segunda-feira, 5 de maio de 2025

Se a camisa for vermelha, vou assistir aos jogos na TV em preto e branco, Becky S. Korich, FSP

 Depois do alvoroço com o anúncio do novo uniforme vermelho da seleção para a Copa de 2026, a CBF finalmente quebrou o silêncio. Em nota, disse que a informação divulgada pelo site Footy Headlines não era oficial, assim como as camisas vermelhas que circularam nas redes sociais. A entidade máxima do futebol brasileiro garantiu que manterá os padrões das cores amarela e azul e informou que a nova coleção de uniformes para o Mundial de 2026 "ainda está em fase de definição" —e será criada em conjunto com a Nike. Ao que tudo indica, a CBF amarelou, literalmente. A informação de que a camisa vermelha era fake ... é fake. Bem-vindo ao metaverso da CBF, onde a seleção é uma marca, o torcedor é o cliente e a alma que vale é a do negócio, não a do brasileiro.

O pronunciamento foi "fofo", com cara inocente e, convenhamos, um tanto vago. A CBF esperou a repercussão (negativa) para declarar que a notícia era especulação. Tipo: "Just do it. Se der ruim, a gente dá um jeitinho". Bem ao estilo Gerson. Foi mais um golpe no espírito coletivo de uma nação já bastante desidratada de símbolos e esperanças.

Um grupo de jogadores de futebol está comemorando um gol em um estádio. Eles estão vestidos com uniformes pretos e amarelos. Alguns jogadores estão sorrindo e se abraçando, enquanto outros estão em poses de celebração. O campo de futebol é visível ao fundo, assim como as arquibancadas com torcedores.
Jogadores da seleção brasileira usam uniforme preto em amistoso contra Guiné - Pau Barrena - 17.6.23/AFP

Não demorou para se revelar o óbvio: sim, a camisa já estava definida. A um ano da Copa do Mundo, não tinha como ser diferente. Uniformes não brotam na véspera, existe todo um processo logístico, da escolha do tecido ao bordado, o que leva tempo. O problema é que a imagem da camisa vazou antes do release e a opinião pública estragou a "surpresa".

A polêmica engajou. Choveram opiniões e muitas certezas. Há quem diga que foi gesto político. Outros juram que foi jogada de marketing do consórcio Nike-CBF. Ou, ainda, uma cortina de fumaça para abafar o escândalo do INSS. Talvez seja tudo isso ao mesmo tempo. Nada na CBF é transparente, exceto o empenho em lucrar.

Por outro lado, há quem banalizou: é só uma camisa, gente! Não, uma camisa da seleção nunca é só uma camisa. É símbolo, é memória, é cicatriz. Dentro das nossas cores tem história, tem Pelé, Garrincha, a lindeza do Raí, pênaltis perdidos, o "vai que é sua, Taffarel", o 7 a 1, a bicicleta do Richarlison, as rasteiras no Neymar, vozes roucas de tanto gritar, ruas vazias, cidades suspensas, a av. Paulista em festa. O vermelho da ex-nova-camisa é apenas um reflexo. Reflexo do rubor na cara de quem ainda acredita que a CBF representa o futebol brasileiro e está do lado do torcedor, e não uma confraria de executivos tentando transformar o futebol em produto e a paixão popular em ativo de mercado.

As cores verde, amarelo, azul e branco não só compõem a nossa bandeira, são o RG da identidade coletiva. Já o CNPJ... é a CBF, que opera em regime de lucro presumido, com seu modelo de negócio burocrático e opaco. A tentativa de tingir a camisa da seleção de vermelho é mais um sinal claro de que a entidade perdeu qualquer conexão com o torcedor.

Para mudar a cor da camisa, só se mudarem antes o suor que ela carrega. As nossas cores são cláusulas pétreas tatuadas na alma do Brasil. Resistiram a mudanças de Constituições, reformas de leis, troca de cartolas, e continuam vibrantes. A ordem é essa: a camisa tem que acompanhar o Brasil, não o inverso.

