quinta-feira, 8 de maio de 2025

Leão 14 é um sucessor de Francisco com cidadania peruana, FSP

 Rodrigo Toniol

Rodrigo Toniol

Professor de antropologia da UFRJ, é membro da Academia Brasileira de Ciências

A eleição de Robert Francis Prevost como novo papa é um gesto que consolida, mais do que inaugura. O agora Leão 14 representa a continuação de uma inflexão já em curso desde 2013, quando Jorge Mario Bergoglio se tornou o primeiro papa latino-americano.

O centro simbólico da Igreja continua a se deslocar: geograficamente para o chamado Sul Global, institucionalmente para uma eclesiologia centrada na escuta, na mediação e no cuidado pastoral.

O novo papa Leão 14 sinaliza para o público da sacada da Basílica de São Pedro após ser eleito - Stoyan Nenov/Reuters

Prevost não é um outsider. Formado pela Ordem de Santo Agostinho, com experiência pastoral no Peru e posterior inserção na Cúria Romana, sua trajetória responde a duas exigências do tempo presente: capacidade de articulação institucional e experiência direta em contextos periféricos. Sua nomeação como prefeito do Dicastério para os Bispos, em 2023, foi uma das decisões mais estratégicas de Francisco. À frente de um dos principais órgãos responsáveis pela nomeação episcopal, Prevost teve papel direto na reconfiguração do episcopado global, orientando-se por critérios mais pastorais que doutrinários.

Leão 14 é o primeiro papa agostiniano em séculos e o segundo consecutivo com trajetória latino-americana, ainda que nascido nos Estados Unidos.

A escolha de seu nome papal remete a Leão 13, que no final do século 19 tentou articular a tradição doutrinária com os desafios sociais do mundo moderno. A analogia parece adequada ao momento atual: mais do que enfrentar um mundo secular, trata-se de operar dentro dele com gramáticas religiosas que não se reduzam à oposição ou à nostalgia.

A figura de Prevost permite observar esse movimento. Missionário no Peru durante mais de uma década, tornou-se bispo em Chiclayo (também no país sul-americano) e, mais tarde, delegado apostólico em dioceses com problemas internos. Em todos os casos, sua atuação foi marcada por uma disposição ao diálogo e à reorganização silenciosa de estruturas locais. Ao ser chamado a Roma por Francisco, passou a desempenhar um papel menos visível, mas mais decisivo. Sua ascensão ao papado não responde a uma lógica eleitoral interna, mas à sedimentação de um ethos de governo que privilegia perfis técnicos com densidade pastoral.

A presença de um papa com cidadania peruana, experiência nas periferias urbanas e longa atuação na América Latina não é apenas um dado biográfico. Ela condensa uma mudança de fundo na distribuição de legitimidade eclesial. O chamado Sul Global deixa de ser visto como território de missão e passa a ser reconhecido como espaço produtor de teologia, liderança e autoridade. Ao mesmo tempo, a Cúria é ocupada por figuras cuja formação não se deu exclusivamente nas universidades romanas, mas nas frentes pastorais e nos conflitos cotidianos.

É provável que Leão 14 mantenha o estilo de governo colegiado e a abertura aos processos sinodais. Também é provável que enfrente resistências. Os campos de tensão dentro da Igreja não desaparecem com uma eleição. Mas a escolha por um perfil como o de Prevost indica que o caminho aberto por Francisco permanece em curso, ainda que sob nova condução.

Mais do que um gesto de ruptura ou de reafirmação doutrinal, a eleição de Leão 14 sugere continuidade institucional e reconfiguração simbólica. A Igreja parece ter optado por seguir aprofundando um projeto de governo atento às margens, aos deslocamentos e às mediações. Não se trata de mudar o rumo, mas de sustentar a direção com outros meios e novas vozes.

Bibi Bailas- Descoberta de bichinho que não respira muda nosso conceito sobre vida, FSP

 Num mundo onde respirar é uma das primeiras coisas que todo ser vivo aprende a fazer, a descoberta de um animal que vive sem oxigênio parece coisa de ficção científica. Mas é real.


Um grupo de cientistas encontrou um minúsculo parasita que habita os músculos de peixes como o salmão e que simplesmente não precisa respirar. Seu nome é Henneguya salminicola, e ele acaba de virar uma peça-chave para entender até onde a vida pode ir quando o assunto é adaptação.

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Henneguya salminicola vista em microscópio - Stephen Atkinson/Reprodução

Com menos de dez células, ele é parente distante das águas-vivas e dos corais. Durante milhões de anos, foi se modificando até abandonar por completo algo que parecia essencial: o uso de oxigênio para gerar energia.

Em vez disso, ele passou a viver de forma ainda mais simples, absorvendo diretamente os nutrientes do peixe hospedeiro. Mais curioso ainda, ele não possui mitocôndrias funcionais —aquelas estruturas conhecidas como "usinas de energia" das células.

Sem o genoma mitocondrial, que organiza a respiração celular, esse parasita joga por outras regras, numa espécie de atalho evolutivo que surpreendeu até os pesquisadores mais experientes.

Essa descoberta reescreve o que se pensava sobre os limites da vida animal. Por muito tempo, acreditou-se que todos os animais multicelulares precisavam de oxigênio para viver.

