sábado, 13 de maio de 2017

Bolsa Empresário custa quase o mesmo que o Bolsa Família - ALEXANDRE SCHWARTSMAN


FOLHA DE SP - 10/05

Quando estive no BC, rapidamente me acostumei com as reações depois de cada decisão do Copom: se subíamos os juros, não deveríamos; se mantínhamos, deveríamos ter cortado; se cortávamos, não era o suficiente.

Apesar disso, sempre acreditei que, por mais iradas que fossem as declarações sobre a Selic, o que realmente tiraria aquele pessoal do sério seriam mudanças no crédito subsidiado do BNDES.

Não me enganei. Há, segundo relatos da imprensa, pressões para que a atual administração do BNDES, capitaneada por Maria Silvia Bastos Marques, seja substituída.

Reclamam que o crédito estaria "travado", dificultando a recuperação do investimento, enquanto concessionárias pedem mais recursos subsidiados.

Isso ocorre, não por acaso, depois que foi divulgada a nova taxa de juros que balizará os empréstimos do banco (sem afetar, contudo, as operações já existentes) e que deve gradualmente eliminar os atuais subsídios.

Resta claro que o problema para os insatisfeitos é o fim da considerável transferência de renda para aqueles que conseguiram se financiar no BNDES.

Numa primeira aproximação, considerando o volume de empréstimos do banco (R$ 586 bilhões), bem como a diferença entre a taxa a que o banco empresta (a TJLP, 7% ao ano) e o custo desses empréstimos para o Tesouro Nacional (a Selic, 11,25% ao ano), o subsídio consome cerca de R$ 25 bilhões/ano.

Em outras palavras, o Bolsa Empresário custa aproximadamente o mesmo que o Bolsa Família e, como este, também implica considerável redistribuição de renda, apenas no sentido oposto: de todos os contribuintes para os "sortudos" que hoje têm acesso ao BNDES. Não é difícil entender sua revolta; complicado mesmo é simpatizar com ela.

Haveria alguma justificativa para o subsídio caso os beneficiários —eleitos sabe-se lá por que critério— produzissem efeitos sobre o resto da economia que não fossem capturados pelos investidores, isto é, se o retorno social do investimento fosse superior ao retorno privado.

Falando sério, porém, quem realmente acredita que haja perto de R$ 600 bilhões em oportunidades como essa? Aliás, quem acredita que o critério tenha sido realmente esse, ou ainda que se aplique a setores "de ponta", como frigoríficos e assemelhados?

Não bastasse isso, não há evidências sólidas acerca de efeitos positivos desses empréstimos sobre o investimento. Ao contrário, conforme relatado por meu colega de Insper Sérgio Lazzarini : "Ao estudar o efeito dos empréstimos e investimentos em equidade do BNDES, descobrimos que eles não têm efeito consistente sobre performance e investimento, exceto pela redução de gastos financeiros".

Já outro colega de Insper, Marco Bonomo, não apenas reforça as conclusões de Lazzarini como mostra também que empresas que têm acesso ao BNDES são menos afetadas pelas alterações das taxas de juros, sugerindo que o crédito subsidiado, como se suspeitava, reduz a eficácia da política monetária, isto é, requer uma Selic mais alta para compensar o efeito da TJLP mais baixa.

É precisamente por afrontar o status quo que a atual diretoria sofre as pressões nada surdas dos que temem perder os privilégios e, como na reforma da Previdência, querem justificar a boquinha. Não estão preocupados com nenhuma recuperação que não seja a de suas regalias.

Um ano de impopularidade e de algum avanço - CELSO MING

ESTADÃO  - 12/05

Não é na aprovação do povo que Temer pretende ganhar pontos


Até mesmo quem apostou no “Fora Temer” e nas “Diretas Já” parece convencido de que não há o que mudar: ruim com ele, pior sem ele. E, assim, nesta sexta-feira, o governo Temer chega ao segundo outono.

