quinta-feira, 11 de julho de 2024

Deputados mantêm isenção para carne, News MEIO

 

Por 336 votos a favor, 142 contra e duas abstenções, a Câmara dos Deputados aprovou ontem o primeiro texto-base da regulamentação da reforma tributária. A proposta estabelece uma trava para a alíquota do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que não deve ultrapassar 26,5%, e inclui as carnes na lista de produtos da cesta básica com alíquota zero. A isenção das proteínas animais, principal impasse na regulamentação e cuja inclusão tinha apoio do presidente Lula e da bancada do agronegócio, foi aprovada por 477 votos a favor, 3 contra e duas abstenções em destaque (mudança no texto principal) apresentado pelo PL. Nos ajustes finais do texto, o relator Reginaldo Lopes (PT-MG) incluiu óleo de milho, aveia e farinhas nos itens isentos da cesta básica. O projeto segue agora para análise do Senado, onde precisa de ao menos 41 votos favoráveis. (Estadão)

Entre os principais pontos aprovados pelos deputados, está a inclusão de todos os medicamentos em alíquotas reduzidas, com desconto de 60% ou zerada. Haverá ainda cashback de 100% em contas de energia elétrica, água e esgoto para a população de baixa renda. Antes, essa devolução da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS, federal) seria de 50%. Para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS, municipal e estadual), a devolução de imposto continua sendo de 20% e caberá às autoridades locais determinarem ou não a ampliação. A proposta aprovada prevê também a possibilidade de as empresas creditarem o pagamento de IBS e CBS nos planos de saúde para seus funcionários. (Globo)

Em uma vitória das bancadas conservadoras, armas de fogo e munições ficaram fora do Imposto Seletivo, criado para desestimular o consumo de bens e serviços que fazem mal à saúde e ao meio ambiente. “Se não houver inclusão das armas de fogo, a tributação sobre esses bens, na prática, vai cair de 89,25% para 26,5%. Armas vão ficar com a mesma alíquota de flores, fraldas, brinquedos e perfumes”, disse o deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ). (Valor)

Este primeiro projeto estabelece regras e guias para as cobranças do IVA dual, incluindo quais bens ou serviços terão carga reduzida ou extraordinária, por meio do Imposto Seletivo. As definições são necessárias para calibrar as alíquotas finais da CBS e do IBS. Esses impostos substituirão cinco tributos que atualmente incidem sobre consumo: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. (g1)

A regulamentação é o segundo passo de um longo percurso até a implementação do novo sistema tributário, que começa em 2026 e termina em 2033. A Câmara ainda precisa tratar do segundo projeto, sobre as regras do Comitê Gestor do IBS. (Folha)

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O ministro Aroldo Cedraz, do Tribunal de Contas da União (TCU), suspendeu a megalicitação da Secretaria de Comunicação Social por suspeita de violação do sigilo do certame de R$ 197,7 milhões. O resultado da licitação foi antecipado um dia antes no site O Antagonista por meio de uma mensagem cifrada no X. A área técnica do TCU já havia apontado indícios de irregularidades. Cedraz avalia na decisão, confirmada pelo plenário, que os fatos são “de extrema gravidade” e “demandam atuação imediata” para “evitar que se concretize contratação possivelmente eivada de vício insanável”. Em nota, Paulo Pimenta, que estava à frente da Secom na época da licitação, negou irregularidade. (UOL)

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A campanha democrata à Casa Branca registrou uma grande desaceleração nas doações, e os líderes do partido de Joe Biden estão se preparando para um golpe ainda maior na arrecadação de fundos como consequência do mau desempenho do presidente no debate de quase duas semanas atrás, de acordo com fontes. “Já é desastroso”, disse uma delas. “O dinheiro foi totalmente bloqueado” para a campanha de Biden, contou outra fonte. Duas pessoas disseram que as doações neste mês devem cair à metade – “ou muito mais” – apenas em relação aos grandes doadores. As doações em geral também diminuíram. Um porta-voz da campanha de Biden, no entanto, negou que a arrecadação de fundos tenha diminuído. (NBC News)

