quarta-feira, 30 de abril de 2014

A gestão da internet


26 de abril de 2014 | 2h 05

O Estado de S.Paulo
Embora não tenha agradado inteiramente a todos os representantes das dezenas de países participantes - e esteja longe de ser um documento perfeito, como reconheceu o presidente do comitê executivo do encontro, o brasileiro Virgílio Almeida -, o texto final aprovado no NETMundial resume as contribuições de diferentes regiões e de diferentes interessados na rede mundial de computadores que puderam ser aceitas pela maioria e, sobretudo, reafirma importantes princípios para a gestão e o uso da rede mundial de computadores.
De acordo com o documento, a gestão da internet mundial deve basear-se na preservação da liberdade de expressão e de associação, no respeito à privacidade e à diversidade cultural e na garantia da participação de todos os interessados, como governos, empresas, organizações da sociedade civil, instituições acadêmicas e os usuários em geral. Do ponto de vista prático, a declaração final do NETMundial - o encontro multissetorial sobre a governança da internet realizado na quarta e na quinta-feira em São Paulo - pode tornar-se a base para a elaboração de uma carta de princípios a ser seguida por todos os países.
Principal inspirador do encontro, em razão da divulgação da informação de que o governo americano havia espionado suas mensagens, o governo brasileiro conseguiu apresentar aos participantes do NETMundial como exemplo da governança na internet a lei do Marco Civil da Internet, cujo texto, aprovado na véspera pelo Congresso, foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff na abertura da conferência internacional.
Trata-se de um documento que estabelece direitos e responsabilidades dos usuários da rede de computadores, do governo, das empresas operadoras e dos responsáveis por páginas na internet. O Marco Civil também define o modelo de governança na internet no Brasil. Está sendo considerado uma referência internacional, como reconheceram vários participantes do NETMundial, entre os quais o presidente da Icann - o organismo que, entre outras funções, tem a de atribuir os endereços da internet -, o libanês Fadi Chehadé. Em entrevista ao Estado, Chehadé citou o trabalho do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) como um modelo para um comitê internacional, por se tratar de uma experiência de gestão multissetorial.
Na tramitação do projeto do Marco Civil, o governo desistiu de impor a obrigatoriedade do armazenamento de dados em data centers instalados no País, o que era considerado financeira e tecnicamente impraticável. Defendeu corretamente, porém, a preservação do princípio da neutralidade. Ela garante que os provedores não poderão cobrar mais ou reduzir a velocidade de transmissão de dados de acordo com o conteúdo. Na prática, isso impede que os provedores apliquem tarifas maiores na transmissão de conteúdos considerados mais pesados, como vídeos.
O governo tentou, sem êxito, inserir o princípio da neutralidade da rede no texto final do NETMundial. No documento, a neutralidade aparece de maneira indireta, e como simples referência, com a indicação de que seja debatida em futuros fóruns internacionais.
A questão da espionagem, utilizada como pretexto pelo governo brasileiro para realizar o encontro mundial, foi tratada quando se discutiu o tema "vigilância em massa". O documento final resume-se a declarar que essa prática "sabota a confiança na internet e no ecossistema de governança da internet" e o tema "deveria ser conduzido de acordo com a Lei de Direitos Humanos". Dificilmente poderia ser mais óbvio.
Decerto houve descontentamentos. O representante russo discordou do texto, por ter sido, segundo ele, elaborado sem transparência. O americano, por sua vez, disse aoEstado que os EUA não concordam com a afirmação de que a vigilância é sempre uma violação da privacidade.
Para Demi Getschko, do CGI.br, no entanto, o texto representa um grande avanço, pois, como disse ao jornal Valor (25/4), "nunca tinha visto um resultado desse tipo em nenhum evento da internet".

