Mark Zuckerberg, autoproclamado CEO da humanidade, declarou nesta semana que a Meta não vai mais regular o seu conteúdo. A reação geral foi de espanto: em algum momento a Meta havia regulado?! Não foi através do Facebook que o terraplanismo, a cloroquina, o 6 de janeiro nos EUA, o 8 de janeiro no Brasil e a "mamadeira de piroca" foram difundidos? Não é através do Instagram que meninas pesquisando "como perder peso" começam a receber dicas para vomitar depois de comer, sem que seus pais percebam? (Vejam "O Dilema das Redes", leiam "A Máquina do Caos", "Dez Argumentos para Você Deletar Agora suas Redes Sociais", "A Geração Ansiosa"... A bibliografia é extensa).
Apesar do estrago causado, o NEO (nerd executive officer) pensa que são posturas legítimas, autoritariamente censuradas por cortes obscuras do terceiro mundo, defender a Terra plana, dizer que atores bebem sangue de crianças no subsolo de uma pizzaria em Hollywood (vejam a série da HBO, "Q: No Olho da Tempestade"), afirmar que vacina causa autismo e influenciar depressão e suicídio em adolescentes.
O argumento do DEO (delinquente executive officer), que surpreendentemente encontra ecos mundo afora, inclusive no Brasil, é que as redes sociais são um espaço de diálogo, uma ágora onde ideias são colocadas e as melhores prevalecerão. Como se a batalha de informações não fosse anabolizada pelos algoritmos, matematicamente enviesados desde o berço. As redes sociais são uma rinha de galo em que águias lutam com pintinhos. As águias, claro, são a Terra plana, os pintinhos são o mapa-múndi.
Segundo o jornal inglês The Guardian, "estudos mostram que posts falsos viralizam 20 vezes mais rápido do que os verdadeiros, especificamente se tiverem conteúdo radical ou ultrajante, como conspirações governamentais, ataques racistas e estímulos à violência. Isso significa 2000% mais engajamento e 2000% mais dinheiro em publicidade. (...) Quanto mais distante da realidade for o post, melhor". "Em 2016, Andrew Bosworth, vice-presidente da Meta, argumentou num email que incentivar suicídios e ataques terroristas era um preço aceitável a se pagar pelo benefício (...) de conectar mais usuários. Quando o email vazou, em 2018, Zuckerberg disse que discordava —mas essa é, claramente, a filosofia reinante na Meta. Em 2022, Bosworth foi promovido a chefe de tecnologia."
Não há qualquer dúvida de que LIBERAR fake news numa máquina que foi construída e aperfeiçoada para PROMOVÊ-LAS vai criar ainda mais bagunça neste mundo já tão caótico. Neste exato momento, enquanto Los Angeles pega fogo, os trumpistas difundem nas redes sociais que a culpa é do feminismo, que botou uma mulher como chefe dos bombeiros de LA, dos democratas, que doaram equipamentos para a Ucrânia e demitiram milhares de soldados que se recusaram a tomar a vacina durante a pandemia. Tudo mentira. Ou, segundo alguns, "liberdade de expressão".
O resumo do discurso do Mark Zuckerberg é: "Um presidente escroto foi eleito. O mundo, portanto, abriu bem mais espaço para a escrotidão. Vou deixar meu cabelo compridinho e, para ganhar mais dinheiro, vou fingir que ser escroto é ser moderno e estar em contato com os anseios da população". Talvez seja. Chutar a cara de uma pessoa caída, durante um linchamento, também é saber ler, naquele exato momento, os anseios da população —e certamente não fará deste mundo um lugar melhor.
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