domingo, 23 de agosto de 2020

LAURA MORAES Mais uma curva para achatar, FSP

 


Laura Moraes

Coordenadora de Campanhas da Avaaz e pesquisadora sobre o impacto da desinformação no Brasil e no mundo; Avaaz é um movimento cívico global com mais de 63 milhões de membros

No início da pandemia, o avanço assustador das fake news sobre o coronavírus chegou a motivar a OMS (Organização Mundial da Saúde) a declarar uma "infodemia" de informações falsas do patógeno. Agora, passados cinco meses desde a primeira morte no Brasil, pesquisadores da USP nos mostram que, de maio a junho, o conteúdo desinformativo sobre vacinas contra a Covid-19 aumentou em 383% —e apontam para uma tendência crescente.

Nesse contexto, o projeto de lei das fake news, que tramita rapidamente no Congresso também sob o argumento de que responderia a essa crise de notícias falsas de saúde, faz muito pouco para realmente contê-las, e pode ser aperfeiçoado.

Um estudo recente da Avaaz completa a descoberta da USP sob uma perspectiva global: revela que os dez maiores websites que compartilham conteúdo desinformativo sobre saúde alcançaram um número de visualizações estimadas no Facebook quase quatro vezes maior do que os websites das dez principais instituições de saúde, como a OMS e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos.

A Avaaz identificou, ainda, que a maioria das informações falsas sobre saúde analisadas não tinha nenhum alerta do Facebook, apesar de quase todos esses conteúdos terem sido verificados por agências de checagem parceiras. De todas as fake news analisadas, 30% eram sobre uma vacina para a Covid-19, que sequer foi descoberta ainda.

Apesar da Avaaz e da USP terem investigado conteúdos diferentes e em idiomas distintos, as peças de desinformação analisadas por ambas são semelhantes. Elas incluem teorias conspiratórias sobre Bill Gates, alegações de riscos falsos ou infundados da vacinação e a existência de chips inseridos dentro de vacinas para nos controlar.

Os dois estudos trazem um alerta vermelho: graças à forma como as redes sociais funcionam, a desinformação sanitária parece estar se propagando em escala —e velocidade— muito maior do que a informação científica na internet. Em tempos de pandemia, ter acesso às informações científicas é mais necessário do que nunca. Como conseguiremos conter essa operação crescente contra a saúde pública?

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É fundamental que o projeto das fake news institua uma reparação aos danos coletivos ou individuais causados por essas desinformações, mostrando informações factuais, técnicas ou científicas disponíveis —como a imprensa faz ao publicar que errou, por exemplo. Incorporando essa alteração, os deputados enviarão uma mensagem sólida ao povo brasileiro de que estão, de fato, interessados em combater a crise de saúde pública, e não apenas usando-a como desculpa para aprovar uma lei de seu interesse.

A desinformação de saúde, e especificamente a de Covid-19, gera um dano coletivo imenso à saúde pública, enquanto nossos profissionais lutam para salvar vidas com recursos escassos. Por isso, quando disponíveis, informações factuais de fontes independentes e transparentes devem ser distribuídas pelas redes sociais, sem que nada seja apagado, para que cada cidadão possa contrapor a informação imprecisa com os fatos, sem prejuízo à liberdade de expressão.

Garantir a distribuição de fatos, informações científicas e técnicas sobre saúde e vacina pelas plataformas a todos os expostos a essas informações falsas poderá ajudar a imunizar a sociedade contra a desinformação.

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