terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Impeachment é pouco para Bolsonaro, Pablo Ortellado, FSP

 14.dez.2020 às 23h15

Parte expressiva dos cidadãos brasileiros segue encantada pelo flautista do Vale do Ribeira e vai marchando mesmerizada, prestes a se afogar no rio.

Segundo pesquisa Datafolha, 52% dos brasileiros não veem nenhuma responsabilidade do presidente nas mortes causadas pela Covid-19. As evidências contrárias, porém, são eloquentes.

Bolsonaro não elaborou com antecedência um plano nacional de vacinação e não estabeleceu protocolos para o distanciamento social, gerando descoordenação entre as iniciativas de estados e municípios. Durante todo o período da pandemia, minimizou a mortalidade da Covid, condenou o fechamento do comércio e difundiu a descrença em vacinas.

Os efeitos dessa postura negacionista foram medidos em vários estudos.

Um deles, realizado por pesquisadores da FGV e da Universidade de Cambridge, com dados da empresa In Loco, descobriu uma redução do distanciamento social em municípios com alta votação em Bolsonaro depois que ele discursou contra políticas de isolamento.

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Outro estudo, feito na USP com dados do Google, mostrou que estados com alta votação em Bolsonaro relaxaram mais rapidamente a quarentena e que municípios médios e grandes de São Paulo que mais votaram em Bolsonaro cumpriram menos o distanciamento social.

Por fim, estudo de pesquisadores da UFRJ identificou maiores taxas de contaminação e de mortalidade pela Covid nos municípios nos quais Bolsonaro obteve maior votação.

A pesquisa do Datafolha divulgada no último fim de semana mostra novas correlações entre o bolsonarismo e atitudes com relação à Covid.

Simplesmente não pretendem se vacinar contra o vírus 22% dos brasileiros e 33% daqueles que sempre confiam no presidente. Os números são ainda mais chocantes quando o Datafolha pergunta especificamente sobre a vacina desenvolvida pela chinesa Sinovac --cuja confiabilidade tem sido minada pelo presidente e é alvo de intensa campanha negativa no WhatsApp.

Não pretendem tomar a Coronavac --a vacina com mais chances de ser primeiramente aprovada e distribuída-- 50% dos brasileiros e 67% daqueles que sempre confiam no presidente. Essa disposição em não vacinar é grande o suficiente para impedir que o país alcance a imunidade de rebanho.

Bolsonaro tem responsabilidade pelo aumento do descumprimento do distanciamento social, pelo aumento das contaminações e das mortes e, ao que tudo indica, terá também responsabilidade pela cobertura vacinal reduzida. Pode ser que ainda não seja politicamente viável, mas já não é mais motivo para impeachment, é motivo para cadeia.

Pablo Ortellado

Professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.

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