segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

Philip Yang e Tiago Cavalcanti Consertar (e concertar) enquanto é tempo, FSP

 Philip Yang

Fundador do Urbem (Instituto de Urbanismo e Estudos para a Metrópole)

Tiago Cavalcanti

Professor titular de economia da Universidade de Cambridge (Reino Unido) e da FGV-SP

Lançado na COP28, o Fundo Floresta Tropical para Sempre (FFTS) surge como solução para a conservação das florestas tropicais. O fundo tem o objetivo de utilizar seus rendimentos para recompensar países que mantêm florestas intactas e remunerar investidores —entre eles, governos, filantropias e privados. De acordo com o que foi noticiado na imprensa, o funcionamento do fundo ainda está em desenvolvimento.

A iniciativa tem méritos. O FFTS amplia o financiamento florestal ao incorporar mecanismos de mercado e rompe com abordagens anteriores ao focar na preservação das florestas com um pagamento de US$ 4 por hectare/ano de floresta em pé. No entanto, para que o projeto atinja seu potencial na COP30, em Belém, três questões merecem atenção: o valor do incentivo, a alocação do capital e a natureza do fundo.

Município de Trairão, no Pará, que enfrenta contaminação por mercúrio gerado no garimpo ilegal; Brasil quer incentivar a conservação da floresta amazônica por meio de novo fundo - Danilo Verpa/Folhapress

Primeiro, o valor. É evidente que florestas continuarão a ser destruídas enquanto atividades baseadas no desmatamento forem mais lucrativas do que as fundadas na preservação. O incentivo de US$ 4 por hectare/ano parece irrisório frente ao lucro gerado por atividades predatórias, que rendem entre US$ 50 e US$ 1.500 por hectare/ano. A boa notícia é que atividades agroflorestais sustentáveis, como a extração de castanha, óleos essenciais e o manejo de madeira, têm potencial de gerar até US$ 5.000 por hectare/ano.

Dado esse cenário, o foco deveria ser estimular empreendimentos que provem que a floresta em pé é lucrativa. Estranhamente, o FFTS, conforme veiculado, operaria como um fundo tradicional, aplicando recursos em carteira. não necessariamente focada nos territórios florestais.

Três ajustes seriam valiosos.

É essencial que os recursos sejam concentrados em projetos que beneficiem diretamente as florestas, cadeias de valor sustentáveis e empregos locais. Além disso, parte dos investimentos deve ir para as cidades florestais (amazônicas, no caso brasileiro) para que se tornem centros de inovação, provendo educação e infraestrutura para conexão dos produtos da floresta com o mercado global e gerando um círculo virtuoso de integração rural-urbana.

Outro ponto: a criação de rede de proteção florestal ao redor das áreas urbanas, alvos usuais de desmatamento. Florestas nas franjas urbanas podem ser transformadas em Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), regime eficaz de conservação privada no Brasil, que permite a condução de atividades econômicas.

A expansão das RPPNs a partir das cidades, baseadas em vilas produtivas, reunindo povos nativos e comunidades científicas, pode ser um trunfo para a bioeconomia e o combate ao desmatamento. Essas vilas poderão promover a formação de cidadãos e empreendedores comprometidos com a sustentabilidade, num tecido de integração campo-cidade que valoriza a floresta em pé como um ativo essencial para a vida.

Por fim, a natureza do fundo precisa ser repensada. Para garantir a preservação das florestas "para sempre", o FFTS deve se afastar da lógica dos ciclos dos fundos tradicionais. Deve se posicionar como um fundo perpétuo, integrado por cotistas permanentes, onde o retorno do investimento não será medido no ciclo curto, mas pela perpetuidade e robustez de seus rendimentos de longo prazo. Afinal, a verdadeira riqueza do FFTS está na preservação ambiental que deixará para as futuras gerações.

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