terça-feira, 6 de maio de 2025

Ateus e agnósticos, sinto dizer, mas a religião está de volta, Juliano Spyer- FSP

 Durante muito tempo ouvimos que o avanço da educação levaria à secularização da sociedade. Mas esse tema é mais difícil de ser superado do que os humanistas anteciparam. Religião e espiritualidade estão de novo na moda no Brasil e nos EUA.

Se as pessoas que declaram não ter religião no Brasil constituíssem uma igreja, ela seria a segunda maior do país. Mas apenas uma fração delas se considera ateia ou agnóstica. Ser "sem religião" indica que a pessoa não frequenta uma comunidade de fé regularmente, mas a maioria acredita no sobrenatural e na continuidade da vida após a morte física.

Sociólogos e antropólogos argumentaram nas últimas décadas que o crescimento evangélico está associado à pobreza. Templos se multiplicam nas periferias porque funcionam como redes de assistência social. Como explicar, então, a expansão de igrejas de alto padrão chamadas de "churches"?

Participante da Marcha para Jesus de 2024, em São Paulo - Bruno Santos - 30.mai.24/Folhapress

O sociólogo Diogo Corrêa argumentou aqui nesta Folha que a expansão evangélica nas camadas médias e altas pode estar relacionada à polarização e à guinada conservadora da sociedade. Artigos recentes no Washington Post e no New York Times apresentam explicações complementares.

Os EUA andaram muitos anos na contramão dos países ricos em termos de religião. Lá o cristianismo permanecia parte da vida mesmo de famílias abastadas. Mas, a partir dos anos 1990, essa tendência mudou de rumo e mais jovens cresceram sem a obrigação de frequentar igrejas. Agora eles buscam essa vivência por conta própria.

Na ausência de experiências formais, esses jovens procuram alternativas para cultivar sua espiritualidade. Uma reportagem de 2023 do Washington Post registrou que esse segmento está mais interessado por astrologia, tarô, yoga ou pelo consumo de substâncias psicoativas como cogumelos e ayahuasca.

A repórter do New York Times Lauren Jackson passou um ano examinando por que a religião está novamente em alta no país. E a conclusão é que não apareceu nada que substitua essa prática satisfatoriamente.

A reportagem traz um cenário complexo, associado, entre outras coisas, aos efeitos psicológicos provocados pela pandemia do Covid-19. Somos informados sobre a conversão de hispters e de profissionais do setor tecnológico. Originalmente conquistados pelo neoateísmo de autores como Richard Dawkins, eles vêm redescobrindo práticas religiosas.

Mas por trás dessa guinada está a percepção de que a espiritualidade melhora a qualidade de vida. Ouvindo muitos especialistas, a repórter explica que a fé institucional oferece um pacote de "serviços" que inclui maneiras para lidar com crença, pertencimento e regras para a vida.

A crença ajuda a responder perguntas existenciais como "o que faço aqui?" ou "por que estou atravessando esta dificuldade?". O pertencimento se materializa em redes de solidariedade que, além de afeto, ajudam a resolver problemas. As regras, por sua vez, servem como guia para orientar decisões em um mundo acelerado.

Agora, ateus e agnósticos terão que oferecer mais do que apenas argumentos para conquistar novas audiências.

Joana Cunha - Delivery traz a sua comida, mas também distorções, FSP

 Joana Cunha

Repórter especial

São Paulo

A conveniência de escolher a refeição na tela do celular e recebê-la em casa ou no escritório camufla a teia de conflitos e a desordem que estão por trás do mercado de delivery.

Quem usa diariamente esse serviço, incorporado à rotina como se fosse mágica, mal percebe as distorções. O consumidor acaba de comer, joga fora a embalagem e vida que segue, como diz o bordão.

Geralmente, não faz sequer o descarte correto para reciclar o excesso de lixo produzido nessa forma de consumo.

