18.dez.2020 às 2h14
Por maioria de 6 a 5, o STF negou reconhecimento a uniões estáveis simultâneas. Tratava-se de um caso previdenciário. O cidadão mantinha dois relacionamentos duradouros, um com uma mulher e outro com um homem.
Depois que ele morreu, os dois cônjuges supérstites (adoro essas expressões jurídicas do arco da velha) requereram o reconhecimento da união estável e os efeitos previdenciários daí decorrentes (pensão por morte). Em primeira instância, ambos conseguiram, mas o TJ-SE não admitiu o rateio da pensão, concedendo-a integralmente à companheira, cuja união estável tinha reconhecimento anterior, e o processo acabou chegando ao STF (com repercussão geral), que deu razão aos desembargadores.
Duas coisas me incomodam na decisão do STF. Em primeiro lugar, ela pretende pôr um legalismo de letras miúdas acima da realidade. Reparem que, se falássemos de filhos e não de cônjuges, não haveria a menor possibilidade de o filho gerado fora do casamento ou em relacionamento concomitante a uniões oficiais ou oficiosas ficar de fora da pensão e da herança. Estranho o STF aceitar o primado da realidade para filhos, mas não para companheiros.
Em segundo lugar, fiquei meio assustado com o argumento que a maioria usou para justificar o não reconhecimento do segundo relacionamento como uma união estável. Para os ministros, não apenas o casamento mas também a união estável impõe a monogamia e o dever de fidelidade. Em seu voto, o relator Alexandre de Moraes chega a traçar paralelos entre a atitude de quem mantém dois relacionamentos duradouros e o crime de bigamia --o que obviamente não procede.
São muitas as razões pelas quais pessoas preferem não se casar de papel passado. Uma delas pode perfeitamente ser o desejo de constituir arranjos familiares e sexuais diferentes dos convencionais. Desde que eles não infrinjam a lei, isso é da conta apenas das partes envolvidas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário