sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Reinaldo Azevedo O país não precisa dos milicos de pijama da Anvisa, FSP

 

O Instituto Butantan começou a produzir a Coronavac no Brasil, em parceria com a Sinovac. Onze estados negociam a compra da vacina. É assim que se faz. Devemos dar uma solene banana para a Anvisa, hoje abrigo de milicos de pijama, agarrados a uma boquinha. Ignorância gera subserviência.

Precisamos de uma Agência Nacional de Vigilância Sanitária que bata continência à saúde dos brasileiros, não a um general da ativa, subordinado a um capitão da reserva, chutado do Exército por alimentar delírios terroristas. É subversão demais para parágrafo tão curto.

A agência publicou um documento autorizando o uso emergencial, mas nem tanto, das vacinas. O texto teria ficado mais claro, a alguns ao menos, se escrito em grego antigo. Querem saber? Não sofram —não por isso! Ignorem o que diz a Anvisa. Prestem atenção a quem está ocupado em combater a pandemia.

Com a doença em expansão e um caso confirmado de reinfecção no país, Jair Bolsonaro decreta que “estamos vivendo um finalzinho de pandemia”. Até seus diminutivos são ofensivos e negacionistas. Nem o governo federal nem a Anvisa decidirão o destino dos brasileiros nesse particular.

A palavra final sobre a imunização, se necessário, será do Supremo, não de bananas de pijama ou de uniforme. Leiam os artigos 6º e 196 a 198 da Constituição. O inciso VIII do artigo 3º da lei 13.979 dispensa o registro da vacina na Anvisa para que se possa proceder à imunização mesmo em larga escala. Basta a certificação de uma de suas respectivas congêneres nos EUA, União Europeia, Japão ou China —país que é sede da Sinovac.

A propósito: o Supremo tem de dar celeridade às ações que lá estão e que dizem respeito à obrigatoriedade ou não da vacinação e aos deveres do governo federal. Nesta quinta (10), no Rio Grande do Sul, Bolsonaro voltou a assegurar a eficácia da cloroquina no que chamou de tratamento precoce da doença.

É preciso, senhores ministros, pôr alguma ordem no hospício, ainda que o presidente do tribunal, Luiz Fux, esteja ocupado em exaltar as glórias de Sergio Moro, o defunto moral da Lava Jato, e em encaixar a palavra “orgia” num discurso fescenino sobre o Estado de Direito. Se os pilotos sumiram, assumam a aeronave os que devem.

Foi, aliás, o que fez João Doria ao anunciar para janeiro o início da vacinação e ao estabelecer um calendário. “Ah, ele está tentando pavimentar a sua candidatura para a Presidência, e a vacina virou um caça-votos”, reagiram alguns. Não descarto e pergunto o que há de errado nisso. Prefiro um político que tente ganhar eleitores com uma droga que salva vidas a outro que faz da morte o seu palanque.

Como brinquei no programa de rádio “O É da Coisa”, não pertenço à mesma enfermaria ideológica do tucano. Nem mesmo votei nele em 2018. Iria fazê-lo no segundo turno. Quando pegou carona na campanha de ódio do bolsonarismo, aparecendo em péssimas companhias, desisti. Também não escolhi o seu adversário. O voto obrigatório oferece alternativas.

No caso da vacina? Aí, não! Há uma compulsão, em certos nichos da própria imprensa, de simular independência decretando um solene “ninguém presta” e narrando um permanente empate moral entre os litigantes. Às vezes, é assim mesmo. Mas há casos em que a postura traduz irresponsabilidade.

Na batalha da vacina, trata-se de fazer uma escolha entre a psicopatia política, festivamente homicida —já “que todo mundo morre um dia, e eu não sou coveiro”—, e o esforço de quem mobilizou recursos para investir na ciência. A história deu a Doria e a Bolsonaro uma pandemia. Um deles produziu negacionismo, obscurantismo, truculência, cloroquina e uma quantidade assombrosa de frases pusilânimes. O outro apostou numa vacina. Poderia ter dado errado, mas tudo indica que deu certo.

Se render votos, terá valido a aposta na civilização, não na barbárie, para voltar a uma antítese antiga, que hoje povoa os cemitérios. Reconheça-se: sem o ativismo de Doria nessa área, continuaríamos, 2021 afora, a contar os mortos em companhia do general patético e trapalhão e seus milicos de pijama.

Reinaldo Azevedo

Jornalista, autor de “O País dos Petralhas”.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

Fernando Schüler É um erro engessar ainda mais os recursos do Fundeb, \\fsp

 9.dez.2020 às 23h15

Na votação da PEC do Fundeb, em agosto, o Congresso atendeu à pressão corporativa e inscreveu na Constituição a obrigatoriedade de que no mínimo 70% dos recursos do fundo sejam para gasto com pessoal. Na contramão de tudo que se discute hoje em termos de autonomia federativa e redução da rigidez orçamentária.

Agora o Congresso vota a regulamentação da PEC. Entre outras coisas, a votação dirá o que fazer com os 30% restantes dos recursos do fundo.