E a ex-presidente da Câmara dos Representantes Nancy Pelosi pediu repetidamente, durante uma entrevista ontem, que Biden tome uma decisão sobre permanecer ou não na corrida presidencial. “Cabe ao presidente decidir se vai concorrer. Todos nós o encorajamos a tomar essa decisão, porque o tempo está se esgotando”, disse Pelosi. “Ele é amado, respeitado e as pessoas querem que ele tome essa decisão.” Questionada sobre sua opinião, Pelosi respondeu: “Quero que ele faça o que decidir fazer. E é assim – é assim que as coisas são. O que quer que ele decida, nós concordamos.” (Washington Post)

Até o ator George Clooney, que atua fortemente como arrecadador da campanha, defendeu, em artigo publicado no New York Times, que o presidente desista da candidatura. “Nos últimos quatro anos, ele venceu muitas das batalhas que enfrentou. Mas a única batalha que ele não consegue vencer é a luta contra o tempo. Nenhum de nós pode. É devastador dizer isso, mas o Joe Biden com quem estive há três semanas na arrecadação de fundos não era o 'grande' Joe Biden de 2010. Nem era o Joe Biden de 2020. Ele era o mesmo homem que todos testemunhamos no debate”, disse. “Não vamos vencer em novembro com este presidente.” (New York Times)

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Em carta publicada ontem na imprensa, o presidente francês, Emmanuel Macron, considerou que “ninguém ganhou” as eleições legislativas do último domingo. Ele pediu “a todas as forças políticas que se reconhecem nas instituições republicanas, no Estado de direito, no parlamentarismo, numa orientação europeia e na defesa da independência francesa, que se envolvam num diálogo sincero e leal para construir uma maioria sólida, necessariamente plural, para o país”, escreveu. Nenhum grupo obteve a maioria absoluta, fragmentando a Assembleia Nacional em três blocos principais, com a esquerda na liderança. Macron afirmou que “decidirá sobre a nomeação do primeiro-ministro” quando as forças políticas tiverem “construído compromissos” e “isso exige um pouco de tempo”. (RFI)

Meio em vídeo. Não era assim. Mas o que as pesquisas de São Paulo dizem, as americanas também, as eleições na França e Reino Unido confirmam. É muito simples: o quadro mudou. Agora, os eleitores mais ricos votam na esquerda e, os mais pobres, na direita. Por quê? Entenda no Ponto de Partida, com Pedro Doria. (YouTube)

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Mulher nua do quadro ‘A Origem do Mundo’ foi bailarina apagada e cortesã, Amazonas atual

 

Modelo faz performance diante do quadro 'A Origem do Mundo'. Origem da mulher retratada na obra foi desvendada (Foto: Divulgação)
Modelo faz performance diante do quadro ‘A Origem do Mundo’. Origem da mulher retratada na obra foi desvendada (Foto: Divulgação)

