volume de armazenamento dos reservatórios existentes, fica cada vez mais difícil atender ao mercado crescente. É uma política equivocada que só vai ficar aparente daqui a 20 ou 30 anos.
De quantos reservatórios o País precisa para evitar riscos?
Não falamos em número de reservatórios, o certo seria em volume. O trabalho que fiz traz uma série de comparações, mas, em particular no setor elétrico, eu diria que os reservatórios estão ficando pequenos demais, pois são equivalentes a apenas quatro meses de fluxo normal. É muito pouco, deveriam equivaler a muito mais.
Existem exemplos em outros países que se possa aplicar aqui?
Os reservatórios americanos, por exemplo, equivalem a 165 dias da vazão média. Foram construídos há mais de 30 anos e não há evidências de que foram um erro. Se, por exemplo, todos os rios secassem de uma hora para outra por lá, os reservatórios aguentariam por 165 dias. Comparativamente, no Brasil, nós temos só 47 dias. E temos isso porque na década de 1950 alguns dirigentes iluminados fizeram a opção por hidreletricidade com grandes reservatórios. Desses 47 dias, 42 vêm do setor elétrico. Se não tivessem feito essa opção lá atrás, o armazenamento brasileiro seria de apenas 5 dias. Há 10 anos, paramos de projetar. O governo jogou a toalha e desistiu de enfrentar organizações ambientais equivocadas.
Em que outros fatores os reservatórios podem ser úteis?
Há milhares de anos os reservatórios servem para administrar os chamados eventos hidrológicos extremos. Mas moramos em um país que acha que não precisamos de obras de infraestrutura. O reservatório guarda água em um momento em que há excesso para ajudar na estiagem. Com o uso para irrigação, também pode aumentar a capacidade agrícola, que sobe exponencialmente.
O principal argumento contra os grandes reservatórios é o
impacto social e ambiental
causado pelos alagamentos.
Como o sr. vê este aspecto?
O problema é que os movimentos ambientais vão contra todas as obras. O equívoco que se comete, na minha opinião, é a ideia de que obras de infraestrutura causam impactos ambientais intoleráveis. Toda e qualquer obra causa impacto, mas não se pode abrir mão delas. A natureza se ajusta. As pessoas não aceitam a tese de que esse ajustamento é possível, de que se pode realocar a população que está na área do reservatório, de que o interesse público é maior que o particular.
O sr. acha que o custo ambiental é menor com os reservatórios?
O que estamos dizendo é: 'Segurem as hidroelétricas, mas, como o consumo segue crescendo, vamos usar as térmicas'. A térmica pega um naco do volume de energia e opera na base, opera sempre. Não sou contra, mas deve ser usada com bom senso. Como complementar é uma beleza, pois o caro é apenas o combustível, não a instalação.
Como o sr. vê a polêmica em torno da construção de Belo Monte, cuja principal crítica recai sobre o reservatório?
É uma obra lógica, mas que é obrigada a ser cortada até que as entidades ambientais aceitem. Aí já não é uma obra defensável, pois foi castrada, e não se pode mais dar uma opinião.


'Reservatórios são úteis, mas agridem ambiente'

22 de março de 2013 | 2h 10
O Estado de S.Paulo
Especialista em direito ambiental, o advogado Carlos Maurício Ribeiro, do escritório Vieira Rezende, defende que a proliferação de reservatórios não é a melhor política a ser adotada pelo governo para dar segurança hídrica e energética ao País.
Qual a sua opinião sobre a construção dos reservatórios?
Existem argumentos técnicos para um lado e para o outro. Militando na área ambiental, o que acho é que os grandes reservatórios foram construídos no passado, estão operando e têm sua função, mas o que temos de tomar cuidado é em ver que o mundo mudou neste período. Além do aumento populacional, houve redução brutal de áreas virgens. Por isso, quando se pensa na ideia de construir grandes reservatórios na região amazônica, acho que não deve ser feito. Há necessidade de explorar, mas o potencial hídrico é tão grande que usinas a fio d'água (que operam sem reservatório) são suficientes para a região, pois a vazão é muito grande e o potencial ecológico da biodiversidade local tem que ser protegido.
Como o sr. vê a construção do
reservatório em Belo Monte?
A gente sabe que inundação traz grandes impactos ambientais. Em Belo Monte, há discussão sobre mudança de vazão, há argumentos contra a construção da usina pelo fato de haver uma grande variação da vazão ao longo do ano. Se for assim, é até o caso de pensar se deveria mesmo colocar uma usina ali ou não, pois isso criaria grandes problemas ambientais. Em um país com potencial hídrico que é indiscutível, não é possível que não se possa dividir ao longo do território usinas fio d'água de forma eficiente, que possam gerar energia para diferentes áreas, sem a necessidade de construir obras faraônicas. As grandes barragens são eficientes, mas causam grandes problemas ambientais e têm impacto na qualidade de vida das populações.
Isso vale para todas as regiões? Em alguns lugares faz sentido, mas não serve como solução única. O que é bom para a usina de Três Marias (MG) pode não fazer sentido na Amazônia ou no Pantanal, que têm ecossistemas muito ricos e importantes. Não é simplesmente ser contra ou a favor dos reservatórios. Há de haver consenso e pensar o que é mais adequado e menos agressivo para cada região. Tudo isso deve ser objeto de um grande trabalho de levantamento de dados e convencimento.
Como solucionar a necessidade do uso de usinas térmicas, que poluem o ambiente?
Temos de usar o potencial eólico do Nordeste, por exemplo. A insolação no Nordeste, no Sudeste e no Centro-Oeste também, pois a energia solar está barateando. Mas vejo mais potencial no setor de gás, cujo gargalo é o sistema de escoamento. É uma fonte de energia para ser usada nas térmicas, muito menos agressiva do que a queima de óleo e carvão. Enfim, é preciso haver equilíbrio entre diferentes fontes de energia.
Como atingir o equilíbrio entre a necessidade de investimentos em infraestrutura e a questão ambiental?
Onde houver dúvida se a construção vai causar um mal maior que o benefício, aí é como cada um olha a questão da ecologia. Nesses casos, acho que deve partir para outra solução. Não se pode pensar apenas no que é mais eficiente para ter segurança energética. Também é preciso evitar políticas que causem, de forma desnecessária, o alagamento de grandes áreas de floresta ou a realocação de populações inteiras. / B.D.