O tema muitas vezes surge como sendo uma discussão sobre modelos de gestão educacional. Existem os modelos de gestão estatal direta, os modelos de escolas contratualizadas, de natureza filantrópica, e há modelo de concessão de bolsas, cujo maior exemplo no Brasil é o Prouni.

No ensino público básico o país adotou, historicamente, o primeiro modelo. A gestão estatal direta, feita pela máquina pública de estados e municípios. Construir escolas, abrir concurso, regime jurídico único, lei 8.666, sindicatos fortes e mandonismo político. Os resultados todos conhecemos.

O país fez mais do que isso: impôs um quase monopólio estatal na educação pública. E o fez em contradição direta com o texto constitucional, que diz, em seu artigo 213, com perfeita clareza, que "os recursos públicos da educação serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas".

É tão claro quanto ao tema que o país discutiu dias atrás sobre a possibilidade de reeleição nas casas do Congresso. A Constituição criou um sistema misto de provisão da educação pública. O objetivo era precisamente dar aos gestores estaduais e municipais a autonomia para avaliar modelos e fazer o melhor pelos estudantes.

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A pressão corporativa e inércia do mundo político sempre impediram que esse debate fosse feito. O monopólio estatal foi simplesmente dado como norma e única alternativa disponível. O resultado foi um crescente abismo social: a classe média foi rapidamente migrando para o ensino privado e os mais pobres presos à escola estatal.

Criou-se no país algo muito mais grave do que desigualdade nos resultados que surgem no Ideb ou a cada três anos no Pisa. Criamos dois mundos sociais que vivem à parte e reproduzem nossa desigualdade estrutural: o mundo dos que podem escolher, nas redes privadas, majoritariamente branco e de maior renda, e o mundo dos sem escolha, majoritariamente negro e de menor renda, presos ao Estado.

Este é o País que o monopólio estatal da educação pública ajudou a "cristalizar". Agora estamos diante de uma nova decisão. E sob o risco de consagrar em lei, à revelia do que diz a Constituição, a obrigatoriedade de que todos os recursos do Fundeb, e logo os alunos que dependem desses recursos para estudar, fiquem presos às redes estatais de ensino.

Como tem observado o deputado Tiago Mitraub, não se trata de uma discussão sobre este ou aquele modelo de gestão da educação. O ponto é perguntar se será possível a discussão de qualquer modelo que não seja o monopólio estatal.

A questão central é se vamos basear escolhas educacionais em "evidências" ou isto termina por ser pura retórica. No mundo real da política, impõe-se desde Brasília que os 27 estados e 5.570 municípios brasileiros só poderão adotar, muito longe de qualquer dado ou evidência, um único modelo. O mesmo praticado desde sempre e com os resultados que sabemos.

Essa decisão será um erro. Mais um dos tantos que já se cometeram em nossa educação pública. Reverter isso supõe alguma vontade política de pensar de maneira diferente.

Coisa rara neste país do "assim é porque sempre foi", a máxima de nosso tradicionalismo político tão bem definida pelo mestre Raymundo Faoro.

Fernando Schüler

Professor do Insper e curador do projeto Fronteiras do Pensamento. Foi diretor da Fundação Iberê Camargo.

Mariliz Pereira Jorge- Bolsonaro, um genocida, FSP

 Quanto mais demorarmos a vacinar a população contra a Covid-19, mais gente morrerá. Se antes a responsabilidade de Jair Bolsonaro era subjetiva, no momento em que vários países começam a imunizar seus cidadãos, não resta dúvida: a incompetência, o desdém e a demora do governo, na figura do presidente, serão culpados por cada morte que poderia ser evitada com uma vacina.

Para alguém que tinha tanta pressa de que o país voltasse "à normalidade", um dirigente que se preocupava tanto com a economia, é curioso que Bolsonaro não tenha sido um dos primeiros líderes a garantir a compra de vacina. Senão por causa da vida das pessoas, que fosse pela saúde da economia.

Bem, seria curioso, se fosse alguém razoável e não um idiota, que resolve inaugurar um brechó no Palácio do Planalto quando o mundo vive um acontecimento histórico. Enquanto Jair e a dona "por que Queiroz depositou R$ 89 mil na conta de Michelle?" usavam a estrutura palaciana para seu momento "memorável", eu chorava ao ver gente sendo vacinada no Reino Unido.

Exposição de trajes de Bolsonaro e Michelle virou memes nas redes sociais.
Exposição de trajes de Bolsonaro e Michelle virou memes nas redes sociais - Foto: @DeputadoFederal
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Bolsonaro completa dois anos na Presidência e continua sem a menor ideia do que faz lá. E quem se ferra de verde e amarelo somos nós. Sua campanha não teve proposta, além de baboseiras, como acabar com a ideologia de gênero, com o comunismo, com o PT, liberar armas, "rasgar e jogar na latrina" o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Ele não sabia o que fazer quando a pandemia chegou a não ser negar sua existência e gravidade, assim como não consegue organizar a claque de incompetentes do seu governo. Nesta quarta (9), o Ministério da Saúde anunciou que o plano de vacinação deve ser apresentado na semana que vem. Alguém me explica, como se eu fosse uma criança de cinco anos: não era para estar pronto? Se alguém tinha alguma dúvida de que Bolsonaro é um maldito genocida, não precisa mais ter.

Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.