quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Crime organizado perde cerca de R$ 450 mi com apreensão recorde de cocaína em SP, OESP

Foram apreendidas 33,8 toneladas de cocaína de janeiro a outubro nas cidades paulistas. Tráfico no Estado é operado pelo PCC com droga vinda da Bolívia e do Paraguai

Felipe Resk, O Estado de S.Paulo
12 de dezembro de 2019 | 10h00
Atualizado 12 de dezembro de 2019 | 10h06
SÃO PAULO - Após registrar aumento de apreensões de entorpecentes em São Paulo, o governo João Doria (PSDB) calcula ter conseguido aplicar um desfalque de R$ 450 milhões nas contas do crime organizado neste ano. Segundo dados da Secretaria da Segurança Pública (SSP), as polícias do Estado conseguiram apreender a quantidade recorde de 33,8 toneladas de cocaína, a droga mais lucrativa, até o mês de outubro. Também foram retiradas das ruas 102,5 toneladas de maconha e 1,6 tonelada de crack.
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Denarc desativou uma refinaria de drogas em um sítio de Nazaré Paulista, no interior Foto: Polícia Civil
O valor é uma estimativa feita com base na média de preço praticado por traficantes - entre outros aspectos, ele varia com a pureza do produto ilícito. De acordo com investigadores do Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos (Denarc), o quilo da cocaína renderia cerca de R$ 10 mil. Já maconha e crack valem, respectivamente, R$ 1 mil e R$ 6 mil.
Em São Paulo, o tráfico de drogas em larga escala é operado pela facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). Segundo investigações, a maior parte da cocaína que chega ao Estado é produzida na Bolívia, enquanto a maconha vem do Paraguai.
Considerando apenas a cocaína, a carga total apreendida já é 78,8% maior do que em todo o ano de 2018, quando as policiais recolheram 18,9 toneladas da droga, até então o recorde de São Paulo. "O valor é considerável e a gente presume que representa um grande prejuízo ao crime organizado. Quanto maior é o valor, maior o golpe", diz o delegado Adilson da Silva Aquino, divisionário da Divisão de Investigações sobre Entorpecentes (Dise), do Denarc.
Para Aquino, o aumento das apreensões estaria ligado ao investimento da Polícia Civil para investigar e depois realizar grandes operações. Outra parte expressiva da carga viria da atuação da Polícia Militar, em especial nas rodovias, interceptando o transporte da droga, segundo o delegado.
Uma das ações de inteligência, por exemplo, aconteceu em outubro, quando o Denarc desativou uma refinaria de drogas em um sítio de Nazaré Paulista, no interior. Só nessa operação, foram apreendidas 2,2 toneladas de cocaína.
"Em quantidade miúda, é quase impossível chegar a esse volume", afirma.
Nas apreensões, é comum haver prisões em flagrante das chamadas "mulas", as pessoas que são usadas por grandes traficantes e ficam responsáveis por transportar a droga.
"A gente trabalha muito com informação", diz o delegado.
Foi dessa forma que investigadores detiveram, neste ano, uma mulher da República Checa que embarcaria com cocaína para a Europa - caso que chamou atenção dos policiais pela criatividade. Após aplicar uma mistura de resina, a droga foi disfarçada de tabuleiros de xadrez e obras de arte.
"Havia um quadro da 'Santa Ceia' de cocaína", conta Aquino.

Polícia também apreende mais crack, mas quantidade de maconha cai

Entre as principais drogas, a maconha é a única que registrou queda de apreensão em 2019. De janeiro a outubro, a quantidade retirada das ruas representa 31,4% a menos do que no mesmo período de 2018, quando a polícia recolheu 149,6 toneladas. Já o volume de crack subiu 77,7%. No ano passado, foram 900 quilos do entorpecente.
Em uma das operações de destaque, os policiais descobriram um sobrado na Lapa, na zona oeste da capital, com plantações de maconha. No local, funcionaria um laboratório sofisticado, onde trabalhavam até engenheiros agrônomos. Pela estimativa dos investigadores, o negócio ilícito movimentava R$ 30 milhões por mês.
Para Aquino, no entanto, não se pode descartar a hipótese de que alta geral de apreensões também esteja relacionada à presença maior de droga em São Paulo.
"É uma conjunção de tudo. A polícia aperfeiçoou sua forma de atuar com inteligência e pode ter aumentado a produção."

