domingo, 5 de julho de 2020

Hélio Schwartsman A nova face do racismo, FSP

Racismo contemporâneo se materializa principalmente no chamado racismo implícito

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O texto que escrevi sobre a possibilidade de o racismo ter contribuído para a queda do professor Carlos Alberto Decotelli do comando do MEC ensejou vários questionamentos de leitores, de modo que volto ao tema hoje.

O racista clássico, do tipo que xinga negros, diz que são uma raça inferior e veste um lençol na cabeça para caçá-los, é, felizmente, uma espécie em extinção —exceto, talvez, em alguns departamentos de polícia. Aliás, a rapidez com que, no Ocidente, passamos de um contexto em que a discriminação estava sacramentada nas leis de vários países para um em que é vista como falha moral intolerável representa uma grande conquista da civilização, que nem sempre é reconhecida como tal.

Não obstante, o racismo continua aí, como se pode verificar em uma miríade de estatísticas sociais e experimentos psicológicos. Uma explicação para o fenômeno é dada por Mahzarin Banaji (Harvard) e Anthony Greenwald (Universidade de Washington), autores do excelente “Blindspot” (ponto cego), que já comentei aqui.

Para a dupla, o racismo contemporâneo já não se materializa tanto em atos explícitos de discriminação (o que não significa que nunca ocorram), mas principalmente no chamado racismo implícito, que é aquele do qual os próprios autores não se dão conta, mas que pode ser acessado através de testes psicológicos.

Na vida prática, isso se traduz não numa rejeição aberta ao negro, mas em sua exclusão dos gestos de benevolência que as pessoas reservam àqueles aos quais se sentem de alguma forma próximas.

Estamos falando da professora que deixa de dar uma atenção extra ao aluno negro por percebê-lo, ainda que inconscientemente, como um caso perdido, ou do policial que não alivia as coisas para o adolescente negro pego com alguns cigarros de maconha, mas livra a barra do garoto branco flagrado na mesma situação. No agregado, esses detalhes fazem enorme diferença.

Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Elio Gaspari FGV fez uma covardia com o ex-futuro-ministro da Educação, FSP

Fundação soltou nota informando que Decotelli nunca foi professor da instituição, mas apenas 'colaborador'

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O jornalista americano Murray Kempton definiu os editorialistas da imprensa como aquelas pessoas que depois de uma batalha vão ao campo do combate e matam os feridos. Foi isso que a Fundação Getulio Vargas fez com o ex-futuro-ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli. O falso currículo já o havia derrubado quando a venerável FGV soltou uma nota informando que ele nunca foi professor da instituição, 
mas apenas “colaborador”.

O economista Carlos Alberto Decotelli
O economista Carlos Alberto Decotelli - Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Podia ter feito isso em 2019, quando o doutor foi nomeado para a presidência do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e seu currículo dizia que ele havia sido “professor de pós-graduação 
em Finanças” na FGV.

A fundação deveria cuidar melhor de sua marca. Uma coisa é um professor do quadro funcional da FGV. Bem outra é uma pessoa que deu uma aula num curso ou numa de suas atividades paralelas. (Faz tempo, um hierarca justificou seu título de professor visitante da Sorbonne dizendo que, como professor, havia visitado 
a universidade francesa.)

O logotipo da FGV é usado para enfeitar eventos semicorporativos e até mesmo seminários de feriadão com verniz acadêmico e essência turística. Entrando no ramo de consultorias, a fundação viu-se metida nas roubalheiras do governador Sérgio Cabral. Nas suas palavras, a FGV serviu de “biombo para efetivar ilegalidades”. A fundação assinou 58 contratos com a gestão do então governador do Rio, 
no valor de R$ 115 milhões.

A caça ao dinheiro tornou pandêmica a malversação das marcas de instituições renomadas. A London School of Economics mamou US$ 488 mil nos cofres do ditador líbio Muammar Gaddafi, e seu diretor embolsou 
US$ 50 mil assessorando-o.

No caso de Decotelli, a FGV demorou para reclamar e, quando reclamou, exagerou. Ao contrário do que aconteceu com outros títulos do doutor, ele leciona na fundação, foi bem avaliado pelos alunos e deu uma aula online 
há poucos dias.

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