O preço da tarifa congelada


26 de abril de 2014 | 2h 04

O Estado de S.Paulo
Como era inevitável, já começam a aparecer as consequências do congelamento da tarifa dos meios de transporte coletivo da capital em R$ 3, o que vem lembrar às autoridades estaduais e municipais - responsáveis respectivamente pelo sistema metroferroviário e o serviço de ônibus - que em algum momento, que não vai tardar, terão de enfrentar o problema. Tarefa difícil, pois não haverá como escapar das decisões corajosas e impopulares que o caso exige.
O prejuízo do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) aumentou no ano passado, como mostram estudos das duas empresas, segundo reportagem do Estado. E o governo reconhece que uma das causas disso é a revogação do reajuste da tarifa, que de R$ 3,20 voltou para R$ 3, em resposta às manifestações de rua de junho passado. Os números impressionam. A subvenção para a CPTM, por exemplo, aumentou 43,7%, indo de R$ 537,5 milhões em 2012 para R$ 772,2 milhões no ano passado. Quanto ao Metrô, ele não recebe subvenção direta, mas compensações como a referente à gratuidade para idosos.
Quanto ao prejuízo, o da CPTM foi de R$ 507,4 milhões ante R$ 217,2 milhões no período considerado, um aumento de 133%. O do Metrô foi igualmente muito grande, pois passou de R$ 28,6 milhões para R$ 76,4 milhões. Prejuízos dessa ordem só podem ser explicados pela contenção da tarifa em níveis claramente irrealistas. O reajuste de R$ 0,20 já ficara abaixo da correção exigida pela inflação registrada entre um aumento e outro.
Ele foi, aos olhos do governo estadual e da Prefeitura, o máximo de concessão possível para evitar reações dos usuários. Mas, mesmo assim, os protestos não só vieram, como adquiriram dimensões impressionantes, com as manifestações que, a partir de São Paulo, se espalharam pelas principais cidades do País. Com a revogação do aumento, em resposta ao movimento, o peso dos subsídios ao transporte coletivo ficou muito maior do que aquilo que o Estado e a Prefeitura de São Paulo julgavam tolerável, ainda que com sacrifício.
Para enfrentar essa situação, o Metrô afirma em nota oficial que, "diante do congelamento das tarifas, a empresa, em sintonia com as diretrizes do governo do Estado para a racionalização e eficiência da utilização dos recursos, intensificou as ações de combate ao desperdício e promoveu a renegociação de contratos". Em outras palavras, está cortando tudo que é possível para fazer economia. O mesmo faz a CPTM. Segundo o secretário de Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, o ponto principal desse esforço, "a economia forte que nós fizemos, foi nas licitações, com reduções de até 40% no valor das obras".
Mas nada disso livra o governo de dois problemas. Em primeiro lugar, embora ele insista em que os cortes de gastos estão sendo feitos de forma a não prejudicar a segurança do sistema, é muito difícil de evitar que, conjugados com a superlotação dos trens do metrô e da CPTM, eles não a afetem. Certamente não é por acaso que as panes no sistema metroferroviário se tornaram mais frequentes.
Em segundo lugar, é evidente que, por mais importantes que possam ser as economias, elas não conseguirão cobrir por tempo muito longo os custos acarretados pelo congelamento da tarifa. Segundo o governador Geraldo Alckmin, "não tem nenhuma notícia de aumento de passagem" neste ano. Com a Copa do Mundo, as eleições e o temor de novas manifestações, não seria mesmo de esperar outra coisa. E tudo que vale para ele vale igualmente para o prefeito Fernando Haddad. Mesmo às voltas com subsídios ao serviço de ônibus, que com a tarifa congelada chegaram às alturas de R$ 1,6 bilhão, também ele certamente não a aumentará logo.
Mas, não importa por que motivos, quanto mais demorar o descongelamento, mais grave será o problema. O reajuste terá de ser maior, assim como crescerá o rombo financeiro. E não se terá como evitar o seu reflexo na segurança do sistema de transporte coletivo. Tudo à custa da população que, em última instância, é quem paga a conta com seus impostos.

Crime subiu em 91% dos DPs da capital

Em cinco regiões, o aumento no número de roubos foi maior do que 100%, entre elas, a do Jaguaré, na zona oeste, e a da Avenida Paulista

25 de abril de 2014 | 22h 22

Daniel Trieli e Luciano Bottini Filho - O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Dos 93 distritos policiais da cidade de São Paulo, 85 (91%) registraram aumento no número de roubos (exceto de veículos, carga e a bancos) no primeiro trimestre, ante o mesmo período de 2013, e 67 tiveram alta no total de roubos e furtos de veículos. Em cinco DPs (entre eles, o do Jaguaré, na zona oeste, e o que cobre a área da Avenida Paulista), o número de crimes mais do que dobrou.
A meta para todo o Estado era que esses crimes ficassem estáveis. A Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirma que não é possível aplicar o mesmo teto para todos os DPs, já que há variação entre a criminalidade de cada local. Áreas onde não há muitos crimes, por exemplo, podem apresentar um aumento desproporcional com poucas ocorrências. A pasta afirmou que divulgaria quais eram os limites previstos para cada distrito, mas disse que eles ainda não estão finalizados.
Estado já havia informado ontem que, só nos dois primeiros meses do ano, quase metade dos DPs paulistanos já havia estourado a meta trimestral de redução de criminalidade. O mais preocupante já era o 93.º DP (Jaguaré), que cobre a Cidade Universitária e parte do Butantã. Essa região teve um salto de 222 para 365 roubos entre o primeiro trimestre de 2013 e o de 2014, uma alta de 144,6%.
Os policiais da área afirmam que as favelas do bairro facilitam a fuga de criminosos. Além disso, o delegado titular do 93.º DP, Paulo Arbues Andrade, reclamou dos estudantes da Universidade de São Paulo (USP), "que não permitem a entrada da Polícia Militar no câmpus".
"Em parte, a criminalidade cresceu", admitiu ontem o secretário da Segurança Pública, Fernando Grella Vieira. "Nós sabemos que há uma tendência de aumento de roubos. Em parte, houve o impacto da diminuição de subnotificação e, por isso, estamos trabalhando." Grella se referiu à ampliação da delegacia eletrônica para roubos, no fim do ano passado, que teria reduzido a chamada cifra negra das estatísticas - o número de vítimas que não relatam os crimes às autoridades.
O secretário, como em outros balanços mensais, voltou a criticar o sistema criminal brasileiro e a legislação como fatores responsáveis pelos crimes contra o patrimônio. "Nós estamos atuando na inteligência, na integração e na investigação, mas é preciso também que haja um esforço do País no que se refere à questão da impunidade."
Tendências. Se os roubos estão incomodando o governo, os homicídios são um problema menor, apesar de o Estado não ter cumprido a meta de redução. "Nós não precisamos ter uma queda de 10%, 20%. Basta que haja uma tendência", disse o secretário. "Essas mudanças de indicadores não acontecem em um curto espaço de tempo."
Segundo Grella, o governo está tomando medidas como a contratação de novos policiais e um sistema de detecção de suspeitos trazido da polícia de Nova York, que analisa imagens de câmeras de segurança automaticamente. A operação deve começar em quatro meses.
Para maio, o secretário promete que haverá uma divulgação mais específica de crimes, como modalidades de roubo e perfil de homicídios. "Não temos medo da transparência. A partir do mês que vem, vamos publicar dados mais detalhados."


