segunda-feira, 13 de junho de 2022

É o empobrecimento, editorial FSP

 

Fila para o auxílio emergencial na cidade de São Paulo, em 2021 - Jardiel Carvalho, 30.abr.21/Folhapress

É notável como a recuperação da economia brasileira desde a recessão provocada pela pandemia não se traduz hoje em percepção geral de maior bem-estar, o que também tem consequências sobre a popularidade de Jair Bolsonaro (PL). Novos dados do IBGE sobre a queda do poder de compra em 2021 jogam luz sobre o fenômeno.

O Produto Interno Bruto teve expansão de 4,6% no ano passado, recuperando-se da queda de 3,9% provocada pela Covid-19 em 2020. Esse ganho, apurado a partir da produção de indústria, serviços e agropecuária, não se reflete nos valores declarados pelas famílias.

O rendimento domiciliar per capita —vale dizer, a renda disponível em cada domicílio, dividida pelo número de moradores— teve queda de 6,9% no período. Em valores corrigidos, caiu de R$ 1.454 para R$ 1.353 mensais.

Ressalve-se que essa pesquisa do IBGE, feita por meio de entrevistas em uma amostra de residências, tende a subestimar rendas como as oriundas de patrimônio e aplicações financeiras. Ainda assim, os números bastam para escancarar como as perdas de poder de compra se distribuíram de forma desigual na população.

Para a metade mais desfavorecida dos brasileiros, o baque foi muito maior, de 15,1%, e os valores mensais per capita encolheram de R$ 489 para R$ 415. Se considerados os 5% mais pobres, a queda chega a brutais 33,9%, de R$ 59 para R$ 39.

Em contraste, o topo da pirâmide social declara danos menores, de 6,9% no 1% mais rico, cujos rendimentos per capita ficaram em R$ 15.940 mensais —provavelmente subestimados, repita-se.

Grande parte da discrepância pode ser atribuída ao fim do auxílio emergencial de R$ 600 pago durante a pandemia, que contribuiu para um considerável incremento da renda dos mais pobres em 2020, mesmo durante a paralisação das atividades econômicas.

O outro fator principal é a escalada da inflação, que, como sempre, tem impacto muito mais dramático sobre o poder de compra dos que dependem do trabalho menos qualificado. Mesmo com alguma recuperação do emprego a partir do ano passado, os salários perderam para os preços.

A resposta da política pública foi precária. A criação do Auxílio Brasil se justificava pela necessidade de ampliar a rede de proteção social, mas serviu de pretexto para uma elevação geral de gastos públicos de objetivos muito menos nobres.

Se Bolsonaro não pode ser responsabilizado pela onda inflacionária global, seu governo agrava os efeitos e dificulta o controle da carestia ao desorganizar as finanças públicas e minar a credibilidade da política econômica. Os mais prejudicados têm domicílio conhecido.

editoriais@grupofolha.com.br

Nenhum comentário: