quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Passados 4 anos, SP arrecada pouco mais de 10% do prometido com concessões e privatizações, OESP

 Com algumas propostas apresentadas sem detalhamento e outras alvo de contestações na Justiça e no Tribunal de Contas do Município (TCM), a gestão iniciada por João Doria (PSDB) e concluída neste mês por Bruno Covas (PSDB) entregará cinco projetos concluídos de seu Plano Municipal de Desestatização, de um total de 55 propostas apresentadas em 2017. A arrecadação com o projeto, apresentado como uma das principais fontes de recursos para investimentos, ficou R$ 762 milhões, cerca de 10% dos R$ 7 bilhões estimados há quatro anos.

Nesta quarta, depois de uma série de idas e vindas, Covas tenta mais uma vez repassar a gestão do Complexo de Exposições do Anhembi, na zona norte, a um gestor privado. O novo concessionário poderá explorar o lugar por 30 anos, em troca do pagamento de uma outorga mínima de R$ 54 milhões (vence quem oferecer mais).

Doria e Bruno Covas
O prefeito Bruno Covas e o governador de São Paulo, João Doria, em evento público Foto: Nilton Fukuda/Estadão

É uma proposta diferente do primeiro modelo apresentado, que consistia na venda da empresa pública São Paulo Turismo (SPTuris), dona do Anhembi. Esse modelo não vingou após o TCM questionar o valor do negócio (R$ 1 bilhão, tido como baixo), e em meio a pressões pelo tombamento dos imóveis do complexo, o que engessaria planos de novas construções do eventual comprador. A ideia de conceder o espaço vem desde a gestão Fernando Haddad (PT).

No começo do mandato, Doria fez forte defesa do plano de desestatização, afirmando que parceiros privados poderiam gerenciar bens públicos de forma mais eficiente e com menos custos para a sociedade. Seu pacote de 55 propostas incluía os cemitérios públicos, hospitais e terminais de ônibus. Ele criou uma secretaria específica para executar o plano, que foi fechada por Covas – a atividade foi assumida pela Secretaria de Governo. Uma lei instituindo o plano foi aprovada pela Câmara Municipal.

Terminado o mandato, a Prefeitura chega com um saldo de 11 editais lançados para concessão, alienação ou constituição de parcerias público-privadas. Há projetos, como a concessão do Vale do Anhangabaú (em que uma empresa terá de cuidar da área em troca da permissão para explorá-la) e do baixo de três viadutos da zona norte (cuja ideia é parecida), em que os processo de recebimento de propostas já foram concluídos - mas ainda não há contratos assinados.

Das licitações que chegaram a resultar em contratos assinados, as mudanças nos serviços ofertados ao público foram afetadas pela pandemia. O estádio do Pacaembu, por exemplo, repassado à concessionária Allegra, hospedou um hospital de campanha no auge da pandemia. O Parque do Ibirapuera, cedido à Construcap, passou parte do ano fechado também em decorrência da crise sanitária.

Na lista de promessas feitas pelo governo, houve algumas em que mesmo a ideia da concessão não foi detalhada. É o caso do projeto que previa conceder a Marginal do Pinheiros, cuja principal informação foi a de que não haveria cobrança de pedágio. A proposta foi paralisada.

O valor total arrecadado até aqui foi calculado pela Comissão de Finanças da Câmara Municipal e divulgado pelo vereador Antonio Donato (PT). Segundo levantamento da consultoria Radar PPP, que monitora propostas de concessões e PPPs, feito a pedido do Estadão, a Prefeitura propôs 34 projetos do tipo entre 2017 e 2020. Destes, três estão em fase consulta pública, quatro estão em processo de modelagem (em Procedimentos de Manifestação de Interesse, quando o setor privado é convidado a contribuir para a formação da proposta) e seis estão em fase de licitação, além dos cinco contratos já iniciados. Ao todo, 15 estão paralisados. A licitação do observatório do Edifício Martinelli, que deveria ter ocorrido na segunda-feira, foi adiada.

Bruno Pereira, sócio da consultora, afirma que a defesa da ideia de redução do número de equipamentos públicos para tornar governos eficientes já é feita por políticos de diferentes correntes ideológicas. “Desde a gestão Fernando Haddad (PT), havia um órgão especializado em concessões.” Mas ele destaca que a realidade para a execução dessas propostas tem sido mais complexa. “É preciso que exista uma liderança técnica no poder público, inclusive no Tribunal de Contas”, para evitar a morosidade.

“Essa não é uma agenda simples”, disse o professor titular em estratégia e gestão pública no Insper Sandro Cabral. “São projetos complexos, que requerem envolvimento de diversas pastas e órgãos: Fazenda, Planejamento, as áreas fins, o Ministério Público, tribunais de contas, Casa Civil”, exemplifica.

Dessa forma, tocar uma série de projetos diferentes ao mesmo tempo potencializa as adversidades. “Falando de forma conceitual, se você tem um governante mais preocupado com a próxima eleição do que fazer a lição de casa, a coisa tende a não andar.”

Outro especialista, o professor de Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da Fundação Getulio Vargas (FGV) Marco Antonio Carvalho Teixeira, observa que “vivemos uma profunda insegurança jurídica”, ao lembrar que, mesmo entre as licitações que foram concluídas, os processos sofreram atrasos por causa de contestações do TCM. Segundo Teixeira, a participação das empresas nesses projetos já gera custos, e os empresários fazem uma série de ponderações que podem fazer com que desistam da participação nos processos.

Questionada sobre o balanço das concessões, a Prefeitura enviou uma nota listando 22 equipamentos públicos que foram concedidos ou alienados no governo, em uma lista em que foram incluídos imóveis desocupados que foram vendidos, a concessão dos ônibus (que estava atrasada desde 2013 e não estava no Plano Municipal de Desestatização) e tratando licitações feitas em conjunto, como a dos parques, como itens separados.

Na nota, sem comentar a arrecadação feita até aqui (R$ 762 milhões) em relação às promessas de 2017 (R$ 7 bilhões), a Prefeitura informou que as licitações feitas neste mandato “gerarão benefícios econômicos para a cidade da ordem de mais de R$ 14 bilhões”. Esses benefícios, que não foram detalhados, seriam da redução de custos - pela ausência de manutenção dos bens repassados - pela arrecadação de outorgas e pela cobrança de impostos dos novos gestores.

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