O que se vê hoje na outrora imponente Companhia Brasileira de Cimento Portland Perus são ruínas. As instalações da fábrica estão completamente abandonadas e os silos, pichados. Há uma vila operária e uma igreja cobertas pelo mato. A paisagem é desoladora e encobre um passado vergonhoso.
Instalada ao lado da estrada de ferro, bem perto da estação Perus, na zona noroeste de São Paulo, ela foi fundada em 1926 e é considerada a primeira fábrica de cimento portland de grande porte no país.
Tinha uma localização estratégica para atender a crescente demanda pelo produto em São Paulo naquela época. Ficava próxima de uma jazida calcária e da usina hidrelétrica Edgard de Sousa. O cimento produzido ali foi usado na construção do viaduto do Chá e da biblioteca Mário de Andrade, por exemplo.
Pertencia ao grupo canadense Drysdale & Pease e, em 1951, caiu nas mãos de José João Abdalla, o J.J. Abdalla. Nos anos seguintes, começaria sua decadência. O empresário ficou conhecido pela desonestidade e truculência, que, na década de 1960, lhe valeriam o apelido, dado pela imprensa paulista, de "mau patrão".
Havia se destacado no setor têxtil, mas controlava pedreiras, usinas, minas e ferrovias, além de ser um grande proprietário de terras. Também participava da política e quando comprou a fábrica de Perus era deputado federal.
Seus funcionários trabalhavam em condições degradantes e cumpriam jornadas exaustivas e, em plena ditadura militar, fizeram uma greve não violenta que durou sete anos, entre 1962 e 1969. O bairro de Perus chegou a ser ocupado pelo Exército.
Foi chamada de greve dos Queixadas, como se autodenominavam os operários em referência ao porco do mato que ao se ver em perigo se une em grupo. Eles reivindicavam melhoria das condições de trabalho e o pagamento de salários atrasados e de benefícios, como adicionais de férias e de insalubridade.
A greve na fábrica só foi encerrada quando Abdalla foi condenado pela justiça a indenizar os trabalhadores e o governo descobriu que suas 32 empresas não recolhiam impostos regularmente. Ele foi condenado várias vezes à prisão e teve os bens confiscados. Em 1973, a Cimento Portland, junto com uma ordem de falência, sofreu uma intervenção federal e, em 1974, foi confiscada pela União.
Além de não pagar salários e sonegar impostos, ele era também um destruidor do meio ambiente. Dentro de sua lógica perversa, Abdalla havia optado por não instalar filtros para conter a poluição dos fornos de cimento
Os moradores de Perus reclamavam das dezenas de toneladas de pó que eram lançadas na atmosfera anualmente e empesteavam o bairro, tornavam o ar irrespirável, causavam doenças respiratórias, sujavam roupas no varal e até derrubavam telhados.
O cimento portland é o mais utilizado em obras de construção civil, por sua resistência, durabilidade e versatilidade. Foi patenteado em 1824 por Joseph Aspdin, que o batizou com esse nome por causa de sua alta solidez, comparável às pedras da ilha britânica de Portland.
A população de Perus tenta até hoje transformar a fábrica, que foi tombada pela Prefeitura no governo de Luiza Erundina, em um centro de cultura e memória. A Cimento Portland encerrou suas atividades em 1986 e, desde então, se encontra abandonada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário