Não era uma tempestade qualquer. "Tinha chuva e uns jorros de água que vinham por cima da chuva, como se alguém estivesse jogando uma caixa d'água em cima da gente", lembra a roteirista Ana Reber.
Ela foi passar o Carnaval num condomínio na Barra do Sahy, a mais afetada das regiões devastadas pelo temporal que atingiu o litoral paulista neste fim de semana. Acordou por volta da meia-noite de domingo (19) com a casa que alugou para o feriado toda alagada. O primeiro instinto foi desplugar todas as tomadas, para evitar choques.
Passaram a noite ouvindo gritos de gente procurando por pessoas desaparecidas. Seu condomínio fica atrás de um morro que sofreu deslizamentos severos. "Fomos perceber dimensão da coisa só no dia seguinte, quando começamos a ver os helicópteros rondando e as pessoas desesperadas."
Reber ainda não sabe quando ela, o marido, a filha de 4 anos e uma sobrinha de 14 anos, da Argentina, conseguirão voltar do Sahy. Conta que algumas pessoas estão saindo por barco até Juquehy, praia vizinha da mesma cidade, São Sebastião, e de lá pegando um táxi até São Paulo.
Há ainda as que vão embora de helicóptero, o que lhe parece obsceno no meio do que descreve como "cenário de guerra" com "muito morto" e "gente perambulando com bebê". "Dá ódio. Helicóptero que poderia ser usado para resgatar ou trazer remédio, colchão. O mínimo era abastecer o helicóptero com doação na vinda."
Depois que a casa onde estava hospedada alagou, ela pediu ajuda a única residência do condomínio que não havia sido invadida por chuva. Continuava lá na tarde desta segunda (20). A região, até aquele momento, permanecia inacessível por terra.
A eletricidade voltou, o abastecimento de água idem, mas não sabe por quanto tempo. Chegaram a jogar cloro na piscina, caso precisassem usar aquela fonte. O condomínio abriga umas cinco ou seis famílias desalojadas de suas casas pelo temporal.
O jeito foi organizar um mutirão de comida para todos. As filas do mercado, segundo a roteirista, demoravam cerca de duas horas.
Com permissão de proprietários que não estavam no local, os imóveis desocupados do condomínio receberam famílias que não tinham para onde ir.
"A [casa] em que estamos também vai ser disponibilizada assim que a gente sair. As pessoas vêm de todos os lados do Sahy. Uma senhora entrou numa sala onde só tinham bebês mortos. Ela está em choque."
O Instituto Verdescola, uma ONG local, está recebendo doações para ajudar os desabrigados pela tragédia. A demanda maior é por água. De comida, sugere itens como molho de tomate, café, macarrão, legumes e frutas, óleo, leite, achocolatado, pão e feijão. Também menciona itens de higiene, como papel higiênico, sabonete e escova e pasta de dente.
Em redes sociais, a ONG também pede "a gentileza para não saquearem as residências da Vila Sahy" neste "momento difícil para as famílias".