quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Alexandre de Moraes risca o chão na frente de um Bolsonaro acuado, FSP

 Após dias de trabalho incessante dos "spin doctors" do Palácio do Planalto, tudo parecia colocado para uma trégua temporária entre Jair Bolsonaro (PL) e o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.

Por óbvio, a ausência do presidente na posse do titular do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) nas mais momentosas eleições brasileiras desde 1989 seria uma declaração aberta demais de guerra. Mas o terreno foi semeado para gerar acomodação.

Bolsonaro (com a mão no peito) canta o Hino Nacional em frente a Lula e outros ex-presidentes, ao lado de Alexandre de Moraes na posse do ministro no TSE
Bolsonaro (com a mão no peito) canta o hino nacional em frente a Lula e outros ex-presidentes, ao lado de Alexandre de Moraes na posse do ministro no TSE - Antonio Augusto/TSE/AFP

Após meses de recrudescimento da retórica golpista, Bolsonaro foi brindado com algumas mesuras. Conversou com Moraes e seu vice no TSE, Ricardo Lewandowski, viu a corte aceitar alguns pedidos do insistente Ministério da Defesa na saída do então presidente Edson Fachin.

Mesa posta, o altamente simbólico evento de posse de Moraes no lugar de Fachin nesta terça (16) insinuava o que políticos fazem melhor: fingir que desavenças não são pessoais e que todos podem conversar.

É assim, mas com nuances. Dilma Rousseff (PT) sentou-se a dois ex-presidentes de distância daquele que chama de algoz, Michel Temer (MDB). Mais divertido para observadores, contudo, era o cenho franzido, quase transparecendo ódio, de Bolsonaro ao sentar-se à frente de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

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Mas Moraes manteve o cenário, com conversinhas laterais com o presidente a seu lado e sorrisos mútuos.

Salvo um jogo totalmente combinado, que escapou aos generais de terno que sombreiam o Planalto, o ministro do Supremo fez jus ao apelido que lhe é dado por amigos e desafetos: Kojak, uma referência jocosa ao implacável detetive de uma série de TV dos anos 1970 que envergava uma exuberante calva, assim como Moraes, de resto com forte ligação com o sistema policial paulista que já comandou.

Em 28 minutos de discurso, o novo presidente do TSE exibiu todo o arsenal a seu dispor: a defesa das urnas eletrônicas como pilar da funcionalidade institucional, a promessa de combate intransigente às fake news e a invocação dos princípios da democracia.

Em resumo, tudo o que Bolsonaro vem desprezando em sua campanha contra o sistema eleitoral, que deu uma amainada desde que ele pareceu recuperar-se lateralmente nas pesquisas eleitorais.

Após chamar de "cartinhas" os manifestos da sociedade civil e do empresariado em favor da democracia, mobilização da elite que importa do país, o presidente foi obrigado a ouvir uma admoestação serena de Moraes olhando o rosto de Lula à sua frente.

As ovações lembraram que uma boa parte da casta política não quer aventuras, embora a sinceridade do centrão presente seja discutível. Não que Bolsonaro pareça se importar do ponto de vista pessoal.

Antes do ministro, até o amigável procurador-geral Augusto Aras falou em respeito à soberania popular, e o presidente da OAB, Beto Simonetti, chegou perto de lembrar a plateia de que lado Bolsonaro se posicionou nos últimos anos.

Mas o show, como previsto, era de Moraes. Ao longo da condução do polêmico inquérito das fake news, não pelo objeto mas pela assertividade aplicada e o fato de que a vítima conduz a apuração, o agora titular do TSE mostrou-se duro e foi alvo de crítica até de aliados.

Terá trabalho pela frente, numa campanha que começou nesta terça com Lula chamando Bolsonaro de possuído pelo demônio (faltou dizer qual) e o presidente exibindo o combo religião-anticomunismo —ainda não se sabe a opinião do Cramulhão, dado que ele foi invocado pelo petista e pela primeira-dama Michelle, ora amuleto eleitoral, que via o Planalto "consagrado ao demônio" (novamente, qual?).

Seja como for, a linha no chão foi riscada, na frente do adversário presumido e acuado pelo ambiente.

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