sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

Valorizar salário mínimo melhora distribuição de renda, mas tem custo fiscal enorme e mantém miséria, Fabio Giambiagi

Convido o leitor a uma reflexão que envolve responder a uma questão singela: qual deve ser a prioridade? Combater a miséria ou a desigualdade? Por trás dessa pergunta há nuances críticas envolvidas. Por que o tema é chave?

Em particular, porque a política de valorização do salário mínimo (SM) melhora a distribuição de renda medida pelo Índice de Gini, mas tem custos fiscais enormes, e, em matéria de combate à miséria, implica gastar dezenas de bilhões de reais para nada.

Pensemos em três situações que tendem a contrariar o senso comum.

Situação A


Imaginemos um prédio com cem pessoas, sendo 10 ricas e 90 pobres. Num determinado ano, os ricos perdem 10% de sua renda; e os pobres, 5%.

Que medida de distribuição de renda devemos perseguir é uma questão-chave
Que medida de distribuição de renda devemos perseguir é uma questão-chave Foto: Tiago Queiroz/Estadão

O que aconteceu com a distribuição de renda? Melhorou. O que ocorreu com os pobres? Sua situação piorou.

Situação B

Novamente, imaginemos um prédio com cem moradores, neste caso todos com a mesma renda. Num ano, um deles ganha na loteria, cujo prêmio, aplicado, passa a render uma boa renda na forma de juros.

O que aconteceu com a distribuição de renda? Piorou.

O que aconteceu com as pessoas que não ganharam na loteria? Nada: sua vida não mudou rigorosamente nada.

Situação C

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Caso da China. Em 1970, era um país no qual a maioria da população tinha uma renda paupérrima, com uma distribuição de renda bastante homogênea. Mais de 50 anos depois, o país é uma potência, com muitos milionários e uma classe média pujante.

O que aconteceu com a distribuição de renda? Piorou muito – mas todos os chineses melhoraram de vida.

Vale a pena perguntar a algum chinês se, por conta disso, quer voltar a viver com sua renda dos anos 1960.

É evidente que tudo o que foi dito é em linhas gerais, e não ignoro que uma coisa é ter um Índice de Gini de 0,3, e outra muito diferente é ter níveis de Gini como os do Brasil, acima de 0,5.

Aqui, porém, quero me ater a um ponto específico: que medida de distribuição de renda devemos perseguir? Essa é uma questão-chave. Por quê?

Porque, retomando o tema do salário mínimo, se este aumenta, a proporção de renda em poder dos 50% mais pobres tende a aumentar, mas a vida dos 20% mais pobres não muda nada – já que quem ganha SM não está entre os 20% mais pobres.

Numa escala de 1 a 10, em que 10 é o mais pobre, o governo deve se ocupar com quem está nos níveis 3 a 5 ou com quem está nos níveis 1 e 2?

Pessoalmente, entendo que a prioridade deve ser atacar a pobreza extrema. O tema dá um bom debate.

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Opinião por Fabio Giambiagi

Economista, formado pela FEA/UFRJ, com mestrado no Instituto de Economia Industrial da UFRJ



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