Nada de parques temáticos ou personagens de animação. Diante da procura cada vez maior por atividades turísticas rurais e sustentáveis, experiências imersivas em fazendas, fábricas artesanais e produções agrícolas surgem como oportunidade para pequenos produtores dinamizarem a economia local e agregarem valor a produtos e serviços.
Uma pesquisa global da Mastercard reforça o apelo dessa estratégia: 81% dos entrevistados latinos estão em busca de experiências turísticas onde possam aprender coisas novas. Além disso, dois terços afirmam que preferem ter experiências a comprar objetos.
“Quero mostrar para o cliente que a comida não vem do supermercado nem do importador. Ela vem da terra”, diz Rodrigo Veraldi, proprietário do Entre Vilas. Com mais de trinta espécies de frutas vermelhas, macieiras, lúpulo, wasabi, trufas brancas e até uma vinícola, o restaurante e hospedagem aposta em uma experiência autêntica em meio a Serra da Mantiqueira para atrair viajantes e oferecer um novo olhar sobre a trajetória do alimento, do campo à mesa.
Com 45 hectares de extensão, o Entre Vilas nasceu da necessidade de reinvenção de Rodrigo após seis anos trabalhando na produção de café no interior de Minas Gerais. A crise instaurada na região no início dos anos 2000 obrigou o engenheiro agrônomo a voltar para o sítio do seu pai, em São Bento do Sapucaí, e começar uma vida nova.
Próximo a um dos polos turísticos mais visitados de São Paulo (Campos do Jordão), o restaurante se tornou o centro do negócio e começou a atrair cada vez mais turistas que estavam enjoados dos mesmos passeios pela região. Não há guias e as reservas são feitas pelo WhatsApp antecipadamente. O menu de sete pratos muda semanalmente e é preparado pelo próprio Rodrigo com produtos da sua fazenda.
O grande destaque do empreendimento é a variedade de produtos cultivados. Em paralelo ao restaurante, o engenheiro criou um centro de pesquisa de novas espécies dentro da propriedade, o que possibilitou o desenvolvimento de espécies agrícolas que só são encontradas na fazenda.
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Segundo ele, essa diversidade funciona como uma estratégia para agregar valor ao negócio. “Não adianta sair plantando coisas em larga escala que não vou conseguir competir com os grandes produtores”, explica. O restaurante aposta em utilizar essas novidades como chamariz para gerar curiosidades aos clientes e fazer do restaurante algo diferenciado. “Nossa despensa é muito maior do que um quartinho, na verdade ela tem 40 hectares”, explica.
Outro exemplo de empreendimento focado na experiência rural imersiva é a Zalaz. Também localizado na Serra da Mantiqueira, o projeto começou como uma cervejaria artesanal e hoje oferece diversas visitas que envolvem as produções agrícolas, como um tour na fazenda e na cervejaria.
“Nosso objetivo é trazer o “uau”. A pessoa se deslocou até o “meio do nada” e é essa a expressão que esperamos ao vivenciar e degustar os nossos produtos”, explica fundador, Fabricio Almeida.
Na família há mais de 100 anos, a Fazenda Santa Terezinha é gerenciada pelo engenheiro e sua esposa desde 2017, quando decidiram trocar a carreira tradicional pela vida rural. O crescimento orgânico do negócio resultou em dois projetos importantes durante a pandemia: a cesta Zalaz (com produtos da fazenda) e o restaurante, inaugurado em 2022.
Diversificação como segurança
“A natureza é um laboratório vivo. Essa é nossa inspiração”, conta Paulo Lemos, um dos fundadores da Fazenda Lano-Alto, localizada em São Luiz do Paraitinga, interior de São Paulo. Desde 2016, o publicitário e sua esposa Yentl Dalanhesi gerenciam o que eles definem como uma “fazenda experimental”, onde produzem diversos produtos derivados do leite, fermentados, bebidas destiladas, além de oferecer visitas com degustação, workshops e visitas técnicas focadas no plano de negócios do empreendimento.
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De acordo com Lemos, o objetivo é justamente trabalhar a mentalidade de laboratório dentro do negócio testando diversos tipos de beneficiamento de alimentos e pensando em novos formatos de investigação de renda para a propriedade. “Não tem dinheiro vindo de outro lugar, então precisamos fazer com que o modelo seja financeiramente sustentável”, explica.
A propriedade conta com uma fábrica artesanal e duas cabanas, criadas no início da pandemia, rodeadas de vegetação preservada para uma experiência imersiva no meio da Mata Atlântica. Além de desfrutar do conforto e da paisagem do local, os alimentos disponíveis vêm direto da fazenda e os hóspedes podem conhecer a produção e visitar cachoeiras e nascentes.
O publicitário destaca a importância da diversificação de produtos e serviços para conseguir manter um projeto artesanal como esse de pé. Em junho de 2021, 120 quilos de queijo curado, 45 litros de iogurte e 9 quilos de requeijão da Lano-Alto foram destruídos por um entrave na legislação de produtos artesanais locais. “Foi um período em que as experiências e as cabanas pagaram tudo. Se eu tivesse só a queijaria eu já teria falido”, conta ele.
O beneficiamento é o segundo pilar para manter toda produção lucrativa. Além de segurar a produção e agregar valor ao produto agrícola, esse processo ajuda o produtor a depender menos de uma grande escala. Apesar de vender os produtos de forma online o foco do negócio é quase 100% nas experiências. “Você quer provar uma coisa diferente? Você vem aqui, conhece toda história e experimenta. É como um funil de engajamento”, afirma.
O turismo de imersão rural é uma experiência já bem estabelecida na Europa, mas que começa a conquistar cada vez mais adeptos no Brasil. Segundo Jean Paul Rebetez, sócio da consultoria Gouvêa de Souza, as atividades turísticas dedicadas à experimentar o dia a dia de produção nas fazendas é uma oportunidade de ouro para os produtores monetizarem o negócio e compartilharem sua história no campo com novos públicos.
“O maior desafio para esses empreendedores é justamente identificar esse cliente potencial e conseguir se comunicar com efetividade. A ferramentas mais importante ele já tem”, explica Rebetez.
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