quarta-feira, 23 de abril de 2014

Aos poucos, bagaço da cana toma o lugar do amianto

Muitos produtos que hoje fazem parte do cotidiano, um dia foram objeto de estudo de faculdades. Esse parece ser o caminho de um projeto desenvolvido para conclusão do curso de Engenharia Química do Centro Universitário da FEI, que utiliza o bagaço da cana-de-açúcar no lugar do amianto, substância tóxica e proibida em muitos países.
“Nossa ideia foi dar um destino sustentável para o bagaço da cana-de-açúcar que geralmente é descartado, gerando impactos negativos ao meio ambiente”, explica Carolina Espínola Negrão, uma das engenheiras que desenvolveu o estudo no ABC paulista.
O projeto mostrou-se uma alternativa ao uso do amianto na construção civil, especificamente na fabricação de telhas. Os resultados dos testes realizados acrescentando o resíduo agrícola à matriz do cimento foram positivos.
“O bagaço da cana-de-açúcar se mostrou um produto plausível para a fabricação de telhas, porque, nos testes que fizemos, o bagaço provou ter as propriedades necessárias como alta resistência e baixos níveis de absorção de água. As telhas de bagaço de cana são até mais resistentes que a de amianto”, argumenta a engenheira.
Do ponto de vista econômico, o uso do resíduo mostra-se vantajoso, pois, segundo a engenheira química, o bagaço da cana é um resíduo de custo zero, uma vez que é o resultado do processamento da cana-de-açúcar. “Já o amianto, que é um mineral, tem que ser extraído da natureza o que por si só gera um custo não apenas financeiro, mas também para o meio ambiente”, lembra.
Com o resultado dos testes, a iniciativa abre uma perspectiva para que o produto se torne uma opção sustentável, eficiente e econômica para a construção civil.
 (Fonte: Diário de S.Paulo)

Bons preços da energia estimulam cogeração


Volume estimado é de 500 mil MWh, que representa o dobro em relação a 2013. Suficiente para abastecer um município com 1 milhão de habitantes
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2009-07-14 Subestacçao Energia Eletrica  Cerradinho Potirendaba BioeletricidadeEnquanto os reservatórios de muitas hidrelétricas brasileiras definham com a escassez de chuvas, as usinas de açúcar e etanol aproveitam para produzir mais eletricidade a partir do bagaço da cana e abocanhar os preços recordes pagos pela energia no mercado livre. Em geral, a estratégia foi antecipar para fevereiro e março o início da produção de eletricidade usando bagaço e palha da cana. Algumas usinas compraram o insumo de indústrias vizinhas e buscaram até cavaco de madeira e resto de podas de árvores para gerar mais energia.
Ainda não há dados oficiais que indiquem quantos megawatts-hora (MWh) as usinas de cana conseguiram produzir adicionalmente no mês de março. Mas os números de fevereiro já confirmam a antecipação. Segundo dados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), foram exportados para o sistema elétrico nacional em fevereiro deste ano 280 mil MWh de energia de biomassa (90% dos quais vindos da cana). O volume é 71% maior que o registrado em fevereiro de 2013 (164 mil MWh)
Para março, o mercado estima que esse volume deve ter se aproximado de 500 mil MWh, mais que o dobro do registrado um ano antes (223 mil MWh). Esse total seria suficiente para abastecer, por um ano, um município com pouco mais de 1 milhão de habitantes.
Não há informações disponíveis sobre como essa energia foi comercializada em março. Potencialmente, porém, as usinas sem obrigações de entregar a energia para cumprir contratos antigos tinham condições de vender o insumo ao preço médio de R$ 750 o MWh. “Normalmente, quando não há nem excesso e nem falta de chuvas, o mercado livre oferta preços de R$ 130 a R$ 140 o MWh”, afirma Luiz Cláudio Barreira, especialista em bioeletricidade da consultoria FGAgro.
