domingo, 26 de junho de 2022

Redes sem lei, editorial FSP

 

A jornalista Maria Ressa, Nobel da Paz em 2021 - Eloisa Lopez - 14.fev.19/Reuters

A esta altura estão mapeados os dissabores trazidos pelas redes sociais ao cotidiano social e político das nações. Se a dominância dessas plataformas digitais impulsionou e adensou as interações entre as pessoas em escala planetária, de outro lado acarretou oligopolização, manipulação dos fatos, fraudes e assédio também em profusão.

Testemunha e vítima dessa faceta ameaçadora das mídias sociais, perseguida pelo governo autoritário de Rodrigo Duterte nas Filipinas, a jornalista Maria Ressa, Nobel da Paz de 2021, descreveu-as em entrevista à Folha como "uma bomba atômica que explodiu em nosso ecossistema de informação".

O mecanismo de reiterações labirínticas empregado pelos algoritmos, ao premiar os discursos ofensivos e as elucubrações fantásticas e mentirosas, estaria minando as bases da própria democracia, como os sistemas de pesos e contrapesos, de acordo com Ressa.

A ubiquidade e a influência das plataformas operadas por gigantescos oligopólios, afirma, estão subtraindo dos cidadãos e dos eleitores o seu livre-arbítrio. A laureada pela Academia Sueca parece atribuir a esse fator a vitória, no pleito de maio passado, de Ferdinand Marcos Jr. —filho do ditador que deu as cartas de 1965 a 1986— e Sara Duterte —filha de Rodrigo— para presidente e vice das Filipinas.

Há que tomar cuidado e lastrear-se em evidências sólidas quando se coloca a efetividade de processos eleitorais em dúvida porque supostamente o eleitorado teria sido ludibriado com informações manipuladas. Mas não é preciso partilhar em toda a extensão das opiniões de Maria Ressa para concordar com ela no essencial.

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Ilegalidades que não se praticavam na mesma extensão e profundidade antes da hegemonia das redes sociais tornaram-se lugar-comum. As autoridades incumbidas de fazer cumprir a lei onde quer que seja ainda comem poeira quando se trata dessas plataformas.

Corresponsabilizá-las pelos crimes cometidos por meio dos seus serviços é providência básica para limpar o terreno bárbaro. Também é elementar evitar que seu enorme poderio de mercado seja usado para esterilizar a competição, pela qual poderão florescer opções de melhor qualidade informativa.

Pois não há dúvida de que o combate ao turbilhão de falsificações oportunistas que jorra nas redes passa pelo exercício do jornalismo profissional, que questiona os poderosos com base na apuração e na publicação de fatos objetivamente verificáveis e se exerce em praça pública, não nos escaninhos ensimesmados das aldeias digitais.

A sociedade aos poucos vai percebendo que não se substitui jornalista por "influencer" sem dano ao patrimônio comum da civilização.


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