Outro dia, ao noticiar a morte de Ney Latorraca, a TV citou o seu grande sucesso no teatro: "O Mistério de Irmã Vap". Um simples til que se intrometeu no texto mandou uma história de vampiro para o convento, não por culpa do apresentador. Ele sabia que se tratava de "Irma Vap", anagrama de "vampira". Foi apenas traído pelo teleprompter que, distraído como sempre, aceitou a "correção" automática, que é burra e vive se metendo onde não deve. Acontece com frequência —em 1990, a sagrada Elizeth Cardoso foi morta por outro apresentador como Elizabeth Cardoso.
Mas não vamos crucificar o corretor. Os humanos também erram. Marques Rebelo (1907-1973), grande escritor plebeu, autor de "A Estrela Sobe" (1939), tornou-se, na voz de uma severa palestrante, Marquês Rebelo. O poeta Cassiano Ricardo quis impressionar seus então admiradores concretistas citando o matemático alemão Frobenius (1849-1917). Mas chamou-o de Febrônio, um temido serial killer no Rio dos anos 1930. Malcolm X (1925-1965), líder negro americano que não aceitava usar seu sobrenome branco, foi canonizado num jornal como Malcolm 10º.
Ésquilo, o dramaturgo grego do século 6º a.C., autor de "Prometeu Acorrentado", virou Esquilo, não se sabe se o Tico ou o Teco. A peça "Antígona", de Sófocles, quase da mesma época, e talvez por isso, virou "Antigona". "Losango Cáqui", livro de Mario de Andrade, de 1926, transformou-se em "Losango Caqui", como na fruta. E Jesus Cristo, coitado, morreu em vão na cruz —alguém preferiu enforcá-lo. Todos esses tropeços foram dados por pessoas cultas. Ou quase, algumas só no esmalte.
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