Por Lucas Neves/ da Folha Press

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SÃO PAULO – Cento e cinquenta e dois anos perdurou o anonimato da mulher sem cabeça do célebre quadro “A Origem do Mundo”, de 1866, de Gustave Courbet.
Aquela cujas coxas, o ventre, o contorno de um seio e, sobretudo, o sexo causaram furor nas altas rodas da Paris oitocentista -mas também nas mais pedestres redes sociais do século 21, onde sua imagem foi censurada sete anos atrás – acaba de ganhar um rosto convincente.
É o de Constance Quéniaux, bailarina da Ópera de Paris mais tarde conhecida pela atuação na filantropia. A revelação está em “L’Origine du Monde, Vie du Modèle”, ensaio de Claude Schopp a ser lançado na França no começo deste mês.
O retrato que o autor esboça dela é o de uma artista mediana, vista com mais frequência em duos ou formações de grupo do que em solos consagradores. “Não era uma estrela, seu nome não saía nos jornais da época, não sobreviveu à história”, diz Schopp.
Segundo ele, Constance não hesitou em oferecer carinhos a senhores ilustrados em troca de afagos materiais que ajudassem a suprir lacunas deixadas pelo salário módico da Ópera.
Forçada a pendurar as sapatilhas depois de uma década por causa de dores e lesões, não arreda pé dos círculos da boemia. Compõe o “entourage” do compositor Esprit Auber e, pouco a pouco, envolve-se em ações de caridade, voltadas ora para crianças órfãs, ora para surdos e cegos.
No fim da vida, acumula bens. Tem um apartamento em Paris e uma casa no sofisticado balneário de Cabourg, na Normandia, onde ganha prêmios pelo projeto paisagístico de seu jardim particular. “Parece que seu passado de cortesã é totalmente esquecido. Constance vira uma figura respeitável”, afirma Schopp.
Uma cena um tanto distinta da de sua origem no mundo, na pequena Saint-Quentin, polo têxtil do norte da França em que foi criada sozinha por uma mãe iletrada, que trabalhava na usina de gás.
Até aqui, achava-se que a mulher retratada por Courbet na tela que virou um marco da pintura realista poderia ser a irlandesa Joanna Hiffernan, modelo recorrente do pintor à época da criação da obra, além de amante dele.
Mas seu cabelo ruivo não condizia com o marrom escuro dos pelos pubianos pintados pelo francês -só se ele tivesse deliberadamente mudado o tom para preservar a identidade de sua musa.
Outra hipótese era a de que se tratasse de Jeanne de Tourbey, amante do diplomata turco Khalil Bey, que encomendara a obra. Mas sua notoriedade nos salões burgueses da capital francesa tornava remota essa possibilidade.
Eis que, cerca de um ano e meio atrás, pesquisando a correspondência entre os escritores Alexandre Dumas filho e George Sand, pseudônimo de Amandine Dupin, Schopp encontrou uma menção cifrada à bailarina da Ópera.
“Não se pinta nem com o pincel mais delicado e sonoro a entrevista da senhorita Queniault”, escrevia o primeiro à segunda, grafando errado o sobrenome da bailarina.
Estranhando a possibilidade de uma modelo ter sido retratada pelo pintor durante uma entrevista, Schopp foi consultar a carta original, de 1871, guardada na Biblioteca Nacional da França.
Descobriu então que Dumas, à época brigado com Courbet por causa do apoio deste à Comuna de Paris (levante antimonarquista do proletariado) meses antes, aludira na verdade ao “interior” de Quéniaux.
“Ele pode ter sido informado da identidade da modelo por Khalil Bey, já que ambos eram grandes colecionados de arte que se visitavam periodicamente em suas respectivas galerias”, explica o ensaísta.
“Talvez ao fim de uma dessas visitas ele tenha levantado o pano verde que cobria o quadro [que só seria exposto ao público no fim do século 20] e confiado o segredo a Dumas.”
Mas, como a tela é anterior à contenda do artista com o autor de “A Dama das Camélias”, pode ser que o próprio Courbet tenha apontado sua musa, já que Dumas tinha em seu acervo uma tela anterior dele e gostava de se aproximar dos pintores cujas obras ele comprava.
São conjecturas. O que é cristalino é o rancor que Dumas a certa altura passou a nutrir em relação a Courbet, tratado por ele como um depravado, um monstro imoral.
Na época da carta, acrescenta Schopp, o escritor -que, na década de 1850, tornara-se célebre justamente por um romance ambientado no mundo da prostituição, ainda que tratada com verniz romântico- conduzia uma espécie de campanha contra o meretrício, visto por ele como epítome da decadência francesa.  Para Dumas, “A Origem do Mundo” tomava ares de gênese de todo mal.

VOAR É PARA OS PÁSSAROS, Antonio Carlos Augusto Gama, do site APMP

 

VOAR É PARA OS PÁSSAROS

 

 

“Caio verticalmente e me transformo em notícia.”

