sexta-feira, 5 de maio de 2023

Precisamos mais de solidariedade do que de identidade, diz filósofo Cornel West, FSP

 Victoria Damasceno

SÃO PAULO

O filósofo Cornel West afirma haver um sofrimento específico ligado à população negra em decorrência do racismo, tanto no Brasil como nos EUA —o tom da pele, se preto escuro ou marrom claro, influenciará o tipo de preconceito que o indivíduo negro sofrerá. Mas salienta que a luta é principalmente de classe.

"Temos que falar da população negra e das pessoas pobres", diz o também professor e ativista americano.

Em aula exibida nesta quinta-feira (4), promovida pelo Instituto Conhecimento Liberta, uma plataforma de cursos online, West, um dos principais nomes do debate racial dos Estados Unidos, destacou a importância de lutar por mais direitos para trabalhadores em geral, independentemente da cor da pele.

O filósofo Cornel West em aula online mediada por Eduardo Moreira e Jessé Souza
O filósofo Cornel West em aula online mediada por Eduardo Moreira e Jessé Souza - Reprodução

Para tal, citou como exemplo a campanha presidencial do republicano Donald Trump, que mirou os chamados "colarinhos azuis", como são conhecidos os trabalhadores braçais e de indústrias nos EUA.

"Uma parte significativa do programa neofascista de Trump apela para os pobres e para os trabalhadores, porque eles se sentem descartados. E eles foram de fato prejudicados na estratégia de globalização corporativa. São tão preciosos quanto qualquer outra pessoa na humanidade", diz o filósofo. Assim, para ele, o progresso racial ocorrerá com a ascensão de pessoas pobres, não só de negros, a cargos de poder.

Numa das últimas vezes em que West esteve nos holofotes da mídia, ele disputava na Universidade Harvard, onde lecionava, o cargo de professor titular. Era a segunda vez que passava pela instituição.

PUBLICIDADE

Na primeira, abandonou Harvard após problemas com seu presidente. A segunda saída se deu quando a universidade não atendeu à orientação de um comitê para que ele fosse novamente titular, cargo que já havia alcançado anos antes, quando deu aulas na instituição pela primeira vez. À época, a postura jogou luz sobre o debate em torno de como as faculdades americanas, especialmente as da Ivy League, a elite universitária dos EUA, não costumavam alçar professores negros e latinos ao cargo mais alto da docência.

Para o filósofo, compreender os desafios impostos pela chamada "supremacia branca" contra negros, indígenas e asiáticos requer entender o papel que eles desempenham sobre os trabalhadores brancos.

"Vemos as elites neoliberais no setor financeiro [americano] com um poder desproporcional sobre os políticos, promovendo políticas que devastaram os trabalhadores e marginalizam os pobres. Elas muitas vezes colocam trabalhadores negros pobres contra trabalhadores brancos pobres, contra pardos. Precisamos de solidariedade. Precisamos mais de solidariedade do que de identidade", afirma ele.

West é conhecido por sua fé cristã e ativismo, com falas muitas vezes vistas como combativas —algumas delas já geraram desconforto entre membros do próprio movimento negro americano. Um exemplo é seu histórico com o ex-presidente Barack Obama. Embora tenha apoiado com vigor a eleição do democrata, o filósofo o chamou de covarde e mascote de Wall Street ao se decepcionar com sua atuação em relação à população negra, além de classificar de neoliberal a equipe econômica do então chefe da Casa Branca.

Outras manifestações do professor incluem o desejo de dar um tapa na cabeça de Obama –algo não muito bem recebido por intelectuais e ativistas negros americanos, principalmente por envolver violência.

Ainda assim, muitos se identificam com a decepção de West em relação ao democrata, que deixou o poder visto como um presidente que fez menos do que poderia para diminuir a desigualdade racial no país.

Suas falas com frequência se aliam à sua fé. Ele diz se ver como um profeta, às vezes mais do que como professor. Já afirmou buscar ser como Jesus –um anseio entre protestantes. O compromisso com a fé aparece em suas idas e vindas ao Union Theological Seminary, onde é professor e atuou pela primeira vez há mais de 40 anos. Lá, ministra cursos de filosofia da religião e pensamento crítico afroamericano.

Comandante da Marinha diz que Forças Armadas não são poder moderador, FSP

 O comandante da Marinha, o almirante Marcos Sampaio Olsen, afirmou ser equivocado o uso feito por bolsonaristas do artigo 142 da Constituição Federal, que disciplina a atividade das Forças no país, para afirmar que poderiam ser um papel moderador.

Em entrevista ao jornal O Globo, Olsen afirmou que cabe ao STF (Supremo Tribunal Federal) interpretar a Constituição.

Olsen, um homem branco, careca e de óculos, está sentado falando ao microfone de mesa. Ele veste a farda branca da Marinha
O comandante da Marinha, Almirante Marcos Sampaio Olsen, durante audiência no Senado - Pedro Ladeira - 04.Mai.2023/Folhapress

A bancada do PT na Câmara dos Deputados articula uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para retirar do artigo 142 a citação à garantia da lei e da ordem.

O Ministério da Defesa também encaminhou uma minuta de PEC ao Planalto para proibir que militares permaneçam na ativa caso tentem disputar eleições ou assumam cargo no Executivo.

No final do ano passado, por exemplo, bolsonaristas que não aceitam a derrota eleitoral do presidente para Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltaram a citar esse artigo para cobrar um golpe de estado pelas Forças Armadas.

Em 2020, o ministro Luiz Fux, do STF, delimitou em decisão judicial a interpretação da Constituição e da lei que disciplina as Forças Armadas para esclarecer que elas não permitem a intervenção do Exército sobre o Legislativo, o Judiciário ou o Executivo nem dão aos militares a atribuição de poder moderador.

PUBLICIDADE

Em resposta a uma ação apresentada pelo PDT contra "eventual intervenção militar", o magistrado deu uma decisão liminar (provisória) para estabelecer que a prerrogativa do presidente da República de autorizar emprego das Forças Armadas não pode ser exercida contra os outros dois Poderes.

"A chefia das Forças Armadas é poder limitado, excluindo-se qualquer interpretação que permita sua utilização para indevidas intromissões no independente funcionamento dos outros Poderes, relacionando-se a autoridade sobre as Forças Armadas às competências materiais atribuídas pela Constituição ao presidente da República", afirmou o ministro, que assumirá em setembro deste ano a presidência do STF.

Na mesma entrevista ao jornal O Globo, o comandante da Marinha defendeu a ida à reserva de militares que assumam cargos públicos. Ele criticou a politização das Forças Armadas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).

"Acho equivocado manter-se no exercício desses cargos públicos como oficial da ativa. Caso um militar migre para exercer um cargo público, ele deve requerer transferência para a reserva. Do contrário, não assume. Essa condição poderia ser até automática: se aceitar o cargo, passa para a reserva", declarou.

Olsen afirmou que um levantamento interno identificou militares filiados a partidos políticos, o que caracteriza contravenção disciplinar sujeita a processo administrativo.

Em março, a Marinha emitiu um comunicado dando 90 dias para a desfiliação das legendas sob risco de punição. A mesma orientação foi seguida pelos comandos do Exército e da Aeronáutica.