Drogas apreendidas em São Paulo

2019 (janeiro a outubro)
  • Maconha: 102,5 toneladas (R$ 102,5 milhões)
  • Cocaína: 33,8 toneladas (R$ 338 milhões)
  • Crack: 1,6 tonelada (R$ 9,6 milhões)
  • Total: R$ 450,1 milhões
2018 (ano inteiro)
  • Maconha: 164,8 toneladas (R$ 164,8 milhões)
  • Cocaína: 18,9 toneladas (R$ 189 milhões)
  • Crack: 1,2 tonelada (R$ 7,2 milhões)
  • Total: R$ 361 milhões
2017 (ano inteiro)
  • Maconha: 187,4 toneladas (R$ 187,4 milhões)
  • Cocaína: 18,3 toneladas (R$ 183 milhões)
  • Crack: 1,8 tonelada (R$ 10,8 milhões)
  • Total: R$ 381,2 milhões
2016 (ano inteiro)
  • Maconha: 148,1 toneladas (R$ 148,1 milhões)
  • Cocaína: 12,3 toneladas (R$ 123 milhões)
  • Crack: 2 toneladas (R$ 12 milhões)
  • Total: R$ 283,1 milhões

O STF não é o atalho da República, FSP

Nesta semana aconteceu em Brasília um evento que traduz bem a confusão política em que nos encontramos. O STF convocou uma audiência para discutir a hipótese das candidaturas independentes nas eleições brasileiras.
Discutiu-se de tudo por lá. De um lado, a tese da “ditadura” exercida pelos partidos; de outro, os riscos da “carnavalização” da política, caso quebrarmos seu monopólio eleitoral. No mais, uma criativa discussão sobre as chances de um “caminho” para mudar o sentido da Constituição, sem alterar o seu texto.
O debate é pertinente. A revolução tecnológica mudou a cara da democracia, os indivíduos ganharam poder, explodiram os movimentos em rede, e é bastante lógico que  os partidos políticos abram espaço a novos modos de expressão política.
O Brasil pertence a um grupo minoritário de países que vedam integralmente candidaturas avulsas. Emmanuel Macron foi eleito presidente da França sem filiação partidária. Um candidato independente pode concorrer à Presidência dos Estados Unidos. Há muita coisa no mundo diferente do que o Brasil decidiu fazer. Imaginem comparar nossa legislação trabalhista com a regra laboral americana, para ficar apenas em um exemplo rápido.
Tudo muito bacana, apenas com um detalhe: este não é um debate a ser feito pelo Supremo, mas pelo Congresso Nacional. Está lá no artigo 14º da Constituição, com uma clareza constrangedora, que a elegibilidade, no Brasil, exige a filiação partidária.
É imensamente sedutora a ideia de que o Supremo possa funcionar como um sábio e generoso atalho da República. É isso que depreendo da concepção “iluminista” do papel de uma Suprema Corte, nas democracias atuais, na conhecida formulação do ministro Luís Roberto Barroso.
O ministro Barroso, aliás, acerta ao dizer que, quando se lida com questões “na fronteira entre o direito e a política”, as pessoas tendem a aplaudir o ativismo no Supremo quando concordam com as suas decisões. Quando discordam, clamam pela autonomia do Congresso.
É exatamente assim. As pessoas são passionais e é previsível que queiram ver o Supremo funcionando como um atalho para suas ideias. O ponto é que ele não deve agir assim, e quem sabe seja precisamente aí que resida, ou deveria residir, sua virtude.
Isto nos condena ao imobilismo constitucional? De modo algum. O Congresso aprovou mais de cem emendas à Constituição de 1988. Nos últimos seis anos, foram 28 alterações. Até mesmo para amarrar a execução de emendas coletivas no orçamento nosso Legislativo soube mexer na Constituição. Não há omissão legislativa. Há apenas escolhas, e é disso que é feita a democracia.
Nossa Suprema Corte tem um histórico bastante problemático com intervenções heterodoxas no mundo político. A mais conhecida foi a derrubada da cláusula de barreira, em 2006, que nos ajudou a alcançar o honroso posto de país com a maior fragmentação partidária do planeta, entre as grandes democracias.
Boa parte do desgaste do sistema partidário que o Supremo agora discute vem deste quadro de fragmentação, e direta ou indiretamente daquela decisão. Curioso que agora o Supremo resolva corrigir tudo com uma nova intervenção, sugerindo tornar letra morta uma frase inscrita no artigo 14º da Constituição.
Isto é um erro. Um gasto indevido de energia e um sinal trocado para a sociedade. Alimenta-se o processo de judicialização da política, e o incentivo vem do próprio STF ao reiterar que é possível, sob certas circunstâncias, dar um jeito na Constituição.
O nome disso é incerteza institucional, confusão entre os Poderes e descrédito para a própria corte. O melhor que país poderia fazer é aproveitar o atual ímpeto reformista do Congresso e aprovar de vez uma reforma política, que poderia inclusive incluir as candidaturas avulsas.
Mas seguindo a regra do jogo, respeitando-se a ordem constitucional que a duras penas soubemos construir.
Fernando Schüler
Professor do Insper e curador do projeto Fronteiras do Pensamento. Foi diretor da Fundação Iberê Camargo.