Um ano é um ano e suas circunstâncias. Temer completa 12 meses de forte impopularidade e, como Dom Quixote, não é nesse quesito que pretende conquistar pontos. Uma passagem que não consta do livro de Cervantes relata que, ao chegar à primeira aldeia logo após iniciada a grande viagem, a comitiva foi recebida com intenso ladrar de cães. Foi quando o confiante Quixote disse para seu fiel escudeiro: “Ladran, Sancho, es señal que avanzamos”.

Do ponto de vista político, Temer conquistou a façanha de obter boa maioria no Congresso e, com ela, aprovar leis também impopulares, que levam ao início do saneamento das contas públicas.

Seu governo herdou a maior recessão da história recente e o mais alto índice de desemprego. Mas segue avançando nos ajustes e nas reformas, em ritmo mais lento do que o anunciado, mas segue avançando, Sancho, apesar das avarias políticas produzidas pela oposição e pela Operação Lava Jato.

Mais do que resultados imediatos, a equipe econômica, agora constituída por profissionais notáveis, conseguiu juntar grande capital em credibilidade que afastou a ameaça iminente de novos rebaixamentos pelas agências de classificação de risco. Em um ano, o Credit Default Swap, o título que mede o índice de risco do País no mercado financeiro internacional, baixou dos 327 pontos para os 204,9 registrados nesta quinta-feira, dia que também trouxe a boa notícia de virada nos resultados da Petrobrás.

O Banco Central, antes desacreditado, voltou a comandar as expectativas do mercado. Há quem ainda critique a direção de Ilan Goldfajn por excessivo conservadorismo na condução da política monetária, mas não de seguir com a enrolation com que se caracterizou a administração anterior.

O fundo do poço pode ter sido atingido, como assegura o ministro da Fazenda, mas ainda não há evidências suficientes de que a recuperação tenha se iniciado. O desemprego continua recorde e não parece que tão cedo dê sinais de virada. Mas há pelo menos três grandes feitos a exibir e mais dois com provável avanço.

Já não há represamento de preços e tarifas e, no entanto, a inflação despencou dos 9,28% em 12 meses registrados no final do governo Dilma para os atuais 4,08%. Nesse rastro, os juros também começaram a cair. As contas externas, ponto de grande vulnerabilidade nas crises passadas, mostram grande robustez. E, na área produtiva, o setor do agronegócio dá show. Deverá apontar neste ano aumento de produção física de 26% (veja o Confira), conjugado com bons preços em moeda estrangeira.

Embora mais lentamente do que o desejado, os leilões de concessão de serviços públicos e de áreas de petróleo foram retomados e deverão se intensificar no segundo semestre.

Mas não há ilusões a embalar. Os riscos reais de um desastre de enormes proporções continuam aí. A recuperação é frágil e a maioria no Congresso também. Um fracasso na aprovação das reformas pode pôr tudo a perder. Nesse caso, nem o ladrar dos cães apontará para algum avanço.

CONFIRA:

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» Supersafra

Mês após mês, os dois organismos encarregados de avaliar o comportamento das safras aumentam as estimativas. Para o IBGE, a produção física de grãos aumentará neste ano 26,2%, para 233,1 milhões de toneladas. E para a Conab, 24,3%, para 232 milhões de toneladas. Contribuirão para isso tanto o aumento da área agricultável como o da produtividade, graças, em parte, à boa distribuição de chuvas. Em faturamento bruto, R$ 550 bilhões deverão irrigar a economia a partir do interior.

Um banco amigo - MIRIAM LEITÃO


O Globo - 13/05
O BNDES aportou mais de R$ 620 milhões para o JBS comprar a National Beef nos Estados Unidos, mas a autoridade antitruste de lá vetou a aquisição. O banco, então, deixou o dinheiro com o grupo para ajudar no fluxo de caixa na crise ou para outras compras. O BNDES e o JBS eram assim: amigos. A operação de ontem está investigando várias esquisitices no tratamento que o grupo recebeu do banco.