De olho nesses preços recordes, a Cerradinho Bioenergia, grupo com uma usina de cana-de-açúcar em Goiás, conseguiu produzir 8% mais eletricidade nos primeiros meses deste ano. Isso só foi possível porque a empresa reduziu de 60 para 45 dias o tempo de manutenção na indústria na entressafra da cana. Dessa forma, em meados de fevereiro já havia ligado as caldeiras para iniciar a produção de eletricidade.
Assim, em vez de produzir os 190 mil MWh inicialmente previstos na safra 2013/14, a Cerradinho Bioenergia conseguiu produzir 205 mil MWh. Esse excedente foi negociado a preços até quatro vezes maiores do que os normalmente pagos no mercado regulado. “Chegamos a comercializar parte dessa produção adicional a R$ 822 o MWh”, diz Gustavo de Marchi, diretor administrativo e financeiro da Cerradinho Bioenergia. Dessa forma, a receita com a venda de energia elétrica, projetada para ser de R$ 45 milhões na safra, foi a R$ 50 milhões, segundo de Marchi. “Esse montante entra como geração de caixa na veia”, afirma ele.
Cerca de 80% da eletricidade exportada pela Cerradinho Bioenergia está vendida em contratos de longo prazo no mercado regulado – via leilões da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) – a um preço médio de R$ 200 o MWh (referente ao volume entregue na safra 2013/14. O restante foi negociado no mercado à vista ao longo do último ano a um preço médio 50% mais alto – R$ 300 o MWh. “Esse preço médio do spot foi puxado pelas vendas a preços recordes que fizemos no fim da safra 2013/14″, explica o diretor da empresa, que tem capacidade para moer 4 milhões de toneladas de cana-de-açúcar por safra.
Maior grupo sucroalcooleiro do país, a Raízen Energia, controlada por Cosan e Shell, também antecipou em cerca de um mês a produção de energia em três de 24 usinas para aproveitar a janela aberta pelo mercado. O vice-presidente de açúcar e etanol da companhia, Pedro Mizutani, afirmou que no mês de março as unidades começaram a queimar bagaço e palha de cana que estavam estocados. A empresa também adquiriu outros tipos de biomassa para ampliar a produção.
Com isso, somente no mês passado 45 mil MWh foram produzidos nas três usinas em questão – uma em Goiás e duas em São Paulo. Metade desse volume foi entregue em contratos de venda já firmados e a outra metade foi negociada no mercado spot, segundo Mizutani.
“É um volume pequeno perto da nossa produção total, que é de 2,1 milhões de MWh, mas não deixa de ser uma boa oportunidade do mercado”, afirmou o executivo da Raízen ao Valor. A maior parte da produção de energia da companhia está comprometida com contratos de longo prazo. No caso da Raízen, 85% da produção anual é entregue para cumprir esses compromissos e 15% são negociados no mercado spot ao longo do ano.
A Biosev, segunda maior produtora de açúcar e etanol do país, está desde fevereiro deste ano comprando bagaço de cana-de-açúcar de usinas vizinhas para elevar a produção de energia. Enrico Biancheri, diretor comercial da companhia controlada pela francesa Louis Dreyfus Commodities, não informa o volume de energia adicional que a empresa produziu no primeiro trimestre deste ano, mas afirmou que algumas usinas do grupo anteciparam para março a cogeração. “A companhia tem condições de produzir 10% de energia adicional por meio de compra de bagaço de terceiros”, afirma.
Citando dados da CCEE, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) informou que, no ano passado, 15,067 mil GWh de energia elétrica produzida a partir de biomassa (90% de cana-de-açúcar) foram exportadas para o sistema elétrico nacional. Esse volume representou 3,3% do consumo nacional de eletricidade. Em 2012, essa participação foi de 2,9%.
