segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Intolerância organizada, Lúcia Guimarães, OESP



Líderes carismáticos exploram as redes sociais para oferecer democracia direta






Lúcia Guimarães, O Estado de S.Paulo
29 Janeiro 2018 | 02h00
“Davos, onde os bilionários explicam para os milionários como se sente a classe média.”
(Comentário apócrifo citado por Jamie Dimon, CEO do JP Morgan). 
Na sexta-feira, enquanto a conferência anual do Fórum Econômico Mundial caminhava para o fim em Davos, nos Alpes suíços, o parlamento polonês votou uma lei prevendo prisão de até três anos para quem mencionar a cumplicidade da Polônia no Holocausto.
Sexta-feira era véspera do aniversário da liberação do campo de concentração Auschwitz-Birkenau, no sul da Polônia, hoje comemorado como o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto.
O tema do sarau de Davos este ano era Criar um Futuro Compartilhado num Mundo Fraturado. A Polônia é talvez hoje a capital europeia da fratura e do retrocesso na democracia liberal. E é também o mais eloquente exemplo de que crescimento econômico não imuniza sociedades contra o populismo autoritário. A Polônia pós-comunista era a garota propaganda da reforma econômica liberal. O que aconteceu?
O comentário sarcástico de Jamie Dimon sobre Davos, na semana passada, se referia ao constante estado de temor das elites lá reunidas. Este ano, houve destaque para debates sobre a ameaça crescente da desigualdade no mundo. As redes sociais foram representadas como vilãs, acusadas de cumplicidade com a propagação de conteúdo extremista. Davos é vista como parte do problema que nos trouxe a maior crise da democracia depois da dissolução da União Soviética. Todas as maiores economias do mundo continuam a crescer e a economia global aparenta estar numa curva de crescimento. E foi em Davos que a ONG Oxfam revelou para os temporariamente contritos bilionários: 82% da riqueza gerada em 2017 foi para 1% da população global. Não há Estado Islâmico que supere este número em ameaça à segurança.
Mas o debate sobre a origem econômica da explosão de populismo está longe de ser decidido. Como demonstram as revoltas populistas em países prósperos, motivos também podem ser encontrados fora da economia. O proeminente economista chileno Andrés Velasco lembra que estamos no impasse de dois populismos que têm em comum a eleição do outro inimigo. O de esquerda coloca a culpa nas elites. O de direita, nos imigrantes, nas minorias étnicas e religiosas. O outro grande aliado do populismo é o declínio da legitimidade de elites políticas e Velasco cita o Brasil do Petrolão como o exemplo na América Latina.
Líderes carismáticos exploram as redes sociais para oferecer democracia direta e guiar seu rebanho para longe de instituições que formam a espinha dorsal da democracia. Lula promete “regular”, isto é, reprimir a liberdade de imprensa. Nos EUA, a ala extremista e cada vez mais ativa do Partido Republicano passou os últimos dias acusando o FBI de abrigar um cabal conspirador que fazia reuniões secretas. E a Fox News, a rede de Rupert Murdoch, dedicou farta cobertura à insânia. O populismo de direita hoje é marcado pela rejeição ao moderno, nostalgia pelo passado e anti-intelectualismo. Ironicamente, a expansão do autoritarismo populista de direita ou esquerda não é resultado de erro da receita econômica na era de democratização, seja na Europa pós-comunista ou na América Latina pós-ditaduras.
O cientista político búlgaro Ivan Krastev coloca o dedo num ponto cego do liberalismo hoje, enfrentando a revolta que ele chama de “intolerância organizada.” Ao privilegiar a implantação do capitalismo e negligenciar agência política, o liberalismo reduziu eleições, que antes eram escolhas entre diferentes visões ideológicas, a referendos sobre a elite, uma espécie de “assassinato ritual” de quem está no governo. Krastev se refere à Europa. Mas o quanto este diagnóstico encontra eco no Brasil de 2018?

Não, as coisas não estão bem, Por Felipe Pimentel. OESP



Como lidar com nossos erros e fracassos, com nossas dores e derrotas? O psicanalista Felipe Pimentel analisa o culto da positividade em nosso discurso social e aponta: sem essas experiências, não levamos uma vida plena.






