domingo, 20 de janeiro de 2013

Crise provoca problemas a usinas de cana-de-açúcar de SP e GO


Nos últimos cinco anos, várias usinas de açúcar e álcool no Brasil fecharam ou entraram em regime de recuperação judicial por dificuldades financeiras.
Em reportagem neste domingo (20), oGlobo Rural mostrou a situação em São Paulo, principal estado produtor do país, e em Goiás, o terceiro (ao lado, veja a íntegra da reportagem).
A União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), que representa o setor no centro-sul do país, informa que 40 usinas fecharam as portas nos últimos cinco anos. A entidade reconhece que houve problemas de má gestão, mas disse que esse não seria o único motivo da crise.
"Um pouco é a responsabilidade das empresas. Mas o grande problema é a questão da perda de produtividade agrícola. Primeiro, pela falta de recurso para você manter o canavial sadio. Faltou dinheiro para plantar cana, para renovar o canavial. Segundo, tem três safras consecutivas: uma safra muito seca, uma safra muito chuvosa e, na safra do ano passado, tivemos além disso tudo uma questão de geada em vários locais. Isso aumentou o custo. De um lado, aumenta o custo. De outro lado, você não tem como repassar o aumento de custo para o preço. O que acontece? Aumenta o endividamento. E cada vez mais as empresas vão se endividando e vão perdendo a capacidade de continuar produzindo", diz Antônio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da entidade.
Há meses se discute a possibilidade do governo autorizar um aumento da gasolina, o que traria um alívio para o mercado do etanol. Enquanto isso não acontece, é muito difícil repassar os aumentos de custos no campo e nas usinas para as bombas dos postos de combustível
Goiás
A Usina Santa Helena é a mais antiga indústria do setor em Goiás. A falência da empresa no sudoeste goiano foi decretada no final de novembro de 2012. Ela não conseguiu cumprir o plano de recuperação judicial em que se encontrava desde 2008. Os mais de dois mil funcionários entraram em férias coletivas em dezembro. Na entrada do local, vigilantes e um cão guardam o patrimônio.
A manutenção da usina deveria ter começado em dezembro, logo após o final da safra do ano passado. Com a falência, até agora está tudo parado. A manutenção de uma indústria como esta leva de três a quatro meses. Sem esse trabalho, não é possível fazer a colheita da cana, que irá começar em abril.
Dezenas de máquinas estão paradas no pátio. Muitas são de prestadores de serviço como o empresário Marcio de Oliveira, que tem um contrato de locação com a usina que vence em abril.
O trabalho também está parado nos canaviais. São 25 mil hectares de lavoura. A usina arrenda boa parte da terra de produtores da região, como dona Lucia Helena Fernandes. Ela tem 120 hectares arrendados e não recebeu nada do contrato de 2012.
A administração da empresa, designada pela Justiça, pretende recolocar a usina em operação na próxima safra. O objetivo é vender a indústria, que em atividade vale R$ 386 milhões. Parada, terá que ser arrematada como sucata.
São Paulo
Em São Paulo, duas usinas também passam por dificuldades. O produtor de cana Dagoberto Abegão era um dos fornecedores da usina de açúcar e álcool Decasa, que fica no município de Marabá Paulista, oeste do estado. No ano passado, ele chegou a ficar oito meses sem receber os pagamentos. A situação também é complicada para os 1,2 mil trabalhadores da usina, que não receberam os salários de dezembro.
No oeste paulista, outra usina está passando pela mesma situação. A Floralco fica no município de Flórida Paulista. No local, 1,9 mil trabalhadores entraram em greve em dezembro por causa do atraso no pagamento dos salários.
As duas empresas estão passando pelo processo de recuperação judicial, tempo dado pela Justiça para a empresa se recuperar da crise. O escritório do advogado Joel Thomaz Bastos representa a Floralco e outras seis empresas que se encontram em dificuldades.
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O futuro jogado às traças, por Eliane Cantanhêde


