Em julho do ano passado, quase 36 milhões de pessoas pagaram bilhetes nos trens da CPTM, empresa que atende a região metropolitana de São Paulo. No mês de julho deste ano de calamidade, os pagantes eram apenas 20,5 milhões, queda de 43%.
No Metrô estatal paulista, a baixa do número de passageiros nos dias úteis era de 60%. Ainda não saíram os dados de agosto, mas dá para ter uma ideia do tamanho da desgraça, que já foi pior, mas continua desgraça.
Muitas pessoas assustadas com o vírus ou com o futuro deixam de gastar na lojinha de rua, no quilo, na lanchonete, no café com bolo da calçada, no pastel, no dogão, no ambulante. Não vai à manicure, ao barbeiro. A economia se recupera, na verdade apenas despiora, dizem os grandes números.
Mas a vida miúda dos pequenos negócios que são o sustento de tanta gente ainda é duríssima. Vai depender do que será dos auxílios e do espalhamento do vírus, como explica qualquer estudioso capaz, economista ou epidemiologista, psicólogo ou sociólogo.
Pelos grandes números, o segundo trimestre teria sido o pior. O PIB caiu 9,7% em relação ao primeiro trimestre do ano. No terceiro, estima-se que haveria crescimento de 6%. Há sinais disso. O consumo de energia elétrica de julho e agosto foi praticamente o mesmo desses meses no ano passado.
A produção das fábricas até cresceu mais do que o esperado em julho (mas a indústria de transformação ainda está mais de 10% abaixo do baixo nível de 2019).
Essa escalada a partir do fundão do poço obviamente é e será desigual. Os dados de faturamento no cartão, da Cielo, mostram que o varejo no fim de agosto ainda vendia 11% menos que em fevereiro. Mas o setor de bens não duráveis vendia cerca de 2,5% mais, e o de duráveis, 4,4% menos. O de serviços, brutais 43% menos.
As vendas de combustíveis em julho ainda eram mais de 8% menores que no ano passado, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo. No final de agosto, os postos de gasolina vendiam 24% menos que em fevereiro, diz a Cielo.
A circulação reduzida massacra a vida real das cidades.
O problema dos serviços e do comércio não para aí, em restaurantes e similares, o tipo de empreendimento mais comum do Brasil, e nas lojas.
Ainda não há perspectiva de retomada ou recuperação notável para entretenimento ao vivo, serviços pessoais como salões de beleza, serviços de saúde e terapias diversas (com cirurgias e tratamentos adiados em hospitais, clínicas, consultórios de dentistas), de educação (tantos cursos cancelados), viagens, hotéis.
Muita empresa está com as finanças arrebentadas, da grande firma de transporte ao restaurante. A redução do auxílio emergencial vai arrebentar os negócios menorzinhos.
Diz-se que a poupança aumentou (isto é, gastou-se menos do que a renda disponível). É verdade, na soma de todos os dinheiros do país, “no agregado”. Esse saldo pode sustentar o nível geral de consumo depois do corte do gasto público. Mas isso vai chegar à manicure ou à vendinha da comunidade?
Os economistas parecem saber um pouco disso, da recuperação desigual e parcial. O pessoal do Bradesco e do Itaú agora prevê igualmente que o PIB afunda 4,5% neste ano e aumenta 3,5% em 2021 —estão entre os otimistas.
Assim, ao final do ano que vem a recuperação do nível de renda e produção seria de apenas 74% do que se perdeu na calamidade de 2020. Ou seja, apenas em 2022 voltaríamos à pobreza de 2019. Um problema é que o povo miúdo não deve nem pegar esse trem de volta para um passado menos ruim.