sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Kassab deixa Casa Civil de Doria e mira 2022, após dois anos de licença devido a suspeitas de corrupção, FSP

 Igor Gielow

SÃO PAULO

A 15 dias de completar dois anos como secretário licenciado da Casa Civil de São Paulo, Gilberto Kassab acertou sua saída do cargo com o governador João Doria (PSDB).

O anúncio deverá ser feito nesta sexta (18) e foi sacramentando após consultas mútuas em uma carta datada da terça (14), à qual a Folha teve acesso.

Nela, Kassab faz inúmeros elogios ao tucano, em especial sobre sua atuação no combate à pandemia da Covid-19. "Intervenções adotadas pelo governo paulista foram determinantes para minimizar a perda de vidas", diz o presidente nacional do PSD.

As mesuras se estendem ao fato de Doria ter determinado a licença de Kassab por 715 dias, após ele ter colocado o cargo à disposição para se defender de acusações de corrupção passiva e e falsidade ideológica eleitoral.

Usando um terno escuro e gravata vermelha, o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, concede entrevista em uma sala escura
O presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, em entrevista como secretário licenciado - Avener Prado - 1º.mar.2019/Folhapress

Ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro dos governos Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), Kassab pede para deixar o cargo em definitivo porque quer cuidar dos interesses de seu partido.

"É chegado o momento de começar a planejar as ações rumo a 2022", escreve, antes de colocar em definitivo seu cargo à disposição.

Na prática, Kassab deverá manter a ligação com a pasta, já que a tendência é a efetivação do secretário-executivo, Antônio Carlos Rizeque Malufe, na cadeira principal. Filiado ao PSD, ele é aliado do ex-ministro.

“Atuei, no que estava a meu alcance, pelo sucesso de sua administração e em defesa dos interesses do estado. Acredito que a Casa Civil desenvolveu importante atuação e teve papel essencial no sucesso de sua gestão até aqui”, escreveu Kassab a Doria.

O momento político para a decisão é simbólico. O PSD cresceu bastante nas eleições municipais deste ano, ampliando de 538 para 654 o número de prefeituras conquistadas.

Mais importante, firmou-se como força preponderante no segundo maior colégio eleitoral do país, Minas Gerais. Embora o governo estadual esteja na mão de Romeu Zema, seu partido, o Novo, patina como estrutura nacional.

Já o PSD tem 2 dos 3 senadores do estado e viu reeleito neste ano o prefeito da capital, Alexandre Kalil. Ele esteve com Doria e Kassab na terça-feira, quando almoçou com o governador para negociar a eventual compra da vacina Coronavac.

Em entrevista recente à Folha, Kassab já delineava seus planos, falando em ter candidato próprio a presidente em 2022. Isso é hoje improvável, mas seu afastamento formal da gestão Doria, com o cacife elevado pelas urnas, o torna um ator ainda mais importante.

O PSD apoia o governo Jair Bolsonaro no Congresso, mas busca distância regulamentar do centrão.

Poucas coisas irritam mais Kassab do que ser colocado no grupo, o que não significa que não deverá apoiar o candidato Arthur Lira (PP-AL), do centrão e de Bolsonaro, à presidência da Câmara.

Na mesma linha, tem um ministro no governo Bolsonaro, Fábio Faria (Comunicações), que sempre ressalva ser uma cota pessoal do presidente. "O PSD é independente, seus membros são indepedentes", repete sempre que questionado.

A resultante é óbvia. Kassab não vê sua sigla como integrante da aliança em formação entre PSDB, DEM e MDB para enfrentar Bolsonaro em 2022, mas nem tampouco descarta isso. Enquanto isso, vê a estrutura que montou em 2011 com seis meses de trabalho crescer pleito após pleito.

Doria, por óbvio, gostaria de ter o PSD no barco de sua candidatura presidencial já. Aliados de ambos veem mal-estar entre os dois políticos, algo que nenhum deles admitirá, mas também afirmam que não é caso para divórcio. A reportagem não conseguiu ouvi-los sobre o assunto.

Então ministro das Comunicações de Temer, Kassab era uma das estrelas do secretariado montado pelo então governador eleito nos dois últimos meses de 2018.

Não foram poucos que viram ali o embrião de uma aliança maior visando 2022, mas uma operação da Polícia Federal no dia 18 de dezembro emperrou o arranjo.

Kassab foi acusado de ter recebido ao menos R$ 23 milhões do frigorífico JBS de 2010 a 2016, baseado na delação dos irmãos Batista, controladores da empresa.

Foram rastreados pagamentos para empresas ligadas ao pessedista, mas afirma que as empresas prestaram serviços e que não houve nenhuma irregularidade. Mais ainda, a própria PF defendeu mais investigações sobre o caso, que corre em sigilo, por ver indícios de que de fato isso ocorreu.

De todo modo, Doria, eleito com discurso anticorrupção e associação com o seu hoje arquirrival Bolsonaro, não aceitou alguém sob investigação em posição central no governo.

Kassab sempre elogiou a interlocutores o tucano por tê-lo mantido no cargo, a partir de um decreto que o autorizou a sair sem vencimentos, mas seus aliados apontam também decepção: o pessedista considera que a evolução da investigação já o absolveria politicamente.

Kassab, porém, deve manter o controle da pasta com Malufe. Isso sugere que o pragmatismo segue regendo as relações entre o cacique e o governador.

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