Com alta de 33%, número de roubos no 1º trimestre é o maior em 19 anos no Estado

Foram, respectivamente, 79.093 e 40.671 ocorrências, o que significa altas de 33,5% e 44,6%, em comparação com o mesmo período do ano passado

por Agência Estado
O Estado e a capital paulista registraram, nos primeiros três meses do ano, os maiores índices de roubos (exceto de veículos) desde 1995, quando os dados trimestrais começaram a ser divulgados. Foram, respectivamente, 79.093 e 40.671 ocorrências, o que significa altas de 33,5% e 44,6%, em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo dados divulgados nesta sexta-feira, 25.
Com o aumento dos crimes contra o patrimônio, nem o Estado nem a capital paulista conseguiram cumprir a meta de redução de criminalidade estabelecida pelo governo estadual em seu programa de bonificação a policiais civis e militares. Em dois critérios (roubos em geral e roubos e furtos de veículos), o objetivo era igualar os resultados do primeiro trimestre do ano passado. O terceiro objetivo era reduzir homicídios e latrocínios. Houve queda, mas aquém do esperado pela Secretaria da Segurança Pública (SSP).
Com o estouro da meta, o programa de bonificação será alterado. Nesta sexta-feira, o secretário da Segurança Pública, Fernando Grella Vieira, anunciou que as metas estaduais e regionais serão excluídas neste trimestre. Nessa primeira fase, a avaliação será feita somente pelo resultado da delegacia ou da companhia da PM.
O Estado e a capital paulista registraram, nos primeiros três meses, os maiores índices de roubos desde 1995 (Foto: Divulgação)
O Estado e a capital paulista registraram, nos primeiros três meses, os maiores índices de roubos desde 1995 (Foto: Divulgação)

No plano original, que ainda precisa ser aprovado pela Assembleia Legislativa, os policiais receberiam de R$ 500 a R$ 2 mil pelas metas trimestrais de roubos em geral, furto e roubo de veículos e vítimas de letalidade violenta (homicídios e latrocínios). Com a escalada da criminalidade, o primeiro trimestre não incluirá mais as metas de roubo e o bônus será de, no máximo, R$ 500. "Estamos excluindo o roubo e concentrando em roubo de veículos e em letalidade das áreas locais, para que sirvam de estímulo", disse Grella. "É uma solução inicial."
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), atribuiu o aumento nos roubos à nova forma de notificação de casos, por meio dos boletins de ocorrência eletrônicos no site da SSP. "Nós temos números mais verdadeiros. Antes, você tinha de ir à delegacia para fazer o boletim, o que dá trabalho e perde-se tempo. Hoje, você faz de casa", disse Alckmin. "Estatística não é para agradar ou desagradar. Ela é uma ciência para você ter planejamento e estabelecer diretrizes para eficiência do trabalho", disse o governador, que acredita no programa de metas como estratégia para a diminuição dos crimes no Estado. "Não atingiu agora, mas pode atingir mais à frente."
Mortes
O Estado teve redução de 3,3% nos assassinatos (de 1.189 para 1 150), o que não foi suficiente para atingir a meta de 7,4% de redução no número de vítimas de letalidade violenta. O mesmo aconteceu com a capital: redução de 4,9% (de 304 para 289 mortes), mas a meta de redução no número de vítimas era de 9%.
Para Alckmin, o objetivo era "ousado". "Quando você estabelece uma meta para ser atingida, ela pode ser até ousada. Nós não queremos que mantenha nem aumente (o crime contra a vida), nós queremos que reduza. É uma meta ousada. Nós temos um objetivo e um foco", disse o governador.