Se tudo der errado e o uniforme for mesmo vermelho, assistirei aos jogos em uma televisão preto e branco, e a camisa terá a cor que eu quiser.


Definição de superinteligência: a IA como observadora da realidade, Ronaldo Lemos- FSP

 Um jeito de pensar nos atuais modelos de inteligência artificial é que eles representam uma forma radical de compressão da informação. Boa parte desses modelos é treinada com os dados da internet.

O tamanho desse conteúdo chega a 200 zetabytes. Se ele fosse armazenado em discos rígidos, seria necessário algo como 10 bilhões de HDs.

Esse conteúdo é processado por redes neurais, cujo treinamento consome quantidade gigantesca de energia (algo como 15 mil megawatt-hora, suficientes para abastecer 75 mil residências por um mês). O resultado é acachapante.

A imagem mostra um ambiente amplo e vazio, com piso claro e teto elevado. Há várias unidades de armazenamento ou armários em um dos lados da sala, dispostos em linha. O teto é composto por uma grade metálica, e há iluminação fluorescente visível. O espaço parece ser uma sala de servidores ou um data center, com ventilação no chão.
Data center em Botswana; inteligência artificial consome muita energia e superinteligência deve consumir muito mais - Li Yahui - 11.set.23/Xinhua

Toda a informação transmuta-se em conhecimento, que, diferentemente da informação bruta, é contextualizado, interpretado e útil. O arquivo resultante passa a ter o tamanho em torno de 20 terabytes. Pode ser armazenado em um único HD. Há inclusive modelos de IA que cabem em um celular.

Desse arquivo é possível extrair em tese 200 zetabytes de informação. E talvez mais. Isso porque a inteligência artificial recombina a informação do treinamento, criando formas novas e diferentes do conteúdo original.

Essa informação comprimida em conhecimento é hoje acessada por meio de perguntas. Nós, seres humanos, provocamos o modelo de inteligência artificial com uma questão, que é então "respondida". Dentro do modelo, o conhecimento existe apenas como potencial. É a pergunta que faz esse potencial colapsar em uma resposta concreta.

Dá para fazer uma comparação ilustrativa com a física quântica. Na mecânica quântica as partículas existem em condições probabilísticas, com múltiplas possibilidades (às vezes infinitas) coexistindo simultaneamente. Suas posições e estados não são únicos, ao contrário, estão em superposição. Somente através da observação uma partícula "colapsa" para um estado único definido.

Quando o observador interage com o sistema quântico, isso faz o sistema "apresentar" um estado específico entre os possíveis. Instantaneamente todos os outros estados desaparecem.

Com a inteligência artificial é a mesma coisa. Dentro do modelo, todas as respostas possíveis coexistem simultaneamente como potencial. É a pergunta, mediada pela consciência humana, que colapsa a incerteza e produz uma resposta única gerada pela IA.

Usei a palavra consciência de propósito. Hoje ela tem um papel importante tanto para a física quântica quanto para a inteligência artificial.

A consciência influencia diretamente o mundo físico? Tudo existe em estados múltiplos até ser observado? São enigmas que a física contemporânea não é capaz de responder. Para quem se interessa pelo papel da consciência no universo, vale procurar pelo trabalho do físico Roger Penrose e do anestesiologista Stuart Hameroff.

A questão que levanto aqui é se em algum momento a inteligência artificial será capaz de assumir a posição de "observador", isto é, observar fenômenos físicos ou informacionais que existem em estado potencial (como outros modelos de IA) e com isso fazê-los colapsar com sua observação, diretamente. Para mim essa é a definição de superinteligência.

Já era: considerar a IA atual como análoga à consciência humana

Já é: compreender que a IA atual opera mais como o subconsciente, repleto de potenciais

Já vem: a hipótese de a IA assumir o papel de observadora da realidade