sexta-feira, 5 de maio de 2023

Como seria se homens fossem extintos? Um mundo só de mulheres é possível, segundo a ciência, Fernando Reinach, OESP

 Os avanços da genética nos permitem imaginar mundos distópicos cientificamente plausíveis. A ficção científica está lotada de mundos distópicos, desde os inocentes, recheados de super-heróis voadores, até os bizarros, com viagens no tempo. O problema é que grande parte desses mundos distópicos não são cientificamente plausíveis. Para existirem é necessário que as leis da física ou outros conhecimentos científicos sejam violados.


O que me fascina são os mundos distópicos que se tornam possíveis devido a um desenvolvimento científico ou tecnológico. Distopias cientificamente possíveis são interessantes, pois sua existência só depende do desejo da humanidade. Novas tecnologias, como bebês de proveta que se desenvolvem em barrigas de aluguel, não tem inspirado a criação de mundos distópicos. Já a clonagem, produção de seres vivos geneticamente idênticos (lembram da ovelha Dolly?), inspirou distopias com milhares de cópias de Hitler.

Hoje quero descrever um desses mundos, uma sociedade humana de mulheres, sem pessoas do sexo masculino.

Nos mamíferos, a reprodução depende da cooperação entre os sexos. As fêmeas produzem óvulos, que são fecundados por espermatozóides produzidos pelos machos
Nos mamíferos, a reprodução depende da cooperação entre os sexos. As fêmeas produzem óvulos, que são fecundados por espermatozóides produzidos pelos machos Foto: REUTERS/Regis Duvignau

Nos mamíferos, a reprodução depende da cooperação entre os sexos. As fêmeas produzem óvulos, que são fecundados por espermatozóides produzidos pelos machos, e o feto se desenvolve no útero de uma fêmea. Essa semana cientistas reportaram pela primeira vez a criação de camundongos provenientes de dois machos. Nesse experimento, células retiradas de um camundongo macho foram induzidas, através de um processo bastante complexo, a se transformarem em óvulos. E esses óvulos foram fecundados com espermatozoides provenientes de camundongos machos. Dessa maneira o embrião resultante é filho genético de dois machos.

Esses embriões foram implantados no útero de uma fêmea e geraram camundongos saudáveis. As etapas desse processo são complexas, e a taxa de sucesso é muito baixa. Foram obtidos sete filhotes em 630 tentativas. Com base nesse feito cientifico, é possível imaginarmos um mundo distópico onde todas as crianças seriam filhas de dois pais do sexo masculino. Mas nesse mundo estranho, as mulheres ainda seriam necessárias, pois os embriões precisam do útero feminino para se desenvolverem. Assim, respeitando a ciência, essa descoberta não nos permite imaginar um mundo habitado somente por homens.

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Mas um mundo habitado somente por mulheres já tem suporte científico. Cientistas retiraram células de camundongos fêmeas e, através de diversas manipulações, conseguiram que elas se transformassem em espermatozoides. Esses espermatozoides foram usados para fecundar outros camundongos fêmeas que pariram filhotes saudáveis. Ou seja, todo o ciclo reprodutivo foi feito sem a necessidade de se recorrer a um macho.

O mais interessante é que os camundongos, como os seres humanos, possuem cromossomos X e Y, sendo que as fêmeas possuem dois cromossomos X e os machos um cromossomo X e um Y. Nesse experimento, como os espermatozóides foram produzidos a partir de células de uma fêmea, eles só contêm o cromossomo X e os óvulos, que também provêm de uma das fêmeas, só contêm o cromossomo X. Desse modo, esse processo só produz fêmeas e dispensa o cromossomo Y.

Agora imagine um mundo habitado somente por mulheres, onde casais de mulheres concebem seus filhos sem a interferência dos homens: uma mulher doa as células que são usadas para produzir espermatozoides e a outra contribui com seus óvulos e o útero onde o feto se desenvolve. Numa sociedade desse tipo, como todas as crianças concebidas serão do sexo feminino (um X vindo do óvulo, outro do espermatozoide), não nascerá nenhum homem.