Estado da Arte
29 Janeiro 2018 | 14h56
Por Felipe Pimentel
É trivial que em situações de estresse ou sofrimento busquemos alívio, como é natural sugerirmos ao próximo alguma espécie de consolo. Seja nas perdas, em que os consolos travestem-se de crenças religiosas ou análises sobre a intensidade do que se viveu, seja nas “derrotas”, nas quais indicamos o lado positivo para ser analisado, esse é um comportamento comum e, acima de tudo, importante para sobrevivermos a muitas situações. Não fosse assim, lidar com a brutalidade de determinados fatos difíceis da vida seria insuportável para a nossa cabeça. Nós usamos os tais alívios como modo de preparar a mente para, aos poucos, aceitar determinada situação com menos “intermediários”.
A mente, assim, funciona como um processador: a situação aparece como traumática ou devastadora, e a nossa cabeça trabalha para encontrar razões (não no sentido estritamente “racional”) que amenizem a dor. Até aí, tudo bem. Ocorre que, como tudo na vida psíquica, é fácil cruzar a linha, de modo que, aquilo que era saudável pode se voltar contra nós. Ou, para falar a língua dos filósofos, o que era virtude pode degenerar em vício.

Por uma série de razões (que em próximo texto arrisco explicar), a nossa época vive processando o mal-estar da realidade, travestindo-o em bem-aventurança. Explico. Circula, no discurso social, uma crença de que devemos ser “positivos”, retirando sempre algo de renovador e beneficamente transformador de qualquer situação; extrair “o melhor” das coisas; evitar os ressentimentos, as brigas, as disputas; que devemos carregar “somente energias boas”, nos afastar dos “conflitos” e emanar bons pensamentos e sentimentos, sem jamais mal-querer alguém ou alguma situação. Estruturalmente, é igual ao processo muito natural que expliquei acima: diante da dureza do cotidiano da vida, nós tentamos, através de um discurso, repetido insistentemente e compartilhado externamente (repetição e compartilhamento que buscam reforçá-lo), bem, nós tentamos selecionar somente os momentos benéficos e positivos.
Quer dizer, diante de uma separação, buscamos manter a harmonia e o bem-querer entre ambos envolvidos, pelas mais refinadas (e infindáveis) estratégias para evitar o conflito. Diante da nossa irritação, do nosso rancor, das nossas tristezas e das nossas derrotas, tentamos retirar de tais experiências o que elas têm a “nos agregar”. As éticas orientalistas (pelas quais nutro o mais absoluto respeito) são muitas vezes incorporadas no Ocidente por esse viés (e não pelo viés profundo que originalmente propõem – basta um estudo do budismo tibetano para saber que é uma prática fundada em renúncias, e não em atingir um verniz de paz mental pela meditação três vezes por semana). Em algum sentido, assim parece, ultrapassamos o ponto do consolo, do alívio, para algo unilateral, monocórdico. Isso pode trazer alguns empecilhos. Vejamos.
Coloquemos em ordem de “empecilhos”. Em primeiro lugar, evitar experimentar qualquer sentimento negativo, seja em relação a si mesmo, seja em relação aos outros, ao nosso passado ou ao mundo, causa um dispêndio de energia mental exacerbado. Isto é, diferente do consolo que ameniza, o dito contemporâneo parece buscar extirpar qualquer resquício de mal-estar das situações. E, para lograr isso, a mente precisa trabalhar e tanto. É uma energia dispendida talvez gratuitamente, especialmente quando envolve os outros (uma separação ou uma demissão que só deixam sentimentos bons são praticamente irresolúveis).
Em segundo lugar, algo que decorre da anterior, a vida em si fica absolutamente mais trabalhosa – e frustrante – se dela devemos extrair somente as coisas boas, pois alimentar tal expectativa diante da existência é praticamente um certificado de decepção (terminamos praticamente despreparados para a dureza e as durezas do destino).
Pior. Em terceiro lugar, se nós adicionamos à imagem que queremos que os outros tenham de nós a de que somos “positivos”, a tendência de que soframos essa decepção em silêncio e solidão é muito maior. Afinal, não podemos nos mostrar pessoas “pesadas”.
Em quarto lugar, nós estamos abrindo um espaço imenso para aquilo que os analistas chamam de falso self, isto é, a fabricação de um eu falso. Por quê? Nós podemos enganar a nossa mente, mas nunca por inteiro. Tanto ela, quanto nossas emoções não são cegas e surdas, elas sabem o que nos ocorre e o que nos afeta. Impor a nós próprios que reajamos positivamente aos distintos momentos da vida fortalece um mecanismo defensivo do nosso eu frente ao mundo, que, na realidade, é construído sobre um auto-engano. Daí, é muito fácil perder a linha entre algo que realmente não nos afetou e algo que nos afetou, mas buscamos evitar o sofrimento daí decorrente.
E, em quinto e último lugar, viver a vida positivamente (o que termina por corromper uma sugestão central do próprio discurso da positividade) não ensina coisa alguma.
O aprendizado diante da vida, a transformação ao longo da existência ou, para falar o termo da moda, a evolução de nós mesmos, não se dão numa capacidade de não se afetar pelo mundo e de suportar benevolentemente as distintas situações da vida. Pelo contrário. Qualquer terapeuta, das mais distintas correntes, sabe que “evoluímos” emocionalmente ao viver efetivamente as experiências da vida, e não ao falsificá-las.
Mais: se nós não aprendermos com os erros que cometemos (que nos fazem sofrer, ter vergonha, raiva, ressentimento e angústia de não poder consertá-los); se nós não olharmos as dores que uma relação desastrada nos deixou e o que a fez naufragar; se nós não olharmos as lambanças que fazemos com os amigos, as burradas no trabalho; se descuidarmos das dores que nos causaram, das injustiças que sofremos e das que causamos; se não olharmos as feridas que não saram e que insistem, as perdas que não voltam, ou o tempo, inclemente; se nós despercebermos tudo isso, nós poderemos parecer leves e positivos, mas seremos os mesmos, entrando e saindo da vida do mesmo jeito, com alguma espécie de sorriso tímido, adquirido ou não em um paraíso farmacológico ou num discurso de verniz.
O nosso rechaço pelos nossos erros, o nosso ressentimento por um amor perdido; a nossa dor por uma perda, a nossa raiva da injustiça humana e do destino; são, também, essas coisas que nos fazem batalhar para não errar novamente, para conquistar um novo amor, para valorizar os amigos presentes, para lutar por aquilo que julgamos certo. São elas, as irmãs gêmeas das nossas experiências belas, que fizeram, fazem e farão uma vida, talvez triste, talvez feliz, não sabemos, mas plena e realmente vivida.