BRASÍLIA - Em meio a tantas discussões econômicas e à enxurrada de mortes que assola o país, passou quase em branco uma das imagens mais chocantes da semana passada: ônibus escolares novos em folha, 300 mil livros didáticos, uniformes, tênis, material e pilhas impressionantes de cadeiras apodrecendo num depósito ou debaixo de sol e chuva há pelo menos dois anos.
Tudo isso foi mostrado pelo repórter Alex Barbosa no "Jornal Hoje", da Rede Globo, justamente em São Luís, no Maranhão, Estado com o pior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), lanterninha em português e matemática e candidato ao "Guinness" no último Enem: 5 das 10 piores escolas do país são maranhenses.
Logo, tudo o que está jogado ali já seria importante em qualquer cidade, de qualquer Estado, mas teria de ser tratado como tesouro no Maranhão. Os responsáveis pelo descalabro deveriam responder por crime de lesa-pátria -senão hediondo.
O prefeito de São Luís era o tucano João Castelo, que perdeu a reeleição (imagine-se por que...). E, além dele, não havia secretários? Fiscalização externa? Diretores de escolas? Professores? Pais de alunos? Não é possível que ninguém tenha visto, ouvido e gritado por socorro.
E esse é só um caso entre centenas, até milhares, que ocorrem por toda a parte, mas não vão parar na TV e ninguém fica sabendo.
Dilma, que dá prioridade à educação (aumento diferenciado para professores, investimentos muito acima da inflação, o Ciência sem Fronteiras), deve ficar enlouquecida.
Assim como a Saúde tenta reaver 300 ambulâncias abandonadas em todo o país, o MEC vai passar um pente-fino nos convênios e programas com recursos federais em São Luís e denunciar ao Ministério Público.
Até lá, os cinco ônibus escolares, os 300 mil livros e todo o resto ficam jogados às baratas, às traças e aos bodes que devoram o futuro das crianças do Maranhão e de tantos outros brasileirinhos por aí.

José Aníbal: "Falta gestão ao governo Dilma, e isso é preocupante"


ENTREVISTA - 19/01/2013 10h00
TAMANHO DO TEXTO


Para o secretário de Energia de São Paulo e amigo da presidente desde os tempos de movimento estudantil, risco de racionamento evidencia falhas do governo federal na infraestrutura

ALBERTO BOMBIG
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O secretário de Energia de São Paulo, José Aníbal (Foto: Camila Fontana/ÉPOCA)
O secretário de Energia do Estado de São Paulo, José Aníbal (PSDB), conheceu a presidente Dilma Rousseff no início dos anos 1960, em Belo Horizonte (MG). Em Minas, ambos depois militaram no movimento estudantil e no combate à ditadura militar. Desde então, mantêm uma amizade que nem as colorações partidárias foram capazes de estragar. Porém, ele não se exime de criticar o governo Dilma quando o assunto é área de energia e suas correlações com a infraestrutura do país. “Falta gestão ao governo, e isso preocupa muito”, disse Aníbal a ÉPOCA.