Há de tudo, segundo se pode ver em quatro casos periciados pela Polícia Federal. Prazos que terminam e são sucessivamente prorrogados, ações convertidas a preços favorecidos, explicações contraditórias, dispensa de garantias. No caso da National Beef, a BNDESPar poderia ter cancelado a subscrição quando o negócio não pôde ser realizado. Mas não o fez. Alegou, num dos aditivos, que havia uma crise de liquidez no mundo em 2009 e isso eliminaria uma folga de caixa na JBS. Em outro aditivo informou que a empresa faria “uma ou mais compras” de ativos no exterior. A perícia da PF estranha essa mudança de motivos. “Na única seção opinativa, eles repetiram o argumento da análise anterior sobre a folga de caixa do JBS e acrescentaram que ‘é factível que surjam oportunidades de aquisição em decorrência da desvalorização generalizada dos ativos no mundo.’ Essa frase além de genérica, não foi seguida de uma manifestação dos próprios técnicos quanto ao seu mérito”.

Normalmente uma operação assim é precedida de um estudo sobre a viabilidade do negócio específico, não pode ser genericamente transferida para outra finalidade. Portanto a operação teria que ser desfeita. “Os técnicos do BNDES se abstiveram de emitir opinião, favorável ou contrária, acerca do termo aditivo mencionado, limitando-se a informar que ele tinha sido ‘negociado com os controladores do JBS’”.

A Polícia Federal concluiu, com base na perícia em documentos e em auditoria do TCU, que algumas operações produziram prejuízo para o banco. Ao todo o JBS recebeu R$ 8,1 bilhões de empréstimos, ou venda de debêntures à BNDESPar para comprar ativos no exterior. A ideia por trás das operações era que o banco ajudaria o grupo a se internacionalizar.

No fim de 2009 foi feita outra operação no valor de R$ 3,5 bilhões para que o grupo pudesse comprar o frigorífico Pilgrim’s Pride e o grupo Bertin. Neste caso, a perícia da PF apontou que o valor da conversão das debêntures em ações foi por um preço acima do que deveria ter sido se seguisse os próprios termos do contrato. Essa diferença de valor representou no cálculo da Polícia Federal um prejuízo de R$ 614,5 milhões para a BNDESPar.

“Observe-se que o prejuízo calculado está expresso em valores da época e não leva em conta possíveis benefícios inerentes ao investimento em capital societário, tais como: dividendos, bônus de subscrição, diretos de subscrição de ações”.

Nos documentos do BNDES, a PF diz que a explicação do banco foi que era preciso evitar “um crescimento excessivo na participação societária do BNDESPar na JBS”. A operação também foi criticada pelo TCU. “Poderia a BNDESPar ter buscado em conjunto com a JBS outra solução econômico financeira que não resultasse em cessão graciosa de dinheiro público”. Onze meses depois, o banco concordou em transferir as ações ao JBS a um preço 14% inferior ao usado na conversão das debêntures. A PF ressalta três outros pontos: nesta operação o BNDES dispensou as garantias; abriu mão do prêmio de 10% a que tinha direito e fez uma aprovação expressa. O prazo de processamento é em média de 210 dias. Na compra da Pilgrim’s Pride foi de 29 dias.

O crescimento do JBS foi vertiginoso. No primeiro trimestre de 2007, quando a empresa começou a publicar suas informações financeiras, o patrimônio líquido era de R$ 1,39 bi. Essa linha do balanço saltou para R$ 23,77 bi ao final de 2016, de acordo com a consultoria Economatica. Ou seja, em dez anos, o patrimônio do JBS cresceu 17 vezes.

A operação de ontem teve como alvo o ex-presidente do banco Luciano Coutinho, que está voltando do exterior, e os dois principais acionistas do JBS, Joesley e Wesley Batista. Os motivos que levaram a tanta generosidade do banco com o grupo nunca ficaram bem entendidos. E a dúvida continua.