Viaduto estaiado da Linha 13-Jade é concluído, Metrô CPTM


29/01/2018 - Metrô CPTM
Parte mais atrasada das obras civis da Linha 13-Jade, o viaduto estaiado duplo foi concluído na última semana com a instalação dos últimos estais e a concretagem das ligações entre todos os trechos. Nas próximas semanas as estrutura metálicas que dão forma ao concreto serão retiradas e o imenso viaduto ganhará sua forma definitiva.
A construção do viaduto estaiado começou mais tarde do que o restante das obras por conta de uma mudança no projeto. Originalmente, o trecho seria transposto por meio de viadutos com a técnica de construção chamada de balanços sucessivos, que foi usada, por exemplo, para superar a Via Dutra alguns quilômetros à frente. Porém, a concessionária da Rodovia Ayrton Senna barrou a solução por interferir no viário e a CPTM acabou optando pelo uso dos estais que permitem vãos maiores.
Com dois mastros de 70 metros de altura (equivalente a um prédio de 20 andares), o viaduto tem um vão central de 180 metros – para efeito de comparação, o vão por cima da Dutra possui 120 metros de extensão. São 24 estais de cada lado das pontes num total de 96 cabos instalados. Agora, com o final das obras civis mais pesadas, os trabalhos estão concentrados em finalizar as vias e na instalação de trilhos, sistemas e alimentação elétrica.

Previsão para março

Assim como outras obras do Metrô, o prazo dado pelo governo é março deste ano, último mês em que o governador Geraldo Alckmin (PSDB) terá para inaugurar pessoalmente qualquer projeto caso queira mesmo ser o candidato à presidência pelo seu partido. Ou seja, são cerca de 60 dias para finalizar todos os trabalhos e iniciar os testes com os trens. Por essa razão, é bem provável que Alckmin até ande a bordo de um trem da CPTM no trecho em modo manual antes de descompatibilizar do prazo.
Já para os futuros usuários da linha, que ligará o Aeroporto de Guarulhos à rede metroferroviária, será preciso um pouco de paciência. O início da operação será restrita tanto em horário quanto em frequência de trens, necessários para que tudo seja testado e ganhe confiabilidade. Aos poucos, o serviço deve ser ampliado até chegar à operação plena, provavelmente a partir do segundo semestre.