domingo, 24 de agosto de 2025

IVAN COLANGELO SALOMÃO - O terceiro mandato do presidente, FSP

 Ivan Colangelo Salomão

Professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (FEA/USP)

Sua ascensão à Presidência da República representara um marco na história do Brasil. Pela primeira vez em décadas, um político de oposição, cuja trajetória seria marcada pela associação com a classe trabalhadora, finalmente assumia o comando do país. As políticas de seus primeiros mandatos estreitariam ainda mais essa relação. Mas, apesar da elevada popularidade que ostentava ao final de seu governo, sofreu perseguição de setores conservadores, dos militares e da imprensa durante o interregno em que se distanciou do poder.

Após anos de afastamento, a vitória contra um ex-militar na eleição que consagrou seu retorno à Presidência determinaria os rumos do país no longo prazo, tamanhas eram as diferenças entre os respectivos projetos de nação. O triunfo eleitoral não foi de Pirro, mas seu regresso ao Palácio não se deu exatamente nos braços do povo.

O céu de brigadeiro dos primeiros mandatos se transformou num prato caro e de difícil degustação. Pelo menos aos olhos de parte de seus eleitores.

Vários são os motivos a explicar mudanças tão profundas na perceptibilidade da sociedade brasileira. É verdade que as expectativas eram, de fato, elevadas. O bem-estar material e a inclusão social das gestões anteriores não só haviam elevado a barra de comparação como também o transformaram no homem público mais importante de sua época.

Mas a nova conjuntura era mesmo delicada. A começar pela relação de desconfiança com as Forças Armadas, com as quais teve que reconstruir pinguelas de sustentação improvável. O cenário internacional também era adverso.

Bandeira do Brasil na posse de Lula - Ricardo Stuckert - 1°.jan.23/Divulgação

A eclosão de uma guerra do outro lado do mundo meses antes da eleição já antevia, e aprofundava, as dificuldades por que passariam as contas externas brasileiras. A eleição de um presidente republicano hostil à América Latina nos EUA, no meio do seu mandato, estreitou ainda mais as possibilidades de exercer suas arquirreconhecidas habilidades diplomáticas.

Mas, se de fato for o bolso o elemento a selar a sorte dos incumbentes, o governo tinha diversos resultados de que se jactar. A fim de atenuar a desconfiança do mercado, o presidente nomeara para a Fazenda um prudente e pragmático advogado paulista, acusado pelos setores mais exaltados de seu partido de representar os interesses dos banqueiros.

E a sua política econômica foi, de fato, moderada. Do ponto de vista fiscal, o ministro promoveu um ajuste realista, baseado, é verdade, na elevação de receita.

A política monetária mostrou-se ainda mais ortodoxa, apesar da expansão do crédito. Se por mérito do governo, o fato é que a economia brasileira apresentava fundamentos positivos na metade de seu terceiro mandato: crescimento significativo do PIB, contas externas relativamente estáveis, câmbio sutilmente desvalorizado e inflação levemente pressionada, mas ainda longe de afetar negativa e decisivamente as expectativas dos agentes.

Ainda assim, a população lhe sonegava o apoio social com que contara nos mandatos anteriores. O aumento dos preços de determinados itens básicos, sobretudo os alimentícios, corroía sua popularidade.

A grande imprensa, em uníssono, malhava o governo diuturnamente —e não apenas por seus erros, mas também pelos acertos. E a oposição barulhenta, que dominava um Parlamento hostil, emoldurava o quadro de dificuldades. Não havia agenda positiva e comunicação direta que lhe trouxessem algum alento. O país ebulia.

Idoso, cansado e anacrônico, o presidente já não exibia a mesma disposição dos tempos de glória.

Acuado, o homem mais poderoso de sua geração não viu alternativa que não desferir um tiro contra o próprio peito.

Era esse o Brasil de 1954; que não seja o de 2026. Os tempos mudam. E a história ensina.

Luiz, não encerre a sua biográfica cinematográfica com uma derrota já anunciada. Mais do que nunca, o Brasil precisa e depende da sua grandeza.

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