São Paulo
O Comitê de Política Monetária —o famoso Copom— aumentou a taxa básica de juros —a tão falada Selic— para 12,25% ao ano —um inconfundível chute na canela para as empresas.
O comitê indicou que deve subir a taxa nas próximas duas reuniões, em um ponto percentual por vez, o que a levaria aos 14,25% anuais, taxa vivenciada durante o nada saudoso período de 2015 e 2016.
A explicação para a pancada é o descontrole da inflação, que já está em 4,87% no acumulado dos últimos 12 meses, acima da margem de tolerância da meta definida pelo governo.
No pós-pandemia, a Selic chegou a 13,75%. Sem o surgimento de novas guerras ou doenças altamente infecciosas se espalhando pelo planeta, economistas apontam que a razão de o Brasil não conseguir guardar o monstro inflacionário na caixinha da meta são os gastos do governo petista.
Se esse for o único ponto a ser corrigido na rota econômica nacional, o aumento da taxa em nada ajuda. Na verdade, agrava o quadro, já que o pagamento de juros de dívidas é grande parte dos gastos federais. Logo, aumentar Selic alimenta a bola de neve dos gastos. Enfraquecer o real, gerando alta do dólar, tem efeito semelhante.
Daí vem a nova expressão da moda, que players do mercado financeiro têm repetido à exaustão: dominância fiscal. Ela descreve a situação em que não há mais nada que possa ser feito pelo Banco Central ou pelo Conselho Monetário Nacional para controlar a inflação. Nesse quadro, tudo dependeria da questão fiscal, ou seja, fica na mão do governo federal cortar gastos e criar um ambiente de segurança para atrair dinheiro.
Se esse for efetivamente o cenário, a sinalização do Copom de que podemos ter juros a 14,25% tem a única utilidade de emparedar o governo. Se de nada adiantará aumentar a Selic para frear a inflação, sua serventia seria unicamente travar o avanço econômico, levando ao temerário estado de "estagflação".
Pode anotar essa palavra, que significa estagnação econômica, com preços subindo e alto desemprego. Ela vai começar a aparecer com frequência no noticiário, na primeira escorregada da curva de geração de empregos.
O governo Lula, no entanto, tem a seu favor a menor taxa de desemprego dos últimos 11 anos, segundo dados do IBGE, e o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) acima das expectativas, projetado entre 3,3% e 3,5% neste ano.
O "trade mórbido" que vimos na semana passada, com a escalada do Ibovespa após a divulgação da notícia de que o presidente Lula passaria por novo procedimento cirúrgico, deixa claro que o caminho atual do governo não agrada aos donos do dinheiro, capazes de movimentar o mercado.
Sendo pragmático, para sustentar o crescimento, é preciso atrair o dinheiro dos gigantes. E só subir os juros não parece mais ser o bastante.
O próximo presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, é conhecido por pensar fora da caixa, já tendo sido definido como um "heterodoxo não ortodoxo". Ele já sentará na cadeira com a missão de costurar um caminho viável para a economia não travar a curto prazo nem se tornar insustentável a médio.
Galípolo já foi CEO de banco e já esteve no governo. Sabe que, para espantar um gato, é preciso deixar uma passagem livre, evitando arranhões desnecessários.
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