No final do ano passado, Aníbal bateu de frente com Dilma. Ele liderou uma rebelião de Estados contra alguns pontos do projeto do governo federal que prevê reduzir a conta de luz dos brasileiros. Desde então, o tucano tornou-se uma voz na crítica ao Ministério de Minas e Energia, ocupado por Dilma entre 2003 e 2005. “Faltou planejamento. O governo estava agindo por impulso”, afirma, sobre as recentes medidas do governo federal no setor.
A postura de Aníbal tem despertado a ira dos petistas e, reservadamente, do Planalto. “Eu não tenho temor nenhum de encarar esse debate. Um país não se constrói com sacadas eleitorais. Um país se constrói com posições estruturantes”, diz, sempre ressalvando não ser contra a redução, mas à forma como, segundo ele, o governo federal conduziu o processo e tentou empurrar a conta para os Estados.
Leia abaixo a entrevista com José Aníbal, na qual ele fala sobre o risco de racionamento, a politização do debate no setor e as experiências de São Paulo com novas fontes de energia, como o biogás a partir da vinhaça (resíduo do processo de destilação da cana).
ÉPOCA – Qual a avaliação do senhor da política do governo federal para a área de energia?
José Aníbal –
 Faltou planejamento. O governo tem cometido alguns erros na política para o setor de energia que são evidentes. A forma de contratação, leilões únicos, o preço, a centralização em Brasília, a organização dos investimentos. Por exemplo, o governo contratou muita energia eólica e não tem como transportar. É um absurdo isto, neste momento: você ter energia disponível e não ter transporte. Assim como a energia do rio Madeira, que as linhas também estão atrasadas. É tudo falta de planejamento. O governo estava agindo por impulso, mas ocorreu um problema de escassez de chuva e tudo isso veio à tona. O lado bom é que isso propicia o debate.
ÉPOCA – Mas o senhor vê disposição no governo federal em debater a questão?
Aníbal – 
Não. O governo, de maneira surpreendente, se fecha ao debate. Há uma certa postura autocrática: nós achamos e é assim que tem de ser. O governo surpreendeu com a Medida Provisória 579. Primeiro, positivamente, para reduzir o preço da energia. Depois, negativamente, com o modo como quis impor essas regras às concessionárias. E impôs a aquelas que dependem dele e a aquelas nas quais ele é o acionista majoritário, como a Eletrobrás. Depois, recuou no caso das empresas de transmissão. No que se refere a algumas empresas estaduais, não houve nenhum diálogo. Em São Paulo, onde reconheceram ativos que não estavam reconhecendo e propuseram uma tarifa adequada, nós assinamos o acordo, no caso da Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia S/A). No caso da Cesp (Companhia Energética de São Paulo), tentamos várias negociações, vários procedimentos que permitissem uma transição, mas nada foi admitido. Agora, o próprio governo federal está reconhecendo que queria jogar para o Tesouro paulista uma conta que agora o Tesouro nacional vai bancar, porque eles estão dizendo que vão ter de colocar R$ 3 bilhões por ano para garantir essa redução. Era o que eles queriam que São Paulo colocasse, mas, para isso, São Paulo teria de tirar do saneamento, da segurança, da educação. Seria para cobrir os ativos que não seriam compensados caso o Estado tivesse assinado o acordo.
ÉPOCA – Há uma luta política?
Aníbal – 
O aspecto mais lamentável desse episódio todo é a ideologização, a politização. Quando o secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, afirmou, em dezembro, que ‘lamentava o fato de que algumas empresas não haviam aderido porque tinham dado preferência aos investidores em detrimento da população’ era um sinal eloquente de politização. Além de ser uma bobagem contrapor investimento à população. Nós precisamos de investimentos para beneficiar a população. O próprio fato de a presidente ter anunciado a redução em ano de eleição, de não ter sido feita a redução por projeto de lei, de terem exigido que todos aderissem sem saber ao certo as condições que eles iam propor... Nós estamos defendendo os interesses da população de São Paulo. É bom não politizar e trabalhar daqui para frente em convergência com os diferentes agentes em busca de dar uma resposta mais estratégica. O governo está agindo por impulso. Você observa a economia, por exemplo. Seguraram o aumento da tarifa do transporte coletivo em São Paulo para não impactar a inflação. É louvável evitar aumentos e reduzir tarifas, mas precisa ter mais planejamento e buscar alternativas. E o principal é não politizar o debate, porque isso gera insegurança nos investidores, na regulação do setor, na própria fiscalização. Não é uma questão política, é uma questão de um insumo essencial para o desenvolvimento do país.
ÉPOCA - Esse debate começou muito politizado na campanha de Lula em 2002, quando eles atacaram o apagão do segundo mandato Fernando Henrique Cardoso (1999-2002). O que vocês do PSDB aprenderam como a crise da energia no governo FHC?
Aníbal – 
Energia tem de ser um investimento permanente, que você não pode inibir a favor de qualquer outro procedimento, até mesmo da modicidade tarifária. Há quem diga hoje que essa redução na tarifa já estará totalmente absorvida pelo aumento que virá até o ano que vem. Você concede com uma mão e tira com a outra. O que nos faltou naquele momento foi justamente o planejamento estratégico. Faltou também uma reserva maior para uma contingência como esta, de falta de chuvas.
ÉPOCA – O senhor considera a redução da tarifa uma medida populista?
Aníbal – 
Do modo como foi feito, tem um inequívoco viés político. Eu não tenho temor nenhum de encarar esse debate. Um país não se constrói com sacadas eleitorais. Um país se constrói com posições estruturantes. O que deu rumo ao Brasil? O Plano Real.

