Havia um painel de valor inestimável contendo desenhos e autógrafos na parede do Villarino. Nos anos 50, a nata boêmia da cidade se reunia em suas mesas: gente como Antônio Maria, Dorival Caymmi, Aracy de Almeida, o médico Eustáquio Duarte, inventor do “gabarito fosfórico” adotado na casa: a dose de uísque tinha de chegar à altura da caixa de fósforos Beija-Flor, na vertical. Valia por duas medidas de outros bares.
Foi ali que, em maio de 1956, Tom Jobim e Vinicius de Moraes combinaram a parceria para “Orfeu da Conceição”. Mas atenção: Tom não tinha o hábito de batucar no mármore nem Vinicius escrevia versos na toalha de papel — as canções nasceram depois, na rua Nascimento e Silva, 107, em Ipanema.
O registro na parede foi inaugurado por José D’Ávila, pintor e soprador de vidro que fabricou um copo para cada habitué da uisqueria. No cenário artístico improvisado, destacavam-se um poema de Paulo Mendes Campos; a pauta com a melodia de “Aquarela do Brasil”, por Ary Barroso; dedicatórias de Sérgio Porto e Dolores Duran; o jamegão de Pablo Neruda; traços de Di Cavalcanti, Antonio Bandeira, Milton Dacosta, além de uma marinha de Pancetti, sem azul do céu, sem verde do mar, toda em vermelho-batom.
Um dia ela apareceu coberta de tinta nova. O proprietário resolvera limpar aquela besteira. Foi a primeira morte do Villarino. A segunda, na segunda (16), quando os donos anunciaram seu fechamento. Aberto em 1953, o restaurante ficava no Centro, região em que o comércio foi mais atingido pela pandemia.
O último moicano era o escritor Luiz Alfredo Garcia-Roza, morto em abril, que almoçava filé de frango à milanesa, bem fininho, com arroz e feijão, servido pelo garçom Marlon Brando. Uma pena que Luiz Alfredo, em seus romances, jamais tenha feito o delegado Espinosa beber um uísque no Villarino. Valendo-se do gabarito fosfórico, lógico.