(Fonte: Fernanda Batista – Valor Econômico)

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Descarto, logo existo ( da Revista da Folha)



Após criar 19 leis e decretos sobre limpeza e reciclar apenas 1,8% do total coletado, São Paulo ganha mais um projeto para impulsionar coleta seletiva e responsabilizar empresas pelo lixo
RAFAEL BALAGO
O novo Plano Municipal de Resíduos Sólidos, lançado pela prefeitura no começo deste mês, prevê aumentar a reciclagem de 1,8% para 10% até 2016, levar a coleta seletiva para todos os bairros e estimular a transformação de lixo orgânico em adubo. Há metas traçadas até 2034. Até lá, a expectativa é que o reaproveitamento atinja 70%.
Não é a primeira vez que um plano do tipo é criado. Em 2006, houve outro projeto municipal. Sem avanços, ele teve de ser refeito para se adequar à PNRS (Política Nacional de Resíduos Sólidos), de 2010. A lei federal trouxe propostas como o fim dos lixões e a logística reversa, que divide com as empresas a tarefa de recolher seus produtos e embalagens após o uso, mas pouca coisa avançou até agora.
Para ampliar a reciclagem, a prefeitura promete aumentar a circulação de caminhões de coleta seletiva, que hoje atendem a apenas 42% dos domicílios da cidade, e trocar o modelo de pequenas cooperativas por grandes centrais mecanizadas. Com a inauguração de quatro delas até 2016, a capacidade seria ampliada em mil toneladas/dia. Em 2013, foram tratadas cerca de 250 toneladas por dia, contra 197 em 2012.
A forma de remuneração também será revista. "As cooperativas têm produtividade baixa e precisam se virar para comercializar a produção. Com as centrais, a venda será unificada e o dinheiro obtido irá para um fundo comum, gerido por um conselho", explica Simão Pedro Chiovetti, secretário municipal de Serviços, que comanda a limpeza urbana.
"Em vez de criar seus próximos sistemas de logística reversa, as empresas poderão aderir às estruturas municipais e, como contrapartida, investirem nesse fundo", prossegue o secretário. Uma das iniciativas em análise, por exemplo, é fechar acordos com empresas de embalagens, que comprariam materiais como plástico e metal direto das centrais da prefeitura.
Os catadores questionam o novo plano municipal, que prevê mudanças nas formas atuais de subsídio. "A proposta da prefeitura transforma o catador em mero separador [de lixo]", diz Eduardo Ferreira, líder do Movimento Nacional dos Catadores em São Paulo e que trabalha com reciclagem há 30 anos.
Sem o envolvimento para valer de moradores, profissionais do setor e empresários, a nova proposta pode ser mais uma a ir para baixo do tapete.
O Plano Nacional de Resíduos Sólidos, por exemplo, foi finalizado em 2011, mas não entrou em vigor. Falta a aprovação do Conselho Nacional de Política Agrícola, criado há dez anos, mas que nunca se reuniu. Devido ao atraso, o documento precisará ser revisto, pois algumas metas já venceram.
Confiança abalada
Para Daniel Marconi, consultor de gestão de resíduos, a estratégia da prefeitura é adequada, mas o principal desafio é convencer a população a participar. "A confiança dos paulistanos está comprometida", avalia. Sobre as empresas, ele diz que desde a revolução industrial elas não são cobradas por isso. "Leva tempo pra mudar."
De fato: há quatro anos, a PNRS determinou que seis categorias, entre elas eletrônicos e lâmpadas, fossem as primeiras a implantar a logística reversa. Mas, até agora, como a lei não deu prazos claros, foi fechado apenas um acordo. Na capital paulista, são geradas 30 mil toneladas de lixo eletrônico por ano.
Além da falta de interesse dos empresários em assumir custos, há dificuldade em integrar os envolvidos no processo, como importadores e vendedores. "A lei é arrojada, só que não trouxe incentivos econômicos e nem responsabilidades por não cumprimento", defende Zilda Veloso, diretora de Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente. O órgão planeja fechar acordos com os setores de eletrônicos e de embalagens até o começo do segundo semestre.
