Chegamos subitamente a um tempo no qual os exercícios de futurologia feitos nos últimos anos foram antecipados pela pandemia. Como será, daqui para a frente, o trabalho? As moradias? O varejo? Em postos de gestão acadêmica na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ouvimos questionamentos com um foco imediato: o "ensino a distância". Ele veio para ficar?
A expressão "ensino remoto emergencial", em vez de "a distância", parece-nos mais adequada, pois reflete o que muitas universidades estão vivendo em meio à quarentena, entendendo não ser uma opção definitiva e ter se instalado num prazo curto. Manter em andamento o ensino e a aprendizagem na forma remota é a melhor alternativa possível para reafirmar nosso compromisso com a formação de pessoas com qualidade. Mas é fundamental compreender que isso não é uma amostra ideal da educação mediada pela tecnologia, que ainda tem muito a evoluir. Sabemos que pode contribuir para romper barreiras como distância, fronteiras internacionais ou dificuldades com horários rígidos. Pode, ainda, oferecer de forma complementar a interatividade, as ferramentas de imersão e a ampla exploração de dados.
Estamos convictos de que, entre nós, não vai vigorar uma visão simplista sobre "ensino online", que vê a educação remota como um professor que "passa o conteúdo" em uma aula gravada diante de centenas ou milhares de telas, como um youtuber. Não é possível transpor uma aula presencial sem adaptações para o modo eletrônico, da mesma forma que uma peça de teatro filmada não se transforma automaticamente em cinema.
Implantada nas primeiras semanas de confinamento, a adaptação emergencial tem sido nesses meses um aprendizado para os professores, alguns mais atentos às possibilidades da tecnologia no ensino e outros que não sentiam essa necessidade.
Não é um processo simples para nenhum desses perfis, mas qual é a alternativa? Paralisar as atividades até a retomada pareceria, é claro, a opção menos trabalhosa. Estaríamos, porém, de costas para a necessidade dos estudantes que precisam estar qualificados para buscar um emprego ou continuarem sua formação, de outros que têm bolsas atreladas a atividades didáticas e dos candidatos a ingressar na próxima turma de calouros. Logo iniciaremos um segundo semestre preferencialmente remoto. Quem adiou a decisão de ligar as câmeras se deparou com uma pandemia muito mais extensa do que se esperava.
Existe também um aspecto psicológico que afeta toda a instituição, mas em particular os estudantes. Estudos têm sido realizados sobre os efeitos da saúde mental do confinamento social nos indivíduos, principalmente nos jovens, com sua necessidade mais exacerbada de socialização com seu grupo nessa etapa tão crítica de suas vidas. Especialistas indicam a importância de manter uma rotina, de ter um sentimento de pertencimento, de poder trocar experiências com outros. Ainda mais agora, em que as tentações para se aglomerar crescem com a reabertura do comércio, dos bares.
O caminho escolhido por muitas universidades ao redor do planeta trouxe desafios em série. Por exemplo, a desigualdade socioeconômica entre os matriculados na Unicamp, metade proveniente de escola pública, é um problema que tentamos minimizar rapidamente, ao ceder notebooks, tablets, bolsas emergenciais ou pacotes de internet para estudantes que necessitavam. Mas ainda há uma série de situações específicas de estudantes, cursos e departamentos acadêmicos que precisam ser acompanhadas.
Os últimos acontecimentos nos mostram que é preciso começar a projetar uma universidade renovada para um mundo que será diferente em diversos aspectos. Sairemos dessa crise mais preparados e experientes para pensar nas páginas seguintes da história. Até lá, em cada aula, seminário e defesa de tese, seguiremos confiantes, sempre buscando a excelência e o melhor aproveitamento dos recursos de que dispomos, fiéis à missão que nos foi confiada pela sociedade: criar conhecimento e formar pessoas prontas para os desafios que virão.
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