Nesse mundo, os casais de mulheres podem se revezar como produtoras de espermatozoides ou de óvulos, tornando os casais absolutamente simétricos. Se esse modo reprodutivo, cientificamente possível, for adotado pelas mulheres, os homens deixarão de nascer e o cromossomo Y desaparece da face da terra quando o último dos homens, agora totalmente inútil, for enterrado. A história do último homem e sua busca por uma mulher disposta a copular daria um ótimo romance. Dadas todas as críticas à masculinidade tóxica e à agressividade e brutalidade masculina, talvez esse seja um bom caminho para a humanidade. E então todos os dias serão o dia da mulher e o feminicídio desaparecerá.

Mais informações: The mice with two dads: scientists create eggs from male cells. Nature https://www.nature.com/articles/d41586-023-00717-7 2022

Você está participando, sem saber, do maior experimento com cobaias humanas em andamento, Fernando Reinach , OESP

 Desde o aparecimento de sistemas de inteligência artificial (IA) uma das grandes preocupações é como garantir que os seres humanos não percam controle sobre esses sistemas. Isso pode acontecer caso um desses sistemas passe a decidir o que podemos ou não fazer (o computador HAL 9000, no filme 2001 Uma Odisseia no Espaço, é um exemplo) ou pode acontecer caso um desses sistemas de IA consiga influenciar, sem que percebamos, nossas decisões.

O objetivo desse enorme experimento é testar se um sistema de IA consegue controlar remotamente nosso comportamento. É bem conhecido que os comportamentos dos seres humanos dependem em grande parte dos estímulos que recebemos. Fugimos ou atacamos quando ameaçados, e respondemos com agressão ou carinho quando recebemos estímulos adequados. Nosso comportamento pode ser modificado por esses estímulos ou mesmo por estímulos que não percebemos conscientemente, os chamados estímulos subliminares.

Será que um sistema de IA é capaz de selecionar e enviar estímulos para milhões de pessoas e, observando suas respostas, modificar o estímulo de modo a induzir essas pessoas a iniciar ou continuar um dado comportamento? Ou seja, será que um sistema de IA é capaz de controlar o comportamento de seres humanos sem que seja percebido?

O experimento utiliza celulares para fazer a comunicação entre o sistema de IA e o cérebro dos voluntários. Os voluntários baixam um app nos seus celulares e através desse app recebem os estímulos gerados pelo sistema de IA. O mesmo app monitora o comportamento dos voluntários e envia ao sistema de IA a resposta comportamental do voluntário após ser estimulado.

Com base na resposta da pessoa, o sistema de IA escolhe um outro estímulo e o envia ao voluntário. Através dessa interação entre o sistema de IA e milhões de voluntários, o sistema da IA vai sendo treinado a reconhecer os estímulos que são mais efetivos para induzir o comportamento desejado em cada pessoa e os tipos de estímulos que têm um efeito comum em todas as pessoas. E, em teoria, se torna cada vez mais eficiente no controle dos voluntários.

Mas qual é a medida usada para avaliar se o sistema de IA está realmente controlando o comportamento dos voluntários? Como saber se o sistema de IA, instalado em um computador central, está controlando o cérebro de um ser humano inteligente? Nos experimentos atualmente em andamento, a medida de sucesso, usada para melhorar o sistema de IA, é o tempo que os voluntários dedicam à sua interação com o app.

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Se eles perdem o interesse e vão fazer outra coisa, o controle é considerado baixo ou nulo, mas se ao longo do tempo os voluntários passam a dedicar frações crescentes do seu tempo ao app, isso indica que o sistema de IA está melhorando seu desempenho. O universo de estímulos disponíveis para o sistema de AI escolher e enviar a cada voluntário consiste em todas as reações enviadas ao computador central por todos os voluntários.

Nos experimentos atualmente em andamento, a medida de sucesso, usada para melhorar o sistema de IA, é o tempo que os voluntários dedicam à sua interação com um app.
Nos experimentos atualmente em andamento, a medida de sucesso, usada para melhorar o sistema de IA, é o tempo que os voluntários dedicam à sua interação com um app. Foto: Jeffrey Arguedas/EFE

Os resultados iniciais desse enorme experimento com cobaias humanas indica que os sistemas de IA conseguem controlar o comportamento dos voluntários mantendo os mesmos engajados nessa troca de estímulos e respostas por longos períodos de tempo. E durante esse tempo o cérebro dos voluntários está à mercê dos sistemas de IA. Outros experimentos têm o objetivo de determinar que comandos podem ser enviados ao cérebro nesse período e com que frequência o cérebro obedece a esses comandos.