Um entregador de comida está montado em uma motocicleta vermelha, usando um capacete e uma jaqueta vermelha com detalhes em amarelo. Ele carrega uma caixa de entrega vermelha nas costas, com o logo da empresa iFood e a frase "PENSOU COMIDA" visível. O ambiente parece ser urbano, com outros veículos e iluminação de rua ao fundo, e o clima parece estar chuvoso.
Ponto de atendimento do iFood no bairro de Moema, zona sul de São Paulo - Jardiel Carvalho/Folhapress

São poucos os que, minimamente, se interessam pelo noticiário sobre os distúrbios do setor. Para citar um deles, a regulação trabalhista segue incapaz de chegar a uma solução para amenizar a condição precária a que está submetido o entregador. Os menos indiferentes dão uma gorjeta, mas nem sempre.

Essa não é só uma atividade que enche as ruas de motoqueiros e ciclistas a atrapalhar o trânsito. Ela gera reflexos até na segurança pública —quando os assaltantes se disfarçam de entregadores—, sem falar nas disputas tributárias e concorrenciais ligadas à dominância do iFood.

Mas há mudanças em curso. Nas últimas semanas, o anúncio da chegada da 99Food, prometendo cortar tarifas cobradas dos restaurantes, e os rumores de que a gigante chinesa Meituan esteja interessada em desembarcar no Brasil para concorrer com o iFood parecem ter estimulado uma guerra de preços que pode favorecer os estabelecimentos. O Rappi também se compromete a zerar taxas.

Na área da segurança, a Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou lei que obriga as empresas a instalarem QR Codes de identificação na mochila dos entregadores, tentando dificultar a ação dos ladrões travestidos de trabalhador. Enquanto isso, o iFood, pressionado pela greve de motoqueiros, anunciou reajuste, embora abaixo do reivindicado.

O delivery vive um ponto de virada. Vale a pena conhecer melhor o processo pelo qual passa o alimento que chega às suas mãos.

segunda-feira, 5 de maio de 2025

Pai de Neymar é o novo dono do futebol brasileiro, Álvaro Costa e Silva, FSP

 Maiores desprestígio e bagunça, impossível. Desde a saída de Tite, em 2022, a CBF não consegue arrumar um técnico para a seleção, que sofre para se classificar à Copa do Mundo. Houve dois interinos, Ramon Menezes e Fernando Diniz, e um oficial com dotes de oficioso, Dorival Júnior, demitido em março.

O sonho, que mais parece uma obsessão doentia, é trazer o italiano Carlo Ancelotti, que por diversas vezes deu sinais de não querer vestir a camisa canarinho nem pintada de vermelho. Favorito da galera, Jorge Jesus foi vetado pelo pai de Neymar, novo chefe do futebol brasileiro.

O presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues - Divulgação - 24.mar.25/CBF

Aos cartolas restaram as jogadas marqueteiras e as transações escusas. Foi o caso da camisa vermelha. Apresentada como segundo uniforme em substituição ao azul, ela viralizou causando xingamentos a torto e a direito. A CBF e a Nike pegaram carona na polarização política para —como se diz mesmo em internetês castiço?— lacrar.

Com a desculpa de defender a soberania nacional, parlamentares entraram na onda. O senador Izalci Lucas quer que Ednaldo Rodrigues, presidente da CBF, seja ouvido pela Comissão de Esportes para explicar o uniforme vermelho. Seis propostas foram apresentadas para proibir a camisa que foi sem nunca ter sido.

O deputado Sargento Gonçalves pisou mais fundo. Digamos que lacrou certo. Fez um requerimento para que Ednaldo explique o acordo judicial —homologado pelo ministro Gilmar Mendes, do STF— que o manterá no comando da CBF até 2030. A suspeita é que os salários de dirigentes estaduais foram turbinados. O ex-vice-presidente da entidade Coronel Nunes recebeu "mesadas" (mais de R$ 1 milhão em 2024) quando não ocupava mais a função.

Nos últimos anos a CBF esteve na mira de CPIs que investigaram manipulação de resultados, irregularidades em clubes e federações e até a escalação de Ronaldo Fenômeno na final da Copa de 1998 por suspeita de ingerência da Nike. Todas acabaram em pizzas tamanho Maracanã —o estádio antigo, símbolo da época em que as bets não eram a paixão nacional.