quinta-feira, 23 de março de 2023

Brasil vai para arrocho exagerado de juros por causa de tretas tolas, FSP

 O Banco Central não deu a mínima para a falação do governo e outros críticos da taxa de juros. Fez questão de dizê-lo em várias das entrelinhas do comunicado em que anunciou sua decisão de manter a Selic em 13,75%. O BC nem mencionou a possibilidade de corte. Apenas citou a possibilidade de baixa da inflação caso a economia, aqui e lá fora, vá à breca.

Para quem se interessa pela política politiqueira da conversa econômica, este é o resumo da ópera.

O que o governo pode fazer? Como diz o clichê sobre o judô, usar a força do "adversário" para virar o jogo (sobre credores e sobre quem espera inflação alta). Se vier mais reação estabanada ou agressivamente maluca (mais gasto obrigatório, decretar juros e preços baixos etc.), a situação piora.

Sindicalistas mobilizados na avenida Paulista. Carregam bandeiras vermelhas, brancas e roxas, uma faixa com a frase "fora, Campos Neto" e um cavalo de apelão, em alusão à armadilha grega. Campos Neto seria o cavalo de Troia de Bolsonaro.
Ato contra juros altos na manhã de terça-feira (21) na avenida Paulista, em São Paulo. - Danilo Verpa/Folhapress

Sim, é bem possível que a economia vá ter falta de ar em breve. Maio? Vamos para um arrocho provavelmente exagerado por causa de querelas e ideias tolas e ignaras.

Ainda que a Selic baixasse logo e até 12% em dezembro, a situação mudaria da água para água com uma colherada de vinho. Melhora, claro, mas o problema básico não está aí.

Mas o governo acha que baixando decretos ou trocando a palavra "gasto" por "investimento", essas bobices, a coisa se resolve. É uma conversa muito primitiva e rudimentar.

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O que pode fazer com que a inflação caia abaixo do que ora prevê o BC?

Nova queda dos preços das commodities, em reais: 1) o dólar tem de ajudar também; 2) Economia mundial esfriar mais do que o esperado, em especial por causa do tumulto financeiro; 3) No Brasil, arrocho de crédito maior do que o normalmente esperado.

O recado por ora é: só vai ser bom se for ruim. Note-se, de resto: mesmo com tais riscos, o BC não tratou de corte de juros.

Sim, ajuda se o governo aparecer com um plano duro de limitação de gastos e dívida —"duro mesmo" não vai acontecer. A novidade do BC foi a menção à asfixia de crédito —pode acontecer.

Pelos números cuspidos pelos modelos do BC, a Selic permanecerá em 13,75% até o dia de São Nunca, de tarde. Isto é, o IPCA apenas chega à meta de 3% de 2024 se a Selic continuar onde está até o final do ano que vem (é o chamado "cenário alternativo" do BC). Não deve ser tão ruim assim, mas esse é o alerta.

Não houve surpresa na decisão, na exposição de motivos ou na análise de conjuntura apresentados pelo BC, que seguiu o manual.

A expectativa de inflação de "o mercado" para 2023 e, mais relevante, para 2024, está "desancorada". Ou seja, aumentou desde a reunião anterior do Copom (início de fevereiro). Na verdade, praticamente parou de subir desde o início de março, mas estacionou nas alturas.

A previsão de inflação acumulada em 12 meses até o terceiro trimestre de 2024 é de 3,8% (piorou), sob a premissa de que a Selic caia como previsto pela mediana das projeções de economistas (é o "cenário de referência" do BC).

Há riscos de inflação ser maior do que a esperada, diz o BC, pois a carestia mundial pode ser persistente, há incerteza fiscal e "desancoragem" maior ou mais duradoura de expectativas de inflação.

O BC até começa sua exposição de motivos citando o sururu global. Logo em seguida, porém, diz que a atividade econômica e a inflação resistem. Seus pares nos Banco Central Europeu e no Fed, o BC americano, acreditam que o risco de inflação é maior do que o de crise na finança e seus efeitos recessivos ou convulsivos. O BCE elevou os juros na semana passada. Tem feito questão de dizer que crise financeira e inflação são temas que podem ser tratados à parte. O Fed disse nesta quarta que o tumulto bancário pode reduzir o crescimento e, talvez, assim, a inflação, mas é cedo para saber.

Aqui, não tem sinal de refresco.


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