É fácil defender em abstrato que Jair Bolsonaro tem direito à liberdade de expressão, como qualquer outro possui (ou deveria possuir) no Brasil.
A zona adquire 50 tons de cinza quando a análise abstrata se espatifa no chão da realidade: Bolsonaro não tem direito à expressão se e na medida em que a expressão em si é uma das ilicitudes pela qual está sendo acusado. Bolsonaro ter a liberdade de expressar, por si ou por terceiros, ordens de coação e obstrução de Justiça é o mesmo que dizer que um estelionatário tem a liberdade de postar um link falso para vender coisa que não seja sua.
Um namorado acusado de crime de agressão possui a liberdade de expressar em rede social a vontade de matar sua companheira? Um funcionário acusado de crime de racismo possui a liberdade de expressar pelo WhatsApp que seu colega de trabalho parece um escravo? Uma vizinha acusada de crime de perseguição possui a liberdade de expressar sua obsessão pela moradora ao lado monitorando as redes sociais desta e enviando-lhe mensagens incessantemente?
O namorado abusivo, o funcionário racista e a vizinha obsessiva, todos, possuem liberdade de expressão, mas não possuem a liberdade de, por meio da expressão, perpetuar o ilícito sobre o qual estão sendo acusados, sob pena de frustrar a própria eficácia da persecução penal.
Bolsonaro não possui a liberdade de forçar goela abaixo no STF a sua própria absolvição. Comparar o caso de Bolsonaro ao da censura condenável à entrevista de Lula em 2018 é comparar maçãs com laranjas.
Manifestantes têm o pleno direito de ocupar a avenida Paulista com as cores verde e amarelo a favor de uma intervenção dos EUA no Brasil, políticos bolsonaristas e advogados de Bolsonaro têm o pleno direito de criticar Moraes e de questionar, por vias legais, a decisão de Moraes.
O tipo de liberdade que Bolsonaro defende é a de destruir o país sem se responsabilizar pela destruição que causa, como um incendiário que ordena que se ateie fogo ao parquinho mas se recusa a pagar pelo dano e ainda reclama que se queimou.
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