Afinal, era assim com tudo o que se conhecia. Mas o Henneguya salminicola mostra que a vida pode surgir e se manter mesmo em ambientes extremos, como o interior de tecidos corporais, onde o oxigênio é quase inexistente. Isso significa que as definições de vida precisam ser revistas. O que antes era considerado impossível, agora é apenas diferente.

E essa diferença tem implicações que vão muito além dos peixes. Ela se conecta com uma das maiores perguntas da humanidade: existe vida fora da Terra?

Durante décadas, as buscas por vida extraterrestre se concentraram em planetas que tivessem água, luz e oxigênio. Mas talvez, ao restringir essas condições, algo importante estivesse sendo deixado de lado.

Se aqui, em nosso próprio planeta, há um animal que vive sem oxigênio, por que em outro mundo, com condições ainda mais extremas, não poderia haver vida também? Talvez não como a conhecida, mas em formas ainda mais estranhas e improváveis.

Cena do filme "E.T.: O Extraterrestre", de Steven Spielberg
Cena do filme "E.T.: O Extraterrestre", de Steven Spielberg - Divulgação

A ciência tem mostrado que a vida sempre encontra um jeito. Em fontes hidrotermais do fundo do mar, em lagos ácidos, em desertos gelados —e agora, dentro de peixes, sem nem sequer respirar.

Henneguya salminicola é pequeno, mas suas implicações são imensas. Ele representa uma quebra de paradigma e amplia os horizontes de onde e como a vida pode existir. No fundo, ele não é apenas um parasita desconhecido. É uma pista, talvez das muitas que ainda estão por aí, de que o universo pode estar mais vivo do que parece.

Quem é o novo Papa? Conheça Robert Francis Prevost, o Leão XIV, sucessor de Francisco, g1

 A tão esperada fumaça branca que anuncia a eleição do novo papa foi expelida nesta quinta-feira (8) da chaminé da capela Sistina, no segundo dia de conclave. O cardeal Robert Francis Prevost foi eleito pelos colegas e será conhecido a partir de agora como Leão XIV.

Ele foi escolhido por pelo menos 89 dos 133 cardeais – dois terços dos eleitores do conclave – e será o sucessor do papa Francisco na Cátedra de São Pedro.

Quem é o novo papa

Nascido em Chicago, nos Estados Unidos, Prevost tem 69 anos e se torna o primeiro papa norte-americano da história da Igreja. É também o primeiro pontífice vindo de um país de maioria protestante.

Apesar da origem norte-americana, Prevost construiu grande parte de sua trajetória religiosa na América Latina, especialmente no Peru. Foi lá que se destacou até alcançar os cargos mais altos da Cúria Romana.

Ao ser eleito, ocupava duas funções importantes no Vaticano: prefeito do Dicastério para os Bispos — órgão responsável pela nomeação de bispos — e presidente da Comissão Pontifícia para a América Latina.

De perfil discreto e voz tranquila, Prevost costuma evitar os holofotes e entrevistas. No entanto, é visto como um reformista, alinhado à linha de abertura implementada por Francisco. Tem formação sólida em teologia e é considerado um profundo conhecedor da lei canônica, que rege a Igreja Católica.

Entrou para a vida religiosa aos 22 anos. Formou-se em teologia na União Teológica Católica de Chicago e, aos 27, foi enviado a Roma para estudar direito canônico na Universidade de São Tomás de Aquino.

Foi ordenado padre em 1982 e, dois anos depois, iniciou sua atuação missionária no Peru — primeiro em Piura, depois em Trujillo, onde permaneceu por dez anos, inclusive durante o governo autoritário de Alberto Fujimori. Prevost chegou a cobrar desculpas públicas pelas injustiças cometidas no período.

Em 2014, foi nomeado administrador da Diocese de Chiclayo, cargo em que foi ordenado bispo e permaneceu por nove anos. Nesse período, enfrentou a principal crise de sua trajetória: em 2023, três mulheres acusaram Prevost de acobertar casos de abuso sexual cometidos por dois padres no Peru, quando elas ainda eram crianças.

Segundo as denúncias, uma das vítimas telefonou para Prevost em 2020. Dois anos depois, ele recebeu formalmente os relatos e encaminhou o caso ao Vaticano. Um dos padres foi afastado preventivamente e o outro já não exercia mais funções por questões de saúde. A diocese peruana nega qualquer acobertamento e afirma que Prevost seguiu os trâmites exigidos pela legislação da Igreja. O Vaticano ainda não concluiu a investigação.

Durante sua passagem pelo Peru, Prevost também ocupou cargos de destaque na Conferência Episcopal local e foi nomeado para a Congregação do Clero e, depois, para a Congregação para os Bispos. Em 2023, recebeu o título de cardeal — função que ocupou por menos de dois anos antes de se tornar papa, algo raro na Igreja moderna.

Durante a internação de Francisco, Prevost foi o responsável por liderar uma oração pública no Vaticano pela saúde do então pontífice.

Como foi o conclave

O conclave para a eleição do novo papa começou na quarta-feira (7), com a presença de 133 cardeais – sete deles são brasileiros. Na primeira rodada da votação, na quarta à tarde, deu fumaça preta.

O mesmo ocorreu após a segunda e a terceira rodadas, na manhã desta quinta. Para a tarde, havia a previsão de uma quarta rodada de votação perto de 12h30 (no horário de Brasília) e, se necessário, uma quinta e última, por volta das 14h.