ÉPOCA – Qual a avaliação do senhor sobre o momento econômico do país?
Aníbal –
 O governo federal está bem avaliado, mas não pode descuidar. Tem de perseverar. Veja a questão da infraestrutura do Brasil. Se não fosse o Estado de São Paulo, os investimentos feitos por São Paulo em rodovias, porto, acesso ao porto, como é que o país estaria? O que tem dado certo em São Paulo é a combinação de investimentos públicos e privados. O governo federal até hoje não conseguiu fazer a concessão dos aeroportos.
ÉPOCA – O senhor talvez seja, dentro do PSDB, a pessoa mais próxima da presidente. Qual sua avaliação do governo Dilma?
Aníbal –
 Espero que tenhamos sucesso nas modelagens de concessão para que finalmente possamos atrair investimentos adequados. O Brasil vai começar a ter problemas sérios de gargalos. Como podemos almejar o crescimento da economia se não temos transporte? E com dificuldades de definir uma estratégia na área de energia e logística de modo geral? A proposta da concessão dos portos é boa, mas que se efetive. Falta gestão ao governo, e isso preocupa muito. Há também dificuldades com projetos de microeconomia que não avançam. A questão tributária não muda, a guerra fiscal está mantida. É preciso resolver esses problemas.
ÉPOCA – Qual o modelo para o Brasil no setor de energia?
Aníbal –
 O Brasil tem potencial hídrico para explorar, e temos a matriz energética mais limpa do mundo, 45% dela é limpa. A de São Paulo é de 55%. No nosso plano estadual de energia em São Paulo, queremos chegar a 69% de energia limpa em 2020. Mas dependemos muito do governo federal. Temos que dobrar nossa produção de energia nos próximos dez anos. É uma combinação: temos de explorar os recursos hídricos, investir nas redes de transmissões e na energia eólica. Tem áreas onde é possível implementar parques eólicos em São Paulo. Precisamos explorar nossos potenciais de centrais hidrelétricas e a biomassa. Temos hoje uma biomassa renovável. A geração que temos hoje nas termoelétricas brasileira é a gás, óleo diesel e combustível. Por isso precisamos falar na energia térmica de biomassa.
Em São Paulo temos 4 mil megawatts e 180 usinas. No Brasil temos 440 usinas. E aqui em São Paulo elas já fazem a geração térmica com bagaço e palha de cana. A maioria para consumo próprio. Quase uma centena de usinas está modernizando seus equipamentos e gerando excedentes. Desses 4 mil megawatts, 1,2 mil já são exportados. Podemos chegar a 8,5 mil megawatts em 2015 e 13 mil megawatts em 2010. E você conecta na rede, não é necessário transportá-la. Mas o governo federal negligenciou isso nos últimos anos. Estamos jogando energia fora no país. O governo do Estado, desde 2011, isenta 100% o ICMS para modernizar as usinas de cogeração térmica que usam bagaço e palha de cana. Nós já estamos com planta experimental que extrai biogás da vinhaça. O potencial de São Paulo com gás de vinhaça é de 8 a 10 milhões de metros cúbicos por dia. Isso é energia. O governo federal precisa tirar as viseiras e enxergar essas lateralidades. O BNDES, por exemplo, tem todas as condições de financiar esses parques experimentais de biogás.