VÁRIOS AUTORES (nomes ao final do texto)
Medida cautelar proferida pela juíza Liliane Keyko Hioki, do Tribunal de Justiça de São Paulo, suspendeu a licitação do conjunto poliesportivo do Ibirapuera até a decisão sobre seu tombamento, atendendo à ação civil pública da qual somos cossignatários. A liminar já suscita polêmicas —e elas podem ser produtivas se os argumentos forem utilizados para esclarecer, e não confundir, a sociedade.
Como amplamente enfatizado em pareceres técnicos, manifestações da sociedade e de especialistas, o conjunto se distingue por inúmeros atributos culturais: qualidade arquitetônica e valor histórico, aderência à memória coletiva, centralidade na infraestrutura estadual de esportes.
Devemos por lembrar que tombamento não significa congelamento. O reconhecimento legal do valor patrimonial de um bem não impede adequações físicas ou funcionais necessárias a seu perfeito funcionamento. Modificações de bens tombados são permitidas e regulamentadas em lei, desde que levem em conta critérios de preservação, em trabalho conjunto com técnicos e especialistas. Excelentes adequações já foram realizadas pelo próprio governo paulista, como a Pinacoteca do estado, o Museu da Língua Portuguesa ou a conversão da Estação Júlio Prestes em sede da Osesp.
Nos equipamentos esportivos, a tendência internacional é modernizá-los, respeitando seu valor histórico, com o ganho adicional de convertê-los em importantes ativos turísticos. Os estádios olímpicos de Berlim e de Los Angeles ou o conjunto aquático da Cidade do México são alguns exemplos de uma vasta lista. E, mesmo em São Paulo, o tombamento do estádio do Pacaembu não impediu a sua adequação.
O tombamento tampouco impede a cooperação entre poder público e capital privado, na forma de concessão ou parcerias público-privadas. Apenas não deixa exclusivamente ao arbítrio empresarial a decisão de mutilar ou destruir aquilo que tem valor social para a memória, a história ou a paisagem urbana.
O governo paulista não ignora esses fatos. O ataque prévio ao Condephaat, reduzindo brutalmente a representação das universidades e da sociedade civil, não permite supor um jogo de boa-fé. Quem se apresenta como defensor da ciência não deveria se furtar ao diálogo com técnicos e cientistas.
Tampouco poderia ignorar a tendência, cada vez mais presente na arquitetura, no patrimônio e no planejamento de obras de minimizar o impacto de grandes demolições sobre as emissões de carbono e a condição ambiental. Só na cidade de São Paulo, os resíduos da construção civil são estimados em cerca de 25 mil toneladas diárias, quase 8 milhões de toneladas anuais.
Quando a atualização não destrutiva de edifícios antigos encontra cada vez mais espaço no mercado imobiliário do país e do mundo, caberia esperar do governo do estado mais rico da Federação uma ação exemplar nessa perspectiva.
Uma atitude responsável hoje, em qualquer área, exige atuar no ambiente construído em favor do interesse público e do equilíbrio climático. Sobretudo nas cidades, que abrigam mais da metade da humanidade, o futuro precisa começar desde já.
Ana Lucia Duarte Lanna
Diretora da FAU-USP
Carlos A. Ferreira Martins
Ex-diretor do IAU-USP
Joana Mello
Professora da FAU-USP
José Lira
Ex-diretor do CPC-USP
Marcos Acayaba
Arquiteto e professor da FAU-USP
Mônica Junqueira de Camargo
Ex-conselheira do Conpresp
Nilce Aravechia
Professora da FAU-USP
Silvana Rubino
Ex-conselheira do Condephaat
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