O primeiro termo municipal desse tipo deve ser assinado em maio, com fábricas de tecido. Diariamente, as empresas do Brás e do Bom Retiro geram quase 40 toneladas de recortes, que vão para aterros. "O jeans interessa para a indústria automotiva, que o usa para forrar veículos. E as tiras de algodão servem para fazer barbante", explica Rogério Melo, diretor do Sinditêxtil-SP. A prefeitura cedeu um galpão e os empresários equiparam o lugar com máquinas, que serão operadas por ex-catadores. A previsão de início é no segundo semestre.
Mineração no computador
"Em qualquer lugar do mundo, a gestão de resíduos tem mais despesas do que receitas. Alguns materiais têm valor maior, como a latinha e o PET, mas quando tudo é somado, a vantagem se dilui nos custos de operação", analisa Carlos Silva Filho, presidente da Abrelpe, que reúne empresas de limpeza pública.
O que ajuda a fechar a conta das empresas e cooperativas são as vedetes da reciclagem: os metais. Além das latinhas (98,.5% são recicladas), a busca se volta para os eletrônicos. Fora o cobre, uma placa de computador tem pequenas quantidades de ouro e prata. "É o chamado computer mining'. Em vez de procurar metais na natureza, a mineração é feita em placas de aparelhos usados", explica Tereza Carvalho, coordenadora do Laboratório de Sustentabilidade da USP.
Dentro do campus do Butantã, há um galpão abarrotado de CPUs, monitores e outros aparelhos.
O quilo das placas verdes, depois de retiradas, vale até R$ 15. Entretanto, para que os metais preciosos possam ser retirados, todo o material precisa ser enviado de navio para países como o Japão. "As empresas que detêm essa tecnologia não se instalam no Brasil porque falta uma quantidade de lixo adequada para viabilizar o negócio", explica Teresa. Vale lembrar que o país possui mais de 270 milhões de celulares, que geralmente são trocados após poucos anos de uso. Falta apenas coletar tudo isso.
Se o armazém da USP está cheio, na Coopermiti, única cooperativa vinculada à prefeitura que recebe apenas eletrônicos, há espaço de sobra. "Poderia processar até cem toneladas por mês, mas só recebemos 30", se queixa Alex Pereira, diretor da cooperativa, situada na Barra Funda.
A Coopermiti vai buscar computadores, celulares e TVs usadas na casa de qualquer paulistano, mediante agendamento, sem taxas.
Trem moído
Já a Trufer, empresa com sede em Diadema, trabalha com proporções maiores: está de olho nos cemitérios de metais que surgiram pela cidade. Nos arredores da estação da Lapa, por exemplo, dezenas de vagões de aço enferrujavam a céu aberto. A empresa participou de leilões e comprou alguns trens velhos, que foram desmontados e levados para seu pátio no ABC.
Lá, as composições são fatiadas, colocadas em uma máquina que separa o metal do plástico e da espuma. O metal retirado é moído e transformado em bolinhas com 5 cm de diâmetro. Esse tipo de sucata processada vai direto para as caldeiras de siderúrgicas e entram na composição do aço.
A Trufer, que também compra materiais de sucateiros, participou de outro leilão e pagou R$ 800 mil pelo direito de retirar mais de 13 mil veículos apreendidos pela polícia em um pátio na represa de Guarapiranga.
Cada veículo, quase nenhum em condições de rodar, custou cerca de R$ 60 (numa conta aproximada) e, depois de passar pelo mesmo processo dos trens, pode render por volta de R$ 250 de faturamento.
O quilo do metal reciclado vale R$ 0,40, cerca de um décimo do valor do minério de ferro puro.
"Temos um custo fixo alto, gerado pela manutenção e importação da máquinas", aponta Silvana Ramos, gerente da Trufer.
A ideia agora é que os catadores assumam os postos de trabalho nos negócios da reciclagem. "Nas cooperativas, como o preço dos materiais varia e a quantidade de lixo também, eles não conseguem ter uma renda fixa", diz Pereira, da Coopermiti, onde trabalham 25 pessoas com salário que varia entre R$ 800 e R$ 1.200 por mês.