Roberto Dias A latência do Brasil no 5G, FSP

País largou atrasado na corrida da nova geração de celular

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Funcionários da Verizon trabalham em torre de celular da empresa em Utah (EUA) para adaptá-la ao sistema 5G - George Frey/AFP
Uma das maiores revoluções tecnológicas da história bateu à porta e encontrou o Brasil escondido embaixo da cama.
O país largou atrasado na corrida do 5G, a nova geração de celular. Em parte por soberba, pois confia que seu tamanho determinará o rumo da região. Vale lembrar: a participação mundial da população e da economia brasileiras é declinante.
Em parte, está atrasado porque não sabe o que fazer. Espremido entre EUA e China, o Brasil foi jogado ao mar por Donald Trump no caso do aço e virou piada na Ásia —o presidente da Huawei, empresa líder no 5G, acha que os brasileiros deveriam se dedicar mais ao samba.
O governo americano argumenta que os países terão de fazer uma escolha estratégica, não tecnológica. Diz que empresas chinesas são instrumentos do Partido Comunista e servirão à espionagem. A lei chinesa as obriga a ceder dados ao governo. 
Mas existem problemas com o 5G também nos EUA. Pesquisadores americanos têm listado brechas técnicas nas principais teles locais, incluindo a capacidade de rastrear o aparelho, enviar mensagens falsas e bloquear chamadas.
Para complicar, quem figura como suspeito de espionagem já tem atuação aberta na área de vigilância. A Huawei é, disparada, a empresa que mais fornece material de monitoramento com inteligência artificial. Está presente em 50 países, mostra o Carnegie Endowment for International Peace. No caso da IBM, são 11. Para esse fim, o Brasil usa tanto tecnologia chinesa quanto americana.
O avanço do 5G se concentra na velocidade (muito maior) e na latência, o tempo de resposta (muito menor). Isso representará um imenso ganho de produtividade para a economia e uma revolução na maneira de viver.
A bola está agora com a Anatel, que tem nova reunião nesta quinta (12) para fazer a coisa avançar. A revolução do 5G vai aumentar rapidamente o fosso entre os países —e a agência deveria diminuir nossa latência em relação a essa tecnologia.
Roberto Dias