(Carlos Drummond de Andrade, “Morte no Avião”)

 

 

Para minha filha Carolina, que só entra no avião depois de checar o nome do comandante

 

 

Domingo, pede cachimbo (quando criança, pensava que fosse “pé de cachimbo” e ficava a imaginar como seria essa árvore prodigiosa, com seus frutos dependurados: haveria uma árvore para cada tipo de cachimbo ou uma mesma árvore daria as várias espécies de cachimbo?).

 

Domingo, véspera da sempre modorrenta segunda-feira!

 

Na falta de cachimbo, resolveu mergulhar de vez na nostalgia e passou o dia a remexer gavetas, a reler papeluchos amarelecidos pelo tempo, a folhear livros esquecidos, de repente encontrando entre as páginas uma pétala seca.

 

Acabou nos velhos discos de vinil, com suas lindas capas, encartes com fotos dos intérpretes e letras das músicas: Jovem Guarda, Beatles, o quase menino Francisco Buarque de Holanda, o moço e belo Antonio Carlos Jobim, os rapazes do conjunto MPB4, as barbas negras de João Bosco e Aldir Blanc;

 

Entre eles, deparou com um disco ainda mais antigo, que havia surrupiado do pai, verdadeira preciosidade. Capa amarela de papelão, no verso a apresentação de Paulo Mendes Campos. Face A, Manuel Bandeira, Face B, Carlos Drummond de Andrade, dizendo seus poemas. Sim, dizendo, e não declamando ou recitando, que poesia é para ser dita na sua cadência própria, sem exageros e histrionices em que muitas vezes incorrem atores que se põem a “encenar” o poema, a “entrar” na personagem.

 

Colocou o disco na vitrola e em estado de graça passou a ouvir os dois poetas.

 

Manuel Bandeira absolutamente à vontade, chegando a cantarolar o refrão de uma canção infantil em “Evocação do Recife”, a dar sua tossidela de tísico numa pausa de “Vou-me embora pra Pasárgada“.

 

Drummond sempre comedido, mas comovente e preciso em “Caso do Vestido” e “Morte do Leiteiro”. Súbito, a voz aguda e tímida do poeta principia outro poema, “Morte no Avião”. Os versos secos lhe caem como um relâmpago, e se sente compelido a repetir duas ou três vezes o poema, as palavras cortantes martelando seus ouvidos. No dia seguinte, viajaria de avião para São Paulo, com aterrissagem em Congonhas.

 

Dormiu pouco, um sono agitado e intermitente, entremeado de fragmentos de sonhos. Acordou de mau humor, mais do que costumava ficar toda segunda-feira.

 

“Acordo para a morte.

Barbeio-me, visto-me, calço-me.

É meu último dia: um dia

cortado de nenhum pressentimento.

Tudo funciona como sempre.

Saio para a rua. Vou morrer.”

 

Pensou em adiar a viagem ou ir de carro, mas era impossível fazer uma coisa ou outra de última hora. Além de vários compromissos importantes em São Paulo ainda pela manhã, logo no começo da tarde faria sustentação oral de uma causa difícil, perante o Tribunal.

 

“Pela última vez miro a cidade.

Ainda posso desistir, adiar a morte,

não tomar esse carro. Não seguir para.

Posso voltar, dizer: amigos,

esqueci um papel, não há viagem,

ir ao cassino, ler um livro.”

 

Fez o check-in, tomou vários cafezinhos, vagueou inquieto pelo aeroporto, sentou-se, levantou-se, foi ao banheiro.

 

 

“A morte dispôs poltronas para o conforto

da espera. Aqui se encontram

os que vão morrer e não sabem.

Jornais, café, chicletes, algodão para o ouvido,

pequenos serviços cercam de delicadeza

nossos corpos amarrados.”

 

Chamada para embarque imediato. Foi o último a entrar na fila e lentamente caminhou como se fosse para o cadafalso (faz figa).

 

Ao pé da escada do avião, foi recebido pela tripulação sorridente, com destaque para a figura galharda do comandante, cujo nome pôde ler no crachá em letras que lhe pareceram garrafais: “COMANDANTE CAIO”.

 

 

Antonio Carlos Augusto Gama

Promotor de Justiça, aposentado