Uma dificuldade para quem liga nível educacional a progresso moral sempre foi explicar como os alemães da primeira metade do século 20, um dos povos mais instruídos da Europa, perpetraram o Holocausto. Um problema relacionado é explicar como Munique, uma das cidades mais sofisticadas e cosmopolitas da Alemanha, se converteu, nas palavras de Thomas Mann, um de seus moradores, na "cidade de Hitler". Esse quebra-cabeças é o tema de "In Hitler's Munich", de Michael Brenner.
Uma das explicações padrão para o fenômeno está na República Soviética da Baviera, o governo revolucionário de curta duração que se instalou na região após a derrota da Alemanha na 1ª Guerra. Quase todos os líderes desse movimento eram judeus, como Kurt Eisner, Ernst Toller, Gustav Landauer, Erich Mühsam e Eugen Levine. Essa experiência teria atiçado o antissemitismo na Baviera, favorecendo uma reação contra a figura do "judeu-bolchevique" que catapultou grupos de extrema direita como os nazistas.
Brenner conta as histórias apaixonantes desses e de outros personagens e, ao fazê-lo, mostra que narrativas simplificadoras não dão conta da complexidade do fenômeno. Para começar, vários judeus com inclinações conservadoras apoiavam movimentos nacionalistas, sob cujo guarda-chuva estavam os extremistas. Num daqueles paradoxos que só a História cria, Anton Arco-Valley, que assassinou Eisner, o fez para tentar credenciar-se ante os extremistas, que não o aceitavam porque ele tinha ascendência judaica por parte de mãe.
No capítulo final, Brenner traz interessantes reflexões sobre a história. Mesmo que aceitemos a tese de que foi o envolvimento de judeus com a República Soviética da Baviera que deu asas aos nazistas, por que não recuar ainda mais na cadeia de causalidades? Se já não houvesse antissemitismo na Alemanha, será que tantos judeus teriam participado de movimentos revolucionários?
É complicado.
helio@uol.com.br
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