Qualquer pessoa pode ser voluntário neste experimento. Para participar basta baixar o app do Facebook, Instagram, TikTok, Twitter ou outros apps de mídia social em que os usuários recebem um feed de imagens, textos ou vídeos e respondem postando suas respostas. Se você já é usuário de um desses sistemas, melhor ainda, você é uma das centenas de milhões de cobaias. E se o tempo que você dedica a esses apps vem aumentando, pode ter certeza que um sistema de IA, em algum local do planeta, controla, em parte, seu comportamento e a maneira como você gasta seu tempo.

O objetivo das empresas por trás desses sistemas de IA é manter as pessoas engajadas pelo maior tempo possível de modo que ao longo desse tempo, além dos estímulos para o engajamento, possam te enviar propagandas. E é da venda dessas propagandas que vem o dinheiro que sustenta essas empresas.

Uma proposta salomônica para a inflação, FSP

 Vamos analisar os condicionantes da decisão que o Conselho Monetário Nacional (CMN) terá que tomar acerca da meta de inflação de 2026. Vejamos alguns pontos: i) a inflação em 12 meses chegou a ser de 12% no segundo trimestre de 2022; ii) é razoável que o processo de desinflação se processe a uma velocidade algo diferente que aquela inicialmente prevista há dois anos; iii) reduzir a inflação dos 6% previstos para 2023 para os 3% da meta de 2024 em apenas um ano seria um desafio expressivo; iv) há um debate, no mundo, em função da elevada inflação recente, acerca de se a inflação a ser perseguida no longo prazo nos países desenvolvidos deveria ser de 2% ou de 3%; v) é natural que a meta de inflação nos países emergentes seja ligeiramente superior (sugere-se 1% superior) à dos países desenvolvidos; e, vi) em dezembro, a inflação esperada pelo mercado para 2025 era de 3% e ela passou para 4%, porque o mercado se convenceu de que o governo iria aumentar a meta.

Desse conjunto de pontos é possível depreender que pode fazer sentido mudar ligeiramente as metas de inflação de 2024 e 2025, desde que se perceba que aumentar excessivamente a meta desancorando as expectativas, fazendo com que o mercado pense que a elevação do alvo será seguida pelo aumento da expectativa de inflação, com risco de elevações posteriores da meta, seria um desastre e colocaria em xeque um esforço de três décadas de conquista da estabilidade de preços.

Nesse contexto, sugere-se que o CMN adote as seguintes decisões: meta de inflação de 3,25% para 2026; e, diante disso, redefinição das metas de 2024 e 2025 para 3,75% e 3,5%, respectivamente.

Fernando Haddad, ministro da Fazenda, e Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, durante debate no Senado; junto com a ministra do Planejamento, Simone Tebet, os dois formam o Conselho Monetário Nacional (CMN)
Fernando Haddad, ministro da Fazenda, e Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, durante debate no Senado; junto com a ministra do Planejamento, Simone Tebet, os dois formam o Conselho Monetário Nacional (CMN) Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Isso permitiria alcançar três objetivos: i) pavimentar o terreno para uma flexibilização gradual da política monetária; ii) sinalizar com uma continuidade da desinflação para o triênio 2024/2026; e iii) permitir que a decisão acerca da inflação a ser perseguida em prazos mais longos seja tomada no futuro, depois de ficar nítido como ficará o mundo após as turbulências de 2020/2023.

Essa iniciativa, combinada com a aprovação do arcabouço fiscal e com uma inequívoca sinalização do presidente Lula da Silva de respaldo ao Banco Central e de que ele estará firmemente comprometido com essa estratégia, permitiria reancorar as expectativas, de modo a que elas convirjam para 3,5% em 2025 e 3,25% em 2026. Se assim for, o CMN terá feito um gol, e Lula e Roberto Campos Neto terão alcançado um modus vivendi razoável. Que assim seja.