Mark Twain escreveu um telegrama certa vez dizendo que eram muito exageradas as notícias sobre sua morte, após a publicação equivocada de um obituário. Lembrei-me da tirada agora ao saber que a combalida Lykos Therapeutics entrou na alça de mira de um investidor amigo de Elon Musk com muita bala na agulha.
Antonio Gracias, do fundo Valor Equity Partners, organiza oferta de US$ 100 milhões (R$ 607 milhões) pelo controle da Lykos, noticiou o Financial Times. Ele administra bilhões de outros investidores, mas o desembolso para assumir a empresa sairia de sua fundação familiar, segundo o boletim Psychedelic Alpha.
A Lykos, que teve rejeitado pela FDA (agência de fármacos dos EUA) seu pedido de licença para aplicar MDMA (ecstasy) em psicoterapia para tratar transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), em agosto, precisa com urgência de mais recursos. Os atuais controladores, do grupo Helena, se dispõem a fazer aporte de US$ 20-30 milhões para custear o terceiro teste clínico de fase 3 exigido pela FDA.
A decisão da agência e a demissão de 75% do pessoal da Lykos após a negativa devem atrasar em ao menos cinco anos a entrada da terapia promissora no mercado. A bóia salva-vidas lançada por Gracias poderia abreviar isso, sobretudo agora que Donald Trump assume a Presidência dos EUA e entroniza no governo um Musk favorável a psicodélicos, assim como Robert Kennedy Jr.
Gracias é próximo de Musk. Foi investidor precoce na Tesla, enriquecendo com isso, e participa do conselho da Space X. Conta com o apoio de Rick Doblin, que iniciou os estudos com MDMA e fundou em 1986 a Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Maps, em inglês), cujo braço empresarial (Maps PBC) deu origem à Lykos com a chegada de outro socorro de US$ 100 milhões pelo Helena.
Doblin, um ex-hippie visionário e carismático, já vinha colecionando atritos com os gestores da Lykos, capitalistas profissionais com visão tradicional do setor farmacêutico e seu modelo baseado em patentes, regulamentação biomédica e lucros. Após a invertida da FDA, Doblin deixou o conselho da empresa.
Seu objetivo e dos filantropos que o ajudaram a criar a Maps e a financiar os primeiros testes clínicos de MDMA, ao longo de quatro décadas, nunca foi gerar lucros. Seu propósito era reabilitar a substância como medicamento empatógeno facilitador de psicoterapia, como já era usada antes da proibição em 1985.
A virada de casaca de Doblin não dá garantia de sobrevivência à Lykos, nem de que Gracias também não acabe se estranhando com Doblin e sua turma. Se assumir o controle, o investidor deve chamar para gerir a empresa Jeff Aronin, da empresa de biotecnologia Paragon Biosciences, pivô de uma controvérsia sobre preço exorbitante (US$ 90 mil por ano) fixado para um novo medicamento contra distrofia muscular.
A reunião do conselho da Lykos para debater a investida de Garcia, semana passada, nem chegou a se realizar. Em vez disso ocorreu a renúncia de três membros, como informa Josh Hardman do Psychedelic Alpha: Jeff George, Scott Giacobello e Jason Pyle.
O paciente em coma se agita